As tarifas, a liquidez corporativa e a recessão
por Sérgio Torggler
Na imprensa, a explicação dominante sobre o efeito recessivo do aumento das taxas aduaneiras é apresentada por uma relação de causa e efeito entre preços e juros. O aumento das taxas aumenta a inflação, para combater a inflação os BCs aumentam os juros, e o aumento do custo do dinheiro deprime a demanda e encarece o capital para as empresas, forçando uma redução atividade econômica.
Essa relação da recessão pelos juros é consenso, mas não é o mecanismo recessivo das tarifas mais rápido e relevante. O efeito mais imediato e impactante das tarifas não é através dos juros, mas na demanda de capital de giro, também chamado de NIG (necessidade de investimento em giro) ou de OPEX (operational expenditure).

Explicando melhor, o consumo de recursos financeiros com o pagamento das taxas de importação se incorpora ao estoque e as contas a receber porque as taxas são tributos cumulativos, isto é, as taxas não são recuperáveis para serem usadas nas etapas seguintes. Assim, as taxas são recursos que ficam retidos no capital circulante e expandem a necessidade de capital de giro. Se novas tarifas de 10% são criadas, a demanda de capital de giro com estoque expande 10%. O aumento da demanda de capital de giro com recebíveis será um pouco menor, depende da margem praticada pela entidade, se o aumento das tarifas implicar num aumento de preços de 5%, esse será o aumento de contas a receber.
Acontece que o maior fator limitante nas operações corporativas é a disponibilidade de capital. As empresas normalmente trabalham com limitada folga financeira, não podem expandir seus estoques e recebíveis de uma hora para outra sem dispor de fontes de financiamento permanente.
Uma das opções das empresas será continuar com a venda do volume físico atual, para isso as empresas terão que encontrar fontes de capital para fazer frente à expansão da necessidade de capital de giro. Caso esse aumento de capital de giro seja feito com empréstimos, o risco financeiro das empresas aumentará. Se isso for um movimento coletivo, haverá diminuição da liquidez no mercado, o custo do dinheiro deverá aumentar e a rentabilidade do acionista será comprometida. Muitas operações deixarão de ser viáveis .

A segunda opção será reduzir as compras e as vendas para ajustar a demanda de capital de giro às fontes permanentes de capital. Desta forma, a oferta de mercadorias será diminuída e, como consequência, poderá desencadear um desabastecimento ou um processo inflacionário por demanda.
De qualquer forma, o impacto no capital de giro será forte e imediato nas cadeias produtivas, muito mais do que o efeito dos juros.
Prof. Sérgio Torggler
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