Em agosto, o Jornal GGN lança o Clube do Livro exclusivo para assinantes. A obra escolhida para inaugurar o grupo é “Pra onde vai a esquerda?”, de Guilherme Boulos.
Em 135 páginas, Boulos se debruça sobre os fatores históricos e as mudanças na sociedade que abriram portas para a ascensão da extrema-direita no Brasil e no mundo; explica como funciona essa nova ideologia neofascista em termos de tecnologia e psicologia de massas; analisa o cerco ao governo Lula e os atalhos que não servirão à esquerda brasileira na luta contra o bolsonarismo, e aponta alguns caminhos para que o campo progressista possa, enfim, sair do corner e dar uma resposta à altura dos desafios que enfrenta.
O Clube do Livro terá dois encontros, sendo o primeiro com a redação do GGN, onde os leitores poderão interagir entre si a respeito da obra. O segundo encontro será com o autor, Guilherme Boulos, e está marcado para a segunda-feira, 25 de agosto, às 18:00 horas.
O primeiro capítulo de “Pra onde vai a esquerda?” foi resumido nesta publicação aqui. Abaixo, você confere os resumos do capítulo 2 (Brasil: Governo Lula sob cerco) e capítulo 3 (Guerra cultural).
Governo Lula sob cerco
Guilherme Boulos abre o capítulo com uma provocação a respeito da vitória eleitoral de Lula em 2022: como foi possível a Jair Bolsonaro perder a tentativa de reeleição por uma margem tão estreita, após ter feito um governo tão desastroso? Somente o fato de ter tido a máquina pública na mão não explica seu substancial volume de votos. Para Boulos, a extrema-direita cresce e ganha corações e mentes, a despeito de todo mal que gera, porque nunca descansa nas redes sociais. Lá, eles espalham medo, desinformação, manipulam narrativas, criam inimigos e dão um norte para mobilizar permanentemente seus seguidores.
Dessa forma, após a eleição de 2022, a esquerda vence a extrema-direita bolsonarista, mas não consegue eleger uma maioria para acompanhar Lula no Congresso. A partir de 2023, o petista inicia seu terceiro mandato pressionado por três frentes.
De um lado, a própria oposição bolsonarista, que está desde o 1 de governo Lula fazendo ataques com fake news (vide o caso da taxação do PIX). De outro lado, está o Centrão com as garras enfiadas no orçamento secreto, que impede o governo de lançar suas próprias políticas públicas. Por sim, a constante pressão da Faria Lima, ou seja, da elite econômica do país que anseia por medidas de contenção de gastos sociais a todo custo.
Risco de distopia
Neste cenário, Boulos cogita que há um risco de o Brasil mergulhar em um ciclo distópico de extrema-direita no poder, a partir das eleições de 2026. Afinal, mesmo saindo vitoriosa das urnas, a esquerda segue acuada, e ainda não aprendeu a usar os novos meios de comunicação com a mesma maestria com que a direita usa.
Boulos arranca um band-aid ao afirmar que a esquerda só não foi derrotada em 2022 porque o candidato era Lula, que conseguiu, ao longo dos dois primeiros mandatos, deixar uma marca profunda na vida dos brasileiros. Sem Lula, a esquerda corre o risco de ver o bolsonarismo retornar ao poder em 2026 mesmo com outro nome que não Bolsonaro, para deslanchar um ciclo que pode perdurar anos.
“Se não reagirmos a tempo, estamos diante do risco distópico de um ciclo da extrema-direita no poder. Da mesma forma que o PT e a esquerda foram ganhando hegemonia na sociedade brasileira ao longo dos anos 1980 e 90 e, após isso, vencemos quatro eleições presidenciais sucessivas, o bolsonarismo está fazendo sua lição de casa e conquistando cada vez mais espaço na opinião social brasileira. O risco de um fechamento de regime é real” afirma Boulos.
Guerra cultura e algoritmos
No terceiro capítulo do livro “Pra onde vai a esquerda?”, Boulos falou sobre as raízes da guerra cultura que a extrema-direita aprendeu a encampar nas redes e na vida política pública, como forma de massificar e homogeneizar seus seguidores. O autor trata da economia da atenção e de como a psicologia social explica certos comportamentos radicalizados nos mundos real e virtual.
Boulos aponta que a extrema-direita ultrapassou a esquerda em termos de tecnologia, e aprendeu muito bem a operar nas redes sociais. Eles entenderam que os algoritmos privilegiam conteúdos que causam “indignação coletiva”. Esse sentimento introjetado nos cidadãos comuns ajuda a formar grupos coesos em ideias e visões de mundo, que logo vão ficando cada vez mais radicalizados e ganhando senso de comunidade em torno de um mesmo inimigo.
“A direita leu Gramsci, entendeu do seu jeito e partiu para a cruzada ideológica”, diz Boulos.
Olavo de Carvalho, Steve Bannon e outros gurus da extrema-direita deduziram que a esquerda, seguindo Gramsci, obteve hegemonia nas universidades, na cultura, na imprensa, nas instituições e, por isso, chamaram seus seguidores à ação numa guerra aberta contra essas figuras.
“Foi assim que o algoritmo das redes transformou as sociedades nos últimos anos e permitiu a ascensão meteórica da extrema-direita. Os conteúdos, que geram indignação coletiva, são mais recomendados pelas plataformas porque, no fim do dia, dão aos usuários um inimigo, uma causa e uma comunidade onde obtêm reconhecimento. Essa gratificação emocional leva a pessoa a ficar mais tempo conectada, ainda mais numa sociedade em que todos estão cada vez mais solitários”, aponta Boulos.

Guerrilha digital
Para operar nas redes, a extrema-direita criou, de um lado, estratégias de guerra cultural a longo prazo (como a Brasil Paralelo, que produz e dissemina muito conteúdo revisionista, quase como uma Netflix para terraplanistas) e de guerrilha digital para o cotidiano (como a estrutura do Gabinete do Ódio e a máquina de cortes de Pablo Marçal, que o próprio Boulos enfrentou na pele em sua disputa pela Prefeitura de São Paulo, em 2024).
Enquanto a extrema-direita nada de braçada com suas estratégias (confira o capítulo 1 para entender a base histórica da ideologia), a esquerda, por sua vez, ainda patina em três desafios:
- Traduzir sua visão de mundo em mobilização social
- Disputar a guerra cultural nas redes sociais
- Retomar a presença ativa nos territórios populares
No quarto e último capítulo (Pra onde vai a esquerda?), Boulos responderá à grande questão que batiza sua obra. Mas isso, vamos conferir em um próximo post.