Austrália, ainda. A Faria Lima e as calçolas de Odete
por Armando Coelho Neto
Segue a viagem. Agora, já vi e já comi canguru, saí do cartão postal, entrei em supermercados e bodeguinhas gerenciadas por imigrantes. Visitei a periferia quase inexistente, não vi pedintes, e em momento algum houve sentimento de insegurança. Não havia sem-teto, ou melhor, foi possível ver em oportunidades distintas, dois loiros excêntricos sob marquises, possivelmente australianos, cercados de livros. Quando muito, algo parecido com um Eduardo Marinho da vida, ainda que a comparação possa ser infeliz.
A Austrália conta com programas humanitários em diferentes áreas, com assistência social e previdência, apoio a famílias, protege aborígenes, dá assistência a idosos, crianças, pessoas com deficiência, desempregados, tem até um programa especial para imigrantes, com ensino gratuito da língua. Tem o seu correspondente bolsa família, uma rede de transporte público eficiente, de forma a ser possível afirmar genericamente, que necessidades básicas são atendidas, capazes de sedimentar a imagem de país onde vige o paradoxal “capitalismo humanizado”.
Mas, em nome do combate ao comunismo, nem “capitalismo humanizado” se pretende no Brasil. Aos poucos a ideia de que pobre prefere bolsa família a ter que trabalhar volta com peso. A ideia da esmola social idem, enquanto defendem a vida por meros nove meses (combate ao aborto), e condenam mães vitimas de estupradores. Defesa da vida só no santo ventre. Depois que nasce, sequer Brasil Carinhoso (obrigado Dilma Rousseff!) merece respeito. E o mais grave, chavões repetidos por pobres!
Enquanto isso, bandidos se autoexilam para conspirar contra o Brasil no exterior. O Supremo Tribunal Federal sofre ataques todos os dias, inclusive com ações descaradamente ilegais, simplesmente para serem recusadas, e assim alimentar a espiral destruidora de uma sociedade que poderia ser mais justa ou menos injusta. Cá pras terras dos cangurus, há de qualquer forma esforço humanizante. Afinal, até a OCDE aponta indicadores ruins nesse “capitalismo humanizado” australiano.
Sim, há teóricos e práticos que abominam a ideia de “capitalismo humanizado”. O que na prática seria uma tentativa de impedir que a ganância primata de que se reveste, não se alimente da miséria e pudesse promover bem-estar social e dignidade humana. Ok, há um paradoxo nessa ideia, que Marcia Moussallem qualificou como falácia, nesse GGN. Mas não há como comparar uma sociedade produtiva com um mínimo de regras humanizadas, com a escravidão absoluta da exploração. Sem preciosismos, então.
A pequena amostra testemunhada nessa curtíssima temporada australiana, além dos cangurus e da mal comemorada vitória da esquerda, é que se vive algo tolerável, fruto de reivindicações do Partido Trabalhista local (Australian Labor Party – ALP) criado em maio de 1901. A rigor, porém, a ALP é fruto de várias lutas trabalhistas datadas de 1891. O PT no Brasil, criado em 1980, apesar das alianças e gambiarras com a direita, a exemplo do PT australiano, tenta com menos força, claro, manter suas origens.
Entre as vantagens a se destacar nessas plagas de cangurus, é não terem sido eleitos militares e civis traidores de todos os gêneros, narcotraficantes, militantes do Evangelistão do Pó, Chupetinhas, depiladores de ânus, estupradores, pedófilos juízes analfabetos ladrões, “destruidores pacíficos do patrimônio público”, torturadores defensores de direitos humanos, negros e gays que se sentem mais brancos e machos, aos fazerem discursos contra suas próprias condições. Ah! A Faria Lima daqui é bem menos Odete Roitman!
Mas, o Brasil tem uma Faria Lima, que para alguns, e com certa razão, está prenhe de “farinha e lama” no pior sentido. Na Faria Lima, os sapatênis tripudiam da miséria alheia. O Brasil ser uma Suíça, Noruega, Suécia, Austrália – em programas sociais, nem pensar! Ser um Sudão do Sul, Somália ou Burundi bastam, desde que consigam multiplicar lucros, criar leilões para vender o patrimônio nacional, de preferência com o martelinho de Tarcisio de Freitas, em trio caipira com Paulo Guedes e Odete Roitman.
No Brasil, a lama da Faria Lima calou o Lula. Saiu Campos Neto, entrou Gabriel Galípolo e a ciranda financeira continua, lesando o país em trilhões de reais, para agonia do povo e delírio dos sapatênis. Ops! O assunto é ou seria Austrália, mas tem que falar do Burundi, ou debater a última mentira dita por um pastorzinho bandido aprendiz de malafismo (ou seria malacraia), pois assim se escondem os juros que alimentam a miséria. Cada ponto na Selic, diz o BC, aumenta em R$50 bilhões a dívida brasileira.
É. A Faria Lima da Austrália não veste as calçolas de Odete Roitman!
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo
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