O relatório final da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe de Estado de 2022 detalha uma proposta do então diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luís Ramagem, para restringir a autonomia de delegados federais. Segundo o documento, a intenção era permitir que o diretor-geral da PF controlasse diretamente os inquéritos em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de proteger Jair Bolsonaro, à época alvo de investigações.
Anotações encontradas com Ramagem mostram que ele sugeriu ao ex-presidente a centralização dos casos no diretor-geral da PF, argumentando que a medida era semelhante à forma como o procurador-geral da República supervisiona processos no Ministério Público. “Inquéritos com trâmite junto ao STF têm que ser presididos pelo próprio diretor-geral da PF. Irão espernear, mas o argumento é válido”, escreveu Ramagem.
A PF observou que as anotações criticam a escolha de delegados por ministros do STF, como Alexandre de Moraes, responsável por investigações importantes contra aliados de Bolsonaro, incluindo o inquérito das fake news e os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Ramagem também acusou a direção da PF de falta de coragem em questionar essas decisões.
O documento analisado foi criado em 5 de maio de 2020 e revisado pela última vez em março de 2023. A criação da proposta ocorreu logo após Ramagem ser barrado por Alexandre de Moraes de assumir o comando da PF, em abril de 2020, devido à sua proximidade com Bolsonaro.
A tentativa de nomeação de Ramagem resultou na demissão do então ministro da Justiça, Sergio Moro, ex-juiz da Lava-Jato e atualmente senador pelo União Brasil-PR, que acusou Bolsonaro de interferir na Polícia Federal.
Na visão de Ramagem, o modelo proposto fortaleceria o controle da direção-geral sobre os inquéritos envolvendo autoridades com foro privilegiado, reduzindo a autonomia dos delegados responsáveis por essas investigações. Na época, o Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq), subordinado à Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), conduzia tais casos de forma independente.
Em 2021, durante o governo Bolsonaro, a ideia foi retomada pelo então diretor-geral da PF, Paulo Maiurino. Ele sugeriu ao STF um modelo semelhante no contexto de debates sobre a delação premiada do ex-governador Sergio Cabral.
A medida foi vista como uma tentativa de controle político sobre investigações sensíveis, mas enfrentou resistência interna e externa. Investigadores apontaram que a proposta comprometia a autonomia das apurações conduzidas pela PF.
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