A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), anunciada na quarta-feira (30), de manter a taxa de juros em escorchantes 15%, a mais alta em 19 anos, segue desafiando o setor produtivo e a vida financeira das famílias brasileiras. Com um arrocho monetário em elevação há quase um ano, os ganhos da cadeia produtiva nacional, advindos do início do ciclo de queda dos juros no segundo semestre de 2023, já começam a ser revertidos. Após a divulgação do índice nesta semana, a grita foi geral.

Um exemplo é o crédito habitacional. Desde que o então presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, interrompeu uma sequência de quedas na Selic – que estava em 10,50% entre agosto e setembro –, o setor amarga perdas dolorosas. A mais expressiva é a queda de 11% no financiamento de unidades habitacionais no primeiro semestre de 2025, em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), foram financiadas 496,1 mil unidades neste ano, ante 559 mil do primeiro semestre de 2024.

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A Abecip também detectou que o crédito ficou muito mais caro, levando bancos e instituições financeiras a limitar recursos para o financiamento habitacional e a adotar uma seleção mais criteriosa para aprovação de empréstimos.

A construção civil também foi fortemente afetada. Os financiamentos para a construção de imóveis desabaram nada menos do que 54% no semestre. Apenas a aquisição de imóveis usados sustentou um crescimento de 7%. Como a Selic não deve cair tão cedo, de acordo com os comunicados do Copom, a entidade prevê uma queda de 20% nas concessões via SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) até o fim deste ano.

CNI: juros lideram preocupação entre empresários

Não à toa, empresários ligados à construção têm manifestado crescente preocupação com a manutenção da taxa de juros na estratosfera. A Sondagem da Indústria da Construção, levantamento feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria com a Câmara da Indústria da Construção (CBIC), revela que os juros altos são vistos como o principal entrave ao setor no 2º trimestre deste ano, tirando o sono de 37,7% dos empresários do setor, contra 35,3% no 1º trimestre do ano. Para efeito de comparação, a alta carga tributária foi citada por 30,5% dos empresários entrevistados.

“Os juros altos afetam a indústria da construção de duas maneiras: encarecem o custo do crédito para o empresário que precisa de recursos para investir, e para o consumidor que deseja adquirir algum bem do setor”, declarou a analista de Políticas e Indústria da CNI, Isabella Bianchi, ao portal de notícias da confederação.

Juros prejudicam produção e investimentos

Após a confirmação do indicador pelo Copom, centrais sindicais e representantes da indústria e do comércio se manifestaram em tom duramente crítico ao Banco Central. A principal e óbvia constatação é a de que um país com a segunda maior taxa de juros real do mundo, de 9,76% (perdemos apenas para a Turquia), não pode ter um ambiente favorável à produção e aos investimentos privados.

“A manutenção da taxa Selic em 15% nessa conjuntura irá prejudicar os investimentos, o consumo das famílias; aumentará o custo do crédito e afetará diretamente o nível de atividade econômica do país”, alertou o economista-chefe da Associação Paulista de Supermercados (Apas), Felipe Queiroz, em comunicado oficial.

“O Banco Central diz que tem que manter a taxa de juros alta para controlar a inflação. Mas a Selic não é o único instrumento de controle de preços e nem funciona para os tipos de inflação que o Brasil enfrenta”, argumentou a presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira, à Agência Brasil.

“O que a Selic elevada faz é manter o Brasil na liderança do ranking com os maiores juros do mundo, penalizando a população”, lamentou.

Para o presidente da CNI, Ricardo Alban, o quadro macroeconômico favorece um afrouxamento da política monetária, não arrocho. “Precisamos de menos juros e mais crescimento”, sentenciou Alban, também em comunicado.

Da Redação, com Folha de S. Paulo, CNI e Agência Brasil

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Last Update: 01/08/2025