A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou sua sustentação oral à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal neste segundo dia do julgamento da trama golpista. Os advogados Celso Vilardi e Paulo Amador Cunha Bueno insistiram que o ex-presidente não liderou, instigou ou sequer participou da tentativa de golpe de Estado. As acusações negadas pela dupla foram feitas pela Procuradoria-Geral da República.
Vilardi classificou Bolsonaro como alguém que apenas foi “dragado” por uma sucessão de acontecimentos políticos e jurídicos que culminaram nos atos golpistas de 8 de Janeiro de 2023. Segundo ele, a acusação não conseguiu apresentar qualquer prova de que o ex-capitão tenha dado início ou executado um plano de ruptura.
“O presidente foi dragado por essa sucessão de fatos. Não há uma única prova de ligação dele ao chamado Punhal Verde e Amarelo, à Operação Luneta, ao Plano Copa 2022 ou ao próprio 8 de Janeiro”, afirmou.
Bolsonaro x Mauro Cid
A defesa concentrou parte de sua argumentação na contestação da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Vilardi disse, por exemplo, que Cid foi ouvido 16 vezes, mudando de versão em diferentes momentos, e apontou contradições entre depoimentos e áudios atribuídos ao militar em que ele teria reconhecido indução da Polícia Federal. “Esse homem não é confiável. Ele rompeu a delação dele e mentiu inúmeras vezes”, sustentou o advogado.
A defesa de Cid, convém lembrar, negou que no dia anterior que o delator tenha sido coagido por agentes durante as investigações.
Vilardi também questionou a forma como as provas foram apresentadas pela PF e pela PGR, dizendo que a defesa recebeu mais de 70 terabytes de dados em “arquivos gigantescos” e que foi impossível “conhecer toda essa prova em prazo tão exíguo”. A linha é semelhante a adotada pela defesa de Augusto Heleno, outro dos réus pela trama golpista.
O advogado ainda tornou a tentar minimizar a chamada minuta golpista. Segundo alegou, os arquivos foram apresentados sem contexto e, na sua visão, não há demonstração de que Bolsonaro tenha determinado ou incentivado sua execução. “Se ele recebeu, ele não a tinha antes”, citou. “E o próprio delator fala em ‘enxugar’ o texto, o que não partiu do presidente”, argumentou Vilardi.
O papel de Bolsonaro
Vilardi, por fim, reforçou que Bolsonaro teria, ao contrário do que aponta a acusação, autorizado a transição de governo em dezembro de 2022 e colaborado para mudanças no comando das Forças Armadas. Segundo ele, também houve pedidos formais do presidente para desobstruir estradas bloqueadas por caminhoneiros e redução significativa dos acampamentos antes de sua saída do cargo.
“Esse caso foi crescendo para colocar o presidente no 8 de Janeiro. Mas onde está, nos acordos de persecução penal com os golpistas, a indicação de que Bolsonaro era o líder?”, questionou.
O advogado Paulo Amador Cunha Bueno reforçou a tese central de que dois crimes imputados a Bolsonaro – tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito – exigem violência ou grave ameaça, elementos que não estariam presentes nos atos atribuídos ao ex-presidente.
“Uma live realizada em 2021 é um crime violento? Uma reunião com os chefes das Forças Armadas para discutir medidas constitucionais é um crime violento?”, questionou. “É evidente que não”, emendou em seguida.
Para os defensores, a denúncia da PGR incorre em erro ao considerar que falas públicas ou reuniões políticas constituem atos de execução de um golpe. “Dizer que o crime começou com uma live é punir um ato preparatório. A mera tentativa só se consuma com o primeiro ato de execução, o que nunca ocorreu”, argumentou Vilardi.
Com isso, a defesa pediu a absolvição de Bolsonaro e o reconhecimento das nulidades processuais. “Chegamos a este tribunal com parte da sociedade já tratando a questão como condenação, sem conhecer os autos. O Supremo não pode se render a essa narrativa”, concluiu o defensor.
Núcleo crucial
Bolsonaro é um dos oito réus do chamado núcleo crucial da trama golpista. Além dele, Mauro Cid, Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Augusto Heleno, Anderson Torres, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto estão na mira do Tribunal.
O grupo – que teria cometido cinco crimes, segundo a PGR – começou a ser julgado na terça-feira 2 e a previsão é que o julgamento avance por mais três dias na Primeira Turma do STF. CartaCapital transmite ao vivo todas as sessões. Assista: