O programa Observatório de Geopolítica transmitido pelo canal do GGN no Youtube nesta semana [assista abaixo] apresentou um debate mediado pela jornalista e editora-chefe Lourdes Nassif, com os doutores em Relações Internacionais Roberto Moll e Neusa Bojikian. Em pauta, as reações da China diante do tarifaço de Trump. O debate aborda a avaliação da política econômica de Donald Trump sob três dimensões principais, conforme proposto por Neusa.

A primeira dimensão é o personalismo de Trump, caracterizado por uma lógica transacional e decisões baseadas na fidelidade de sua base eleitoral. Suas reações a notícias e redes sociais retroalimentam suas decisões, e ele demonstra um forte desejo por acordos bilaterais, mesmo que isso prejudique normas multilaterais ou contradiga seus assessores. Trump vê o déficit comercial como uma derrota nacional e o protecionismo como demonstração de força, elevando tarifas, como as impostas à China (chegando a 145%), sem consulta prévia ao setor produtivo e justificando-as em nome da segurança econômica e independência nacional.

A segunda dimensão analisada é a influência de seus conselheiros e de atores econômicos, muitos ligados ao mercado financeiro e à mídia. Figuras como Scott Bessent, atual secretário do Tesouro, defendem uma nova geoeconomia baseada em blocos ideológicos, forçando países a escolherem lados. Howard Lutnick, secretário de Comércio, representa o setor financeiro especulativo e apoia a desregulamentação agressiva, alinhando-se a Elon Musk. Peter Navarro, conselheiro para comércio e manufatura, defende um decoupling total com a China e o uso intensivo da seção 301 para punir práticas chinesas. Esses assessores, apesar de não formarem um projeto coeso, atuam em frentes complementares, orbitando em torno de Trump e dependendo de sua disposição para escalar conflitos. O núcleo econômico de um possível segundo governo Trump é descrito como uma “colcha de retalhos de interesses poderosos” com potenciais conflitos internos.

A terceira dimensão é o contexto geopolítico e de competição sistêmica com a China. Trump reconhece uma nova fase de competição, e a escalada tarifária é uma marca de sua política, intensificando-se agressivamente. Sua estratégia unilateral e confrontacional, com retórica de guerra econômica, visa desindustrializar a China e forçar empresas americanas a relocalizarem a produção. Ele utiliza tarifas como ferramenta geoeconômica, intensificando uma prática já existente em governos anteriores. Apesar de manter alguns incentivos domésticos da política industrial de Biden, ele retira as contrapartidas, buscando agradar agentes econômicos que pressionam pela desregulamentação e visando reduzir a dependência de cadeias produtivas críticas através de negociações bilaterais.

Roberto Moll levanta a questão de por que Trump persiste em políticas tarifárias aparentemente falhas. Ele explora diversas explicações, incluindo a irracionalidade alegada de Trump e a possível influência da demagogia. Outra hipótese é o oportunismo especulativo, onde grupos com informações privilegiadas lucram com as oscilações do mercado. Mol também menciona uma explicação heterodoxa e “masculinista”, que conecta o discurso tarifário à promessa de trazer empregos de volta para uma classe média branca e pauperizada, articulado com um discurso moralista sobre a figura do homem trabalhador. No entanto, ele argumenta que nenhuma dessas explicações isoladamente justifica a agressividade da política tarifária.

Moll sugere que a política tarifária pode ser uma estratégia para aumentar a arrecadação e sair do déficit, especialmente após as promessas de isenção fiscal, sendo a tarifação indireta sobre importações uma alternativa ao aumento de impostos diretos. Ele também explora a possibilidade de que alguns setores apostem na desvalorização da moeda dos parceiros comerciais para aumentar a competitividade dos EUA sem gerar inflação excessiva. Outra perspectiva é que as tarifas sejam usadas como instrumento de chantagem para forçar outros países a negociarem bilateralmente a redução de tarifas, visando abrir mercados. Essa dualidade de objetivos gera um embate entre diferentes grupos de interesse que sustentam o governo Trump.

A reação da China

A China, por sua vez, responde às tarifas de Trump com uma reorganização estratégica de seu papel no comércio internacional e na governança econômica. Suas medidas incluem a imposição de tarifas adicionais sobre produtos americanos, atingindo o setor agrícola, a suspensão de licenças de exportação para frigoríficos dos EUA e a drástica redução da importação de grãos americanos. Observa-se uma aceleração na diversificação de fornecedores, beneficiando países como o Brasil. A China busca autossuficiência tecnológica, utilizando as ações de Trump como legitimação para essa estratégia.

No plano geopolítico, a China reforça a cooperação com países da Ásia (EAEU), a União Europeia e os países do BRICS, além de aumentar a cooperação energética com a Rússia e países africanos. Discursivamente, defende o multilateralismo e a OMC, buscando um reposicionamento na governança global e incentivando negociações comerciais em sua própria moeda para escapar da dependência do dólar.

Internamente, o governo chinês utiliza um nacionalismo econômico, apresentando as tarifas como um ataque à soberania tecnológica, incentivando o consumo de produtos nacionais e oferecendo suporte às empresas afetadas. A China busca se fortalecer diante das tarifas, aproveitando o vácuo deixado pelos EUA para avançar com seu plano estratégico.

Assista ao programa completo abaixo:

Este texto foi construído com ajuda de I.A.

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Last Update: 18/04/2025