Neste domingo, 18 de agosto, completam-se 174 anos do falecimento do gênio literário Honoré de Balzac. Tão prodigioso ele foi, tantos personagens criou, que sobre A Comédia Humana já se disse que Balzac aumentou os registros de certidões de nascimento na França.
Sobre ele, assim publicou o escritor e pensador José Carlos Ruy:
“Fundador do realismo literário moderno, Balzac deu à literatura quase uma dimensão histórica – ou, dito de outra forma, deu expressão literária aos fenômenos políticos, sociais, econômicos, de seu tempo.”
Na edição da Editora Globo, estão 90 romances de Balzac em 17 volumes, publicados em 1989. Note-se que A Comédia Humana não reúne toda obra de Balzac. Estão fora romances, que ele viu não se integraram como personagens da grande família social, e cartas, crônicas e críticas.
Orientação, notas e introdução dos romances por Paulo Rónai, que merecia um texto sobre o seu papel de intelectual fugido do nazismo, iluminando o Brasil com a sua cultura.
Entre vários pontos altos da obra colossal, destaco duas obras-primas da literatura mundial: “Ilusões Perdidas” e “O Pai Goriot”.
Algumas notas sobre “O Pai Goriot”:
“O segredo das grandes fortunas sem causa aparente é um crime esquecido porque o serviço foi bem-feito”, fala uma das páginas do livro.
O próprio Balzac dizia do romance:
“O Pai Goriot é uma obra-prima. A pintura de um sentimento tão grande que nada o esgota, nem os atritos, nem as feridas, nem as injustiças: um homem que é pai, como um santo, um mártir e cristão.”
Quando publicado, o romance teve um sucesso de escândalo. Recebeu críticas violentas. As burguesas se revoltaram. Sobre elas, respondeu Balzac: “um número sobre-humano, inesperado, de mulheres sinceramente virtuosas, felizes de serem virtuosas, virtuosas por serem felizes e sem dúvida felizes porque são virtuosas”.
Nas notas para o romance, como um esqueleto ao qual o romancista iria pôr carnes e músculos, Balzac escreveu: ‘Um homem bom – pensão burguesa – 600 francos de renda – é despojado a favor das filhas, as quais têm, cada uma, 50.000 francos de renda – morrendo como um cão”.
Os personagens secundários em “O Pai Goriot” seriam de primeiro plano em qualquer outro romance escrito até hoje. Que secundários principais! Eugène de Rastignac é um jovem provinciano que estuda Direito em Paris e quer muito subir na vida, e por isso recebe lições do bandido Vautrin de como se dar bem, virar rico: vida de gigolô e amante de esposas virtuosas de banqueiros.
Vautrin foi inspirado na pessoa de Eugéne-François Vidocq, um genial delinquente com talento para falsificações. Preso, depois se tornou policial. Ele chegou a ser chefe da brigada de segurança de Paris. Quando deixou a polícia, Vidocq fundou a primeira agência de detetives particulares do mundo.
Sobre esse personagem escreveu Balzac:
“Os olhos de Vautrin, como os de um juiz impiedoso, pareciam ir ao fundo de todas as perguntas, ler todas as naturezas, todos os sentimentos e pensamentos.”
Tinha ombros largos, peito bem desenvolvido, músculos aparentes, mãos fortes. Seu rosto, sulcado por rugas prematuras, oferecia sinais de dureza que eram desmentidos por suas maneiras dóceis e amáveis.
Para concluir este esboço de um artigo que poderia ser. Paulo Rónai, em A Vida de Balzac, que abre a edição brasileira de A Comédia Humana, escreveu que Balzac era o Napoleão da literatura, mas sem a derrota de Waterloo. Ao que hoje acrescento: para a nossa maior felicidade, sempre.
Engels, em “Carta a Margaret Harkness – Abril de 1888”, escreveu sobre Honoré de Balzac:
“Balzac, que considero de longe o maior mestre do realismo de todos os Zolas do passado, presente ou futuro, proporciona-nos na sua Comédie Humaine, uma história maravilhosamente realista da ‘sociedade’ francesa, descrevendo, no estilo de crônica, quase ano por ano, de 1816 a 1848, a pressão crescente da ascensão da burguesia sobre a sociedade dos nobres que se estabeleceu a partir de 1815 e voltou a instalar, na medida do possível, (tant bien que mal), o padrão da vieille politesse française (velha delicadeza francesa).”
E os únicos homens aos quais se refere com clara admiração são os seus antagonistas políticos mais acirrados, os heróis republicanos do Cloitre Saint Mary, aqueles que nessa época (1830-36) eram os verdadeiros representantes das massas populares.