
O ex-vice-presidente e atualmente senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) afirmou em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) que Jair Bolsonaro estava pronto para entregar o governo a Lula, então presidente eleito, no fim de 2022. Ele ainda negou ter discutido a chamada “minuta golpista” na ocasião.
Indicado como testemunha pela defesa do general Augusto Heleno, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Mourão afirmou: “Em todas as oportunidades, em nenhum momento ele mencionou qualquer medida que representasse ruptura do ‘status quo’. As nossas conversas sempre foram em torno da transição”.
Na oitiva, o ex-vice-presidente ainda disse que conversou com Bolsonaro logo após a votação do segundo turno de 2022 e prometeu entrar em contado com Geraldo Alckmin (PSDB) “para começar a transição do novo governo ungido nas urnas”. “Bolsonaro estava pronto para entregar o governo para o presidente recém-eleito”, prosseguiu.
Bolsonaro viajou para os Estados Unidos no dia 30 de dezembro de 2022, dias antes da posse de Lula. Mourão, que deveria passar a faixa presidencial ao petista, decidiu não participar da cerimônia que ocorreu em 1º de janeiro de 2023.
O agora parlamentar também nega ter sofrido pressão de bolsonaristas nas redes para aderir à trama golpista. Ele afirma que ofensas “fazem parte do jogo político”, mas que esses ataques não partiam de outros militares. “Tenho certeza que não partem de companheiros que tive dentro do Exército, partem desses grupos que vicejam nesse pântano das redes sociais”, acrescentou.

Segundo o jornal nipo-britânico Financial Times, no entanto, Mourão disse estar preocupado com a possibilidade de um golpe de Estado no Brasil durante uma visita a Nova York, nos Estados Unidos, em julho de 2022. Na ocasião, ele se reuniu com investidores em um almoço privado.
Na ocasião, o governo de Joe Biden, ex-presidente do país, sinalizou a autoridades brasileiras que manteria a neutralidade na disputa eleitoral, mas reagiria a qualquer tentativa de contestar o resultado.
Uma das fontes consultadas pela publicação foi Thomas Shannon, embaixador dos EUA no Brasil entre 2009 e 2013 (nos mandatos Lula 2 e Dilma 1), que também atuou como subsecretário para Assuntos Políticos do Departamento de Estado, cargo de destaque na diplomacia americana.
Shannon afirmou ao Financial Times que, durante a visita a Nova York, o então vice-presidente evitou responder perguntas sobre os riscos de um golpe, reafirmando a confiança nas Forças Armadas e no compromisso com a democracia.
No entanto, ao deixar o encontro e entrar no elevador com o diplomata, Mourão teria mostrado uma visão mais preocupante. Segundo a reportagem, Shannon revelou a Mourão, nessa conversa reservada, que compartilhava o temor de golpe manifestado pelos investidores e que estava “muito preocupado”. Mourão respondeu: “Também estou”.
A declaração de Mourão também diverge de outra testemunha da trama golpista: Carlos Almeida Baptista Júnior, ex-comandante da FAB (Força Aérea Brasileira), que confirmou a apresentação da “minuta golpista” aos então chefes das Forças Armadas durante reuniões em 2022.