Na segunda-feira (5), diante de uma mobilização com características de uma “revolução colorida”, a primeira-ministra de Bangladexe, Xeique Hasina, fugiu para Índia. Ela havia renunciado pouco antes. Um avião de transporte C-130 Hercules pousou na Base Aérea de Hindon, em Ghaziabad. A Força Aérea Indiana acompanhou o voo de Bangladexe e estacionou o avião em um hangar.

A residência de Hasina na capital, Daca, foi invadida por manifestantes após a notícia de sua partida do país se tornar pública. Uma junta militar, então, tomou o poder. Agora, segundo a imprensa indiana, ela pretende seguir para Londres.

As manifestações, que acontecem há semanas, estavam exigindo a abolição de uma lei de emprego que aloca cotas no serviço civil para descendentes de pessoas que participaram pessoalmente da guerra de independência nacional de 1971 contra o atual Paquistão. Cerca de 300 pessoas foram mortas nos confrontos, sendo mais de 90 só no último domingo (4). A reivindicação em si não parece ser motivo de tanta revolta, e a violência também é típica das chamadas revoluções coloridas.

Hasina foi primeira-ministra de 1996 a 2001 e novamente desde 2009. Ela tem uma longa história de atritos com os Estados Unidos. Em abril, ela criticou as ações da política externa dos EUA em países de maioria muçulmana sob o pretexto de “democratização”. Em maio, ela acusou os EUA de tentar criar um “Estado cristão” ao dividir partes de Bangladexe e a Birmânia. No mesmo mês, ela revelou que lhe foi oferecida uma vitória nas eleições realizadas em janeiro em troca da permissão de um país imperialista não divulgado construir uma base aérea na Ilha de St. Martin, em Bangladexe, na Baía de Bengala. Seu governo rejeitou a proposta, mantendo sua política externa e de segurança de “malícia para ninguém”, que exclui a adesão a qualquer bloco militar.

A imprensa imperialista, incluindo o portal do Departamento de Estado dos EUA, Voice of America, destacou a decisão dos partidos de oposição de Bangladexe de boicotar a votação de janeiro, que o partido da Grande Aliança de Hasina venceu posteriormente. O porta-voz do Departamento de Estado, Mathew Miller, afirmou que a eleição “não foi livre ou justa”. No período antes das eleições, a Rússia acusou o embaixador dos EUA, Peter Haas, de interferir nos assuntos internos de Bangladexe ao apoiar manifestações golpistas e se reunir com líderes da oposição.

Observando o quadro geral, tudo aponta para um golpe de Estado do imperialismo. Questionam as eleições, apoiam a oposição, financiam protestos e acusam o governo de ser autoritário. É quase a mesma cartilha usada contra Nicolás Maduro. Com a diferença de que o regime bolivariano é bem mais estável do que o governo derrubado de Bangladexe.

Em um discurso à nação na segunda-feira (5), o chefe do Estado-Maior do Exército de Bangladexe, general Waker-Uz-Zaman, declarou que estava “assumindo total responsabilidade” pela formação de um governo interino após a renúncia da primeira-ministra Hasina. O novo governo incluirá representantes “de todos os principais partidos políticos”, disse Zaman. “O país sofreu muito. A economia foi afetada, muitas pessoas foram mortas, é hora de parar a violência. Espero que, após meu discurso, a situação melhore”, continuou.

Zaman pediu aos manifestantes que dessem ao exército “algum tempo” para acalmar a situação e pediu que “ficassem calmos e voltassem para casa”. Não há planos para introduzir um toque de recolher ou estado de emergência no momento, disse ele. Alguns líderes de protesto avisaram que não aceitariam nenhum “governo militar”.

Na segunda-feira (5), Rui Costa Pimenta, presidente do Partido da Causa Operária (PCO), se pronunciou sobre o caso na edição desta segunda-feira (5) do programa Análise Internacional, do Diário Causa Operária no YouTube:

“Bangladexe é um país que escapa um pouco do radar, são muitos acontecimentos, ninguém está de olho. Mas, pela primeira impressão na imprensa internacional, parece ter sido um movimento impulsionado pelo imperialismo. Os jornais falam que o regime político em Bangladexe é um reino de terror, essa coisa toda. Conhecemos esse discurso, é um discurso da propaganda imperialista contra regimes que até podem ser uma ditadura, mas só falam que é uma ditadura, que é reino do terror quando interessa a eles falar porque ninguém fala isso de outras coisas.”

Essa não é a posição só do dirigente do PCO. O marechal da reserva indiano Matesuaren se pronunciou sobre o caso em entrevista à Sputnik. Ele afirmou sobre os protestos que “os estudantes são um grupo facilmente influenciável e, infelizmente, neste caso, caíram sob a influência do Ocidente, exigindo a renúncia de Hasina”. Destacou também a participação do imperialismo: “os EUA não hesitam em desestabilizar qualquer país para seus interesses egoístas. Neste caso, apoiaram islâmicos radicais. Acredito que o fator principal foi que os EUA consideraram Xeique Hasina muito próxima da China, enquanto ignoravam sua amizade com a Índia. Os EUA alcançaram seu objetivo ao derrubá-la do poder”.

Ele ainda afirmou que: “quando se trata de seus interesses, eles não se importam com nenhum parceiro estratégico ou aliado, como já vimos várias vezes na história. Eles buscam uma situação em que possam explorar a instabilidade regional para suas necessidades estratégicas. Mianmar já foi desestabilizado, e agora é a vez de Bangladexe”.

Ele não citou o Paquistão, onde a situação foi muito semelhante. Um golpe de Estado foi dado pelo parlamento apoiado pelos militares em 2022 contra o primeiro-ministro Imran Khan. Bangladexe e Paquistão são, na prática, o mesmo país, são províncias da Índia separadas pelo imperialismo. Ou seja, se há intervenção em um deles, o golpe no outro é quase certo.

Rui Pimenta ainda comentou: “dá aquela impressão de que é uma operação impulsionada pelo imperialismo, ainda mais quando vemos que quem dirige a mobilização é um movimento de estudantes. O imperialismo tem penetrado nas universidades com posições direitistas, tem organizado e, em todos os lugares em que há uma mobilização reacionária, os estudantes são linha de frente. Venezuela, Egito, Ucrânia, é comum. Então, vamos esperar para ver o que todo mundo fala. Quando todo mundo se posicionar, vai ficar claro o que está acontecendo em Bangladexe”.

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Last Update: 06/08/2024