Por que o Brasil precisa mudar seu papel no comércio internacional para aumentar a renda da população

Por Emerson L. S. Iaskio e Israel A. Gonçalves*

Hoje, seguimos presos a um modelo de exportação baseado na venda de produtos primários, como soja, minério de ferro, petróleo bruto e carne bovina.

Essa especialização limita nosso crescimento econômico e nos torna excessivamente dependentes de poucos mercados — sobretudo da China.

É preciso mudar. Se o Brasil quiser elevar de forma duradoura a renda de sua população, precisa urgentemente repensar o papel que ocupa na Divisão Internacional do Trabalho (DIT).

A explicação clássica para esse padrão vem da teoria econômica de Heckscher-Ohlin, que sugere que os países tendem a exportar produtos baseados nos fatores de produção que têm em abundância.

O Brasil, com vastas terras e recursos naturais, tornou-se um grande exportador de commodities. Contudo, isso não é suficiente.

Permanecer nesse modelo que existe desde o período colonial, impede o avanço para uma economia mais complexa, inovadora e com maior valor agregado — o que, por sua vez, limita o crescimento da renda média da população.

Países que conseguiram ampliar sua participação em setores industriais e tecnológicos mais sofisticados têm, em geral, maior estabilidade econômica e níveis de renda superiores. O Brasil precisa trilhar esse caminho, conforme já apontava Celso Furtado.

E isso não significa abrir mão de seus recursos naturais, mas usá-los de forma mais estratégica e inteligente, com investimentos sólidos em educação, ciência, infraestrutura e inovação.

A boa notícia é que já temos exemplos de sucesso. A Embraer, por exemplo, tornou-se uma das maiores fabricantes de aviões do mundo combinando tecnologia de ponta, formação de profissionais altamente qualificados e apoio do Estado. Isso mostra que, com planejamento e investimento, é possível conquistar espaço em cadeias globais de valor mais sofisticadas.

Para isso, o país precisa diversificar sua pauta exportadora. Não se trata apenas de vender mais para mais países, mas de vender produtos com maior valor agregado. Isso passa necessariamente por qualificar a formação profissional dos trabalhadores.

Temos uma população jovem e numerosa, mas ainda carecemos de uma educação pública de qualidade e em tempo integral para todos, especialmente nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática. Investir na formação técnica e universitária é apostar no futuro produtivo do país.

Sem infraestrutura logística eficiente, pouco se avança. Investimentos em rodovias, ferrovias, portos e digitalização de processos de comércio exterior são indispensáveis para tornar nossos produtos mais competitivos.

Entretanto, é preciso aproveitar melhor a estrutura já existente de pesquisa e desenvolvimento. O Brasil tem universidades e centros de pesquisa reconhecidos, mas falta transformar esse conhecimento em inovação aplicada à economia real. Apoiar startups, fomentar projetos tecnológicos e conectar academia e indústria são passos fundamentais.

Outro setor estratégico é o de energias renováveis. O Brasil possui uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo e tem enorme potencial para liderar a transição energética global.

A produção de hidrogênio verde, por exemplo, é uma oportunidade concreta de unir nossa vocação natural à capacidade industrial e tecnológica.

Há também ilhas de excelência que podem servir de modelo: São José dos Campos com a Embraer, o polo petroquímico da Bahia, os centros de inovação de Campinas e Florianópolis. Políticas que fortaleçam esses ecossistemas e incentivem a formação de novos polos tecnológicos regionais podem ampliar o impacto positivo dessas experiências.

O Brasil não precisa alterar sua natureza, mas sim decidir o que quer ser. Se continuarmos vendendo matéria-prima em troca de produtos industrializados, perpetuaremos um modelo que concentra renda, gera vulnerabilidade externa e limita o desenvolvimento.

Mas se escolhermos investir em conhecimento, inovação e valor agregado, poderemos mudar nosso papel na economia global — e, com isso, aumentar de forma duradoura a renda da população brasileira.

*Emerson L. S. Iaskio é Professor universitário, economista, Mestre em Desenvolvimento Econômico e Doutorando em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Foi Guest PhD Fellow na Aalborg University Copenhagen (Dinamarca).

*Israel A. Gonçalves é Doutorando no Programa de Pós-graduação em Sociologia e Ciência Política na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Mestre em Ciência Política na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e professor universitário.

*Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Leia também

Francisco Alano: Trabalhadores estão chegando ao seu limite de tolerância

Paulo Nogueira Batista Jr: ”Vamos retomar o nosso quintal”

Jeferson Miola: Armínio Fraga no capitalismo de rapinagem

Marcelo Zero: Caos e burrice não geram empregos; planejamento inteligente, sim

João Pedro Stedile: Transformação ecológica, agricultura e a sobrevivência da humanidade

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 19/04/2025