A Polícia Federal sustenta que o então presidente Jair Bolsonaro convocou os comandantes das Forças Armadas para uma reunião na qual apresentou o documento conhecido como “minuta do golpe”, o famoso decreto que abriria caminho a uma ruptura institucional.
Os objetivos seriam impedir a posse de Lula, estabelecer Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral e viabilizar uma espécie de base jurídica para o golpe. A conclusão consta do relatório em que a PF indiciou Bolsonaro e mais 36 pessoas pela conspiração de 2022.
O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes retirou o sigilo do documento nesta terça-feira 26 e enviou o inquérito à Procuradoria-Geral da República. Cabe agora à PGR denunciar os indiciados, arquivar o caso ou solicitar novas diligências.
No dia 6 de dezembro de 2022, estiveram ao mesmo tempo no Palácio do Planalto o tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens de Bolsonaro, e o major Rafael de Oliveira, preso na semana passada na Operação Contragolpe.
A dupla foi ao palácio em horário compatível com a presença de Bolsonaro, segundo a PF. Naquele dia, também se dirigiu ao local o general Mário Fernandes, então número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, outro alvo da Contragolpe. Ele tornou a imprimir no Planalto um documento sobre o plano golpista intitulado “Punhal Verde Amarelo”, que seria executado em 15 de dezembro.
Na manhã de 7 de dezembro, após realizar pessoalmente ajustes na minuta do golpe, Bolsonaro convocou ao Alvorada os chefes militares, a fim de apresentar o documento e pressionar as Forças Armadas a aderirem ao plano de abolição do Estado Democrático de Direito, conforme o relato da PF.
Comandavam as Forças à época Freire Gomes (Exército), Baptista Júnior (Aeronáutica) e Almir Garnier (Marinha).
A reunião não teria transcorrido como Bolsonaro esperava: “Os comandantes do Exército e da Aeronáutica se posicionaram contrários a aderirem a qualquer plano que impedisse a posse do governo legitimamente eleito. Já o comandante da Marinha, Almirante Garnier, colocou-se à disposição para cumprimento das ordens”.
Diante da recusa de Exército e Aeronáutica, Bolsonaro se reuniu dois dias depois, em 9 de dezembro, com o general Estevam Theóphilo, que chefiava o Comando de Operações Terrestres. O militar, de acordo com a PF, aceitou executar as ações a cargo do Exército e liderar as tropas terrestres na intentona golpista, caso o então presidente assinasse o decreto.
Também em 9 de dezembro, Bolsonaro rompeu o silêncio pós-derrota para Lula e falou a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada. Na ocasião, incentivou as manifestações golpistas promovidas depois da eleição e fez menções aos militares.
“Nada está perdido. O final, somente com a morte. Quem decide meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês”, declarou o ex-capitão.
A PF avalia que o discurso “seguiu a narrativa da organização criminosa, no sentido de manter a esperança dos manifestantes de que o então presidente, juntamente com as Forças Armadas iriam tomar uma atitude para reverter o resultado das eleições presidenciais, fato que efetivamente estava em curso naquele momento”.
Leia o que diz a Polícia Federal sobre o papel de Bolsonaro na trama e o motivo pelo qual o plano fracassou:
“Os dados descritos corroboram todo o arcabouço probatório, demonstrando que o então presidente da República, Jair Bolsonaro, efetivamente planejou, ajustou e elaborou um decreto que previa a ruptura institucional, fato que não se consumou por circunstâncias alheia a sua vontade, no caso, a resistência do comandante do Exército Freire Gomes e da maioria do Alto Comando que permaneceram fieis a defesa do Estado Democrático de Direito, não dando o suporte armado para que o presidente da República consumasse o golpe de Estado”.