
Por Flora Villela
Da Página do MST
Como parte do 34º Encontro Estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Minas Gerais, aconteceu na noite deste sábado (13), o Ato Político e Cultural Sem Anistia Para os Crimes da Mineração. O momento denunciou os crimes, ambientais e humanos, cometidos pelo setor minerário nas bacias do Rio Doce e Paraopeba. E marcou a assinatura do Projeto de Recuperação Econômica Agroecológica da Bacia do Rio Doce.
Denunciando os 10 anos do rompimento da barragem de Fundão – da Samarco e BHP Billiton – em Mariana, o encontro acontece no assentamento Oziel Alves, em Governador Valadares, região atingida pelo despejo do rejeito no Rio Doce. Estiveram presentes parlamentares, representantes do Governo Federal e entidades parceiras do MST. Para o movimento, como foi destacado no evento, além do enfrentamento ao latifúndio, o combate à mineração predatória é cada vez mais urgente.
“Enfrentamos os representantes do Latifúndio e do Agronegócio, mas também as mineradoras. Enfrentamos quando construímos a Reforma Agrária Popular, que tem como objetivo a democratização do acesso à terra, com a missão de produção de alimentos saudáveis em escala, para alimentar o povo brasileiro. No combate à fome, gerando renda para melhoria da condição de vida das nossas famílias e do povo, cada vez mais nos colocamos na tarefa da defesa do meio-ambiente e dos bens comuns da natureza, nos desafiando a plantar 100 milhões de árvores em 10 anos” apontou Fábio Nunes, da direção estadual do MST pelo setor de produção, durante a abertura do ato.
O rompimento de Mariana resultou na morte de 19 pessoas e do Rio Doce, deixou milhares de atingidos diretos e indiretos e um dano irreversível na biodiversidade de toda a bacia. Ao todo foram 52 assentamentos e acampamentos atingidos. No rastro dos cerca de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, que chegaram até o mar no Espírito Santo, ficou a impunidade flagrante denunciada pelo MST. Diante disso, o Movimento aponta a responsabilidade e conivência do governo do estado de Romeu Zema (Novo), para com os crimes da mineração.

“Essa é uma conquista importante que vai nos dar condições de buscar a reparação. Para isso nós lutamos tanto e estamos muito contentes, felizes, honrados de encerrar 2025 com essa conquista. Mas muito preocupados. Nós já estamos completando o aniversário da homologação que o STF fez sobre o novo acordo do Rio Doce. E temos que ter essa capacidade de autocrítica e dizer: Se esse é o primeiro projeto que está sendo assinado, nós estamos muito felizes, mas muito preocupados. Porque o nosso povo é quem está deixando de receber e ter acesso a esse direito”, apontou em sua conclusão, Silvio Netto, integrante da coordenação nacional do movimento.
A assinatura do novo projeto
Em uma mesa simbólica e potente, composta só por mulheres, o Projeto de Recuperação Econômica Agroecológica da Bacia do Rio Doce foi assinado por Maíra Santiago, coordenadora Cooperativa de Trabalho da Agricultura Camponesa de Minas Gerais (Coopertrac); Luiza Monteiro de Souza, diretora financeira do Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab); Patrícia Bourguignon, gerente de projetos da Fundação Espírito-santense de Tecnologia (Fest); E Adriana Aranha, gerente extraordinária de Recuperação da Bacia do Rio Doce, representante da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).
Ao longo dos anos, o movimento tem construído várias ações e culminando, após o rompimento da barragem, na construção do nosso Programa de Agroecologia da Bacia do Rio Doce. Para Santiago, esse momento é importante por simbolizar o início de uma nova fase no Programa, em Minas Gerais e no Espírito Santo. “Esperamos que esse novo projeto nos ajude a avançar ainda mais na nossa grande estratégia, que é massificar a agroecologia e produzir alimentos saudáveis, como uma ação central. Demonstrando que a Reforma Agrária é o caminho, a agroecologia é o caminho. É com alegria que a gente assina essa parceria com a Fest e o MDA, para dar continuidade ao nosso programa “, aponta ela.

Como explicou Maíra, daqui em diante, a proposta é dar continuidade ao programa em curso desde 2019. Para isso, o MST se baseia em seis grandes ações para massificar a agroecologia junto com os e as camponesas aqui da região do Médio Rio Doce: Acesso a bio insumos agrícolas, a produção de mudas, as semenstes, a ampliação dos nossos quintais produtivos, logística de comercialização e consolidação da equipe de assistência técnica
Com o propósito de promover a transição agroecológica, desde 2016 e tendo se intensificado em 2019, o MST consolidou assistência técnica direta às áreas atingidas pelo rompimento da barragem, atendendo aproximadamente 200 famílias. O eixo ambiental hoje já tem mais de 2.000 hectares protegidos. Foram elaborados projetos de barraginha, saneamento básico e de restauração florestal. O movimento também realizou um projeto de educação, com atividades em diversas áreas: saúde, educação, cultura, produção, juventude e mulheres. Além disso, foram feitos mutirões, implementação de quintais produtivos, um curso técnico e a construção da agroindústria do Assentamento Oziel.
Candidaturas Sem Terra
Em um segundo momento do ato político aconteceu um balanço do significado presente na assinatura deste novo projeto e do aporte de recursos na região do Vale. Ao longo de 6 anos, o MST desenvolveu ações de recuperação ambiental em mais de 2.000 hectares com a projeção de chegar a 5.300 hectares nos territórios de reforma agrária. São ainda, mais de 500 mil mudas plantadas. Porém apesar dos avanços ainda falta muito para que a atuação do atual governo seja satisfatória no que tange a Reforma Agrária.
“Nós também estamos muito felizes com os avanços que tivemos na reforma agrária ao longo de 2025, principalmente aqui em Minas Gerais. Mas a nossa felicidade, não pode nos deixar virar cegos diante a realidade. O nosso governo está em dívida com a reforma agrária. Se o ato é simbólico e é importante, de decretar a desapropriação da antiga Usina Ariadnópolis, o nosso governo deveria ter vergonha de virar 3 anos e ainda não ter assinado o decreto de Felisburgo. O nosso governo teria que ter vergonha de ser o governo que menos assentou famílias entre todos os governos democráticos.” apontou Netto.

Foram também apresentadas as pré-candidaturas do MST em Minas Gerais, para as eleições de 2026. Seguindo o exemplo de outros estados, como o Rio de Janeiro e Pernambuco, no próximo processo eleitoral o Movimento estará construindo as candidaturas a Deputado Federal de Bela Gonçalves (Psol), hoje deputada estadual e na reeleição de Rogério Correia (PT), candidato prioritário do MST em todas as regiões do estado. Além disso, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) o MST espera ser presente por meio da candidatura de Bruno Pedralva (PT), hoje vereador na capital mineira.
“Estou emocionado demais de estar aqui hoje. Esse movimento que, mais do que nunca é renovado e sintonizado, com toda sua sabedoria, à luta para derrotar a extrema direita e o bolsonarismo no Brasil. Derrotar o Zema em Minas Gerais, os filhotes de Bolsonaro e o Matheus Simões. Por isso onde eu vou eu carrego a bandeira e a camisa da MST. E eu vou junto com vocês aonde tiver que ir para fazer a reforma agrária e a revolução brasileira. Viva a luta popular” declarou Pedralva.
Para Rogério Correia, que acompanha desde o início o processo de luta por justiça na bacia do Rio Doce, a assinatura do projeto é uma vitória espetacular dos trabalhadores e trabalhadoras atingidos pelo crime da mineração.
“Não falamos de retórica, que foi um crime. As empresas sabiam que aquilo tinha uma chance enorme de romper. E o pior, sabiam que se houvesse o rompimento, a lama iria para todo o Rio Doce e chegaria ao mar. E mesmo assim, não tomaram as decisões corretas para evitar que essa tragédia criminosa acontecesse. Nós acabamos, portanto, tendo naquela ocasião 21 mortes e também toda essa devastação ambiental que segue até hoje “, relembrou o deputado federal.

“Quando a gente vê a assinatura de um contrato como esse, sabemos que as coisas estão avançando. Eu queria parabenizar o MST por essa vitória, porque soube compreender que era necessário reivindicar e concretizar o que ia ser feito, para que no caso dos assentamentos, chegasse até vocês as soluções de problemas que estão sendo colocados, afinal de contas as lamas chegaram no assentamento. Por tanto a agricultura que se fazia não pode ser feita da forma que era feita depois na lama. A água não pode ser bebida da forma que era bebida antes da lama e aproveitada como era”, reforçou ainda o deputado parceiro do MST.
Na mesma linha, para Bella, “a mineração só vai causar uma destruição enorme no rio e no solo. Quer consertar? Quer resolver? Tem que fazer reforma agrária em toda a bacia do Rio Doce, em toda a bacia do Rio Paraopeba “, pontuou Bella.
Compunham também a mesa, Adriana Aranha, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA); a superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Neila Batista; o deputado federal, Leonardo Monteiro (PT); Júlia Restori, do ministério do desenvolvimento social (MDS); e Gilsa Santos (PT), vereadora de Governador Valadares.
Os parlamentares presentes também denunciaram a situação política que o país vive, com um Congresso inimigo do povo que na calada da noite vota contra o povo brasileiro e reafirmou a defesa da democracia. O deputado Rogério Correia que a alguns dias foi agredido no Congresso Nacional ao defender o também deputado Glauber Braga de uma violenta expulsão do plenário, ressaltou a importância de ficarmos muito atentos à conjuntura do país hoje.
“Os golpistas apesar de presos continuam na luta política do dia a dia sempre pensando em golpes. É o que eles fazem no Congresso Nacional, o tempo inteiro, e a gente tem que estar atento para saber garantir também a democracia. Nós não queremos um congresso inimigo do povo, aprovando leis que atrapalham o meio-ambiente e leis que aumentam a violência no Brasil. Queremos um congresso nacional que ajude o presidente Lula a, de fato, governar. Que ao invés de xingar o MST, faça reverência àqueles que lutam pela terra e trabalham na terra. A gente quer um congresso nacional que trabalhe e aprove o Plano Nacional de Educação, que taxe os milionários, enfim, que seja a cara do povo brasileiro e não a cara das elites brasileiras” considerou Correia.
O ato político do 34° Encontro Estadual do MST-MG também reafirmou o compromisso com a defesa da democracia, não somente desde a luta institucional, mas também nas ruas, através da luta popular.
*Editado por Erica Vanzin