O Brasil e a Índia discutem a possibilidade de interligar seus sistemas de pagamento instantâneo — Pix e Unified Payments Interface (UPI) — para permitir transações diretas em moedas locais, sem necessidade de conversão para o dólar. A iniciativa, revelada em 12 de agosto pelo portal Coingeek, representa mais um passo na agenda de desdolarização promovida no âmbito do BRICS.
Pix e UPI: gigantes digitais no centro da proposta
O Pix, criado em 2020 pelo Banco Central, já conta com mais de 160 milhões de usuários e bilhões de transações mensais.
O UPI, lançado na Índia em 2016, movimenta volumes diários que superam o PIB de muitos países, consolidando-se como um dos sistemas mais avançados do mundo.
Ambos oferecem transferências instantâneas e gratuitas, disponíveis 24 horas por dia. A ideia é que usuários no Brasil possam enviar valores em reais e os recebedores na Índia recebam diretamente em rúpias — e vice-versa — sem passar pelo dólar como intermediário.
Conversas bilaterais e apoio político
Fontes diplomáticas confirmam que autoridades financeiras dos dois países discutem a integração e que o projeto já recebeu apoio político e técnico.
O modelo inicial pode ser lançado em caráter piloto, com foco em:
remessas de familiares,
compras online,
pagamentos de serviços.
Numa fase seguinte, empresas exportadoras e importadoras poderiam utilizar o sistema para reduzir custos e acelerar liquidações comerciais.
Potencial impacto no comércio Brasil–Índia
O intercâmbio entre os países movimenta cerca de US$ 15 bilhões anuais.
O Brasil exporta principalmente petróleo, óleo de soja e açúcar.
A Índia envia ao Brasil medicamentos, fertilizantes e bens industriais.
Com o Pix–UPI, os fluxos comerciais poderiam ganhar agilidade e previsibilidade, além de diminuir exposição cambial e custos bancários.
Especialistas avaliam que a medida fortalece a autonomia financeira e pode incentivar novas empresas a explorar a rota bilateral.
O papel do BRICS e a disputa com o dólar
A integração se insere em uma estratégia mais ampla do BRICS para reduzir a dependência da moeda americana. O bloco já discute:
uso ampliado de moedas locais,
plataformas de liquidação próprias,
moedas digitais emitidas por bancos centrais.
Para os EUA, movimentos dessa natureza sinalizam a formação de redes alternativas de liquidação comercial, que podem enfraquecer o papel estratégico do dólar, ainda que não representem uma ameaça imediata.
Desafios técnicos e regulatórios
Apesar da compatibilidade tecnológica entre Pix e UPI, o projeto enfrenta obstáculos:
harmonização regulatória, especialmente em compliance e prevenção à lavagem de dinheiro;
definição de modelos de câmbio estáveis;
governança sobre operação, auditoria e segurança do sistema conjunto.
Peso simbólico
Mesmo com impacto inicial limitado, a integração teria forte valor simbólico. Mostraria que é possível avançar em soluções práticas para a desdolarização por meio de acordos bilaterais, sem esperar por reformas estruturais no sistema financeiro global.
A parceria também reforça o papel da tecnologia como instrumento diplomático, combinando inovação doméstica com estratégias de autonomia econômica para países emergentes.