Mecanismo de cooperação celebra o aprofundamento da parceria estratégica entre Brasil e China

por Lívia Romano Fernandes da Cruz e Pedro Gabriel Ferreira dos Santos

No ano em que se completam 50 anos de relações diplomáticas entre Brasil e China, a COSBAN (Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação) realiza sua sétima reunião. Trata-se de um mecanismo de cooperação que alimenta a parceria estratégica entre os dois países através de reuniões a cada 2 anos entre altos representantes dos Estados, com o objetivo de incentivar o relacionamento bilateral. A sétima reunião foi realizada neste ano, entre os dias 4 e 7 de junho, e foi co-presidida pelo vice-presidente e Ministro da Indústria do Brasil, Geraldo Alckmin, e pelo vice-presidente da China, Han Zheng. O presente texto visa explorar e analisar os resultados adquiridos por meio da reunião da COSBAN.

Dentre os temas abordados, o avanço otimista da parceria sino-brasileira foi muito mencionado. Nesse quesito, as duas partes manifestaram satisfação com os resultados relacionados ao Plano Estratégico 2022-2031 e ao Plano Executivo 2022-2026. Respectivamente, os planos visam balizar as relações bilaterais entre os países e promover a cooperação em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Ambos concordaram em criar novas áreas de cooperação e examinar esforços voltados a iniciativas de políticas de desenvolvimento, como afirmado por Wang Shouwen, vice-ministro de Comércio da China, que declarou que o governo da China sempre coloca o Brasil como prioridade diplomática. O presente texto visa explorar e analisar os resultados adquiridos por meio da reunião da COSBAN.

Dentre os resultados apresentados, se destacam as medidas de concessão de crédito ao Brasil. Cerca de 24 bilhões de reais foram direcionados a obras de infraestrutura, que incluem, também, medidas emergenciais para a reconstrução do Rio Grande do Sul após a tragédia climática que gerou enchentes em 452 das 497 cidades do estado – também respaldadas por um auxílio de 5 bilhões de reais do Banco Asiático de Investimentos. Os 24 bilhões incluem um acordo entre Eximbank e o Banco do Brasil, firmado em 2,5 bilhões de reais e que busca facilitar o comércio. Além disso, o Banco de Desenvolvimento da China firmou um acordo de 4 bilhões de reais para o auxiliar em ações do BNDES, destinadas a ações de infraestrutura, economia verde e medidas de controle climático, além de celebrar cartas de intenção com o China Development Bank (CDB) e com o Asian Infrastructure Investment Bank (AIIB) em, aproximadamente 9,1 bilhões de reais para projetos futuros de sustentabilidade. A curto prazo, sobretudo, o vice-presidente Alckmin, junto ao presidente do AIIB,  celebraram a assinatura de um memorando, que expõe a intenção do banco em apoiar os esforços de recuperação do Brasil após as catástrofes climáticas que afetaram o estado do Rio Grande do Sul.

Ademais, os representantes dos dois países afirmaram ver potencial na cooperação em políticas brasileiras de reindustrialização, como mencionado por Rui Costa, Ministro da Casa Civil, em entrevista ao Global Times, que afirmou ter como uma das prioridades a promoção de programas como o Nova Indústria Brasil (NIB) e o Novo Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC). Dessa forma, é incentivado o estabelecimento de indústrias chinesas no Brasil, e assim como a BYD e a GWM, a GAC Motor (Guangzhou Automobile Group) também virá para o Brasil. A corporação é a quinta maior do segmento na China, com 2,52 milhões de carros vendidos no país. Feng Xingya, presidente do Grupo GAC, confirmou investimento de 1 bilhão de dólares no Brasil em 5 anos. A Shanghai Spacecom Satellite Technology (SSST) deverá abrir uma filial da empresa em território brasileiro, através de investimentos em infraestrutura como datacenters, conexão terra-espaço e outros, com o intuito de criar uma nova rede satélite de comunicação na América do Sul. Segundo Rui Costa, o estabelecimento de indústrias estrangeiras no Brasil reduz o tempo de transporte de mercadorias e aprimora o comércio.

Ainda de acordo com a lista, representando a cooperação em CT&I, a Sinovac receberá um investimento de 500 milhões de dólares no Brasil e, junto à Fiocruz, anunciaram a “intenção de cooperar na pesquisa e desenvolvimento de vacinas para combate à crises sanitárias.” (MDIC, 2024). Previamente, em assembleia da Organização Mundial da Saúde, realizada em maio deste ano, os representantes de países do BRICS reafirmaram seu compromisso com a ampliação do acesso equitativo à imunizantes.

Além disso, foi enfatizada a resiliência do comércio bilateral entre os países, que superou tendências negativas de mercado. Nesse sentido, destacam-se alguns debates quanto a novos acordos envolvendo a proximidade das relações: a adesão do Brasil à Nova Rota da Seda e um possível acordo de livre comércio entre China e Mercosul. Ao chegar no país, Alckmin rapidamente negou rumores de adesão à rota. Segundo o site Shumian, a declaração foi realizada após rumores de que a viagem representaria a adesão do Brasil ao acordo. Junto à pressão chinesa quanto à Nova Rota da China, Xi Jinping defende um acordo de livre-comércio com o Mercosul há alguns anos. No entanto, tal acordo representa grande preocupação pelos líderes de Estado sul-americanos envolvendo a indústria nacional dos países. Hoje, o bloco comporta o Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai. Alckmin afirmou que, ainda que ele seja contra um possível acordo, a decisão precisará ser firmada em conjunto a outros representantes sul-americanos.

As discussões quanto à proximidade comercial levantaram um antigo debate nas relações entre os países do Cone Sul e a China. Segundo ata da VII Sessão Plenária da comissão, Brasil e China comprometeram-se a se opor ao protecionismo comercial para que o comércio permaneça aquecido e que possa se intensificar em termos de volume e valor. Ao citar o protecionismo comercial, a intenção da parte chinesa é aliviar os esforços brasileiros em defesa comercial, sobretudo, considerando casos de medidas antidumping. Tais medidas foram exploradas anteriormente pelo OPEB, sendo definidas como uma “tentativa de se criar igualdade de condições para o desenvolvimento da indústria no Brasil”, buscando “[…] equilíbrio entre a proteção que estimula a indústria, a eficiência e o avanço tecnológico, e aquela que apenas serve a grupos econômicos específicos sem agregar no desenvolvimento nacional.”. No entanto, o OPEB também explorou como a presença chinesa pode representar um grande auxílio à re-industrialização. Nesse sentido, os resultados da Comissão e as declarações de representantes apontam que a cooperação segue por um caminho mais positivo para ambos os países.

O encontro da COSBAN tornou assertiva uma cooperação comercial e industrial benéfica para as duas partes, por meio de acordos que representam uma trilha mais equilibrada que permeia as suas 12 subcomissões[1], visando o investimento chinês no principal parceiro comercial sul-americano e aumento da parceria entre as partes. O estabelecimento de indústrias oriundas da China como elemento crucial para o processo de neoindustrialização brasileira sinaliza uma crescente em suas relações pós-pandemia. Essas relações tendem a ficar mais estreitas, com horizonte aos interesses e alinhamentos compartilhados nesta reunião. Frente ao significativo potencial das relações entre as duas nações, a COSBAN desempenha, mais uma vez, um papel balizador essencial na elaboração de planos de ação e avaliação de oportunidades a serem exploradas. A comissão simboliza a emblemática fala de Xi Jinping, que afirmou que “China e Brasil são parceiros e irmãos que avançam juntos com a mesma vontade e aspiração”.

Referências bibliográficas

Ata da VII Sessão Plenária da Comissão Sino-brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação. Nota à imprensa Nº 237. Ministério das Relações Exteriores. Disponível em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/vii-sessao-plenaria-da-comissao-sino-brasileira-de-alto-nivel-de-concertacao-e-cooperacao-cosban/ata-vii-sessao-plenaria-da-cosban.pdf

BNDES e bancos asiáticos assinam acordos de mais R$ 9,1 bi para investimentos sustentáveis. In: Agência Gov. Publicado em: 07 jun. 2024. Disponível em: https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202406/bndes-e-bancos-asiaticos-assinam-acordos-de-mais-r-9-1-bi-para-investimentos-sustentaveis

COSBAN. Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação. In: Presidência da República, Publicado em: 22 mai. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/planalto/pt-br/vice-presidencia/acesso-a-informacao/outros/cosban#:~:text=Criada%20durante%20a%20visita%20do,de%20incentivar%20o%20relacionamento%20bilateral. Acesso em: 27 jun. 2024.

Edição 303 – Visita de Alckmin é produtiva, mas sem BRI. In: Shumian. Publicado em: 9 jun. 2024. Disponível em: https://shumian.com.br/2024/06/09/visita-de-alckmin-a-china-e-produtiva-mas-sem-bri/. Acesso em: 30 jun. 2024.

Em Pequim, Alckmin nega adesão do Brasil à ‘Nova Rota da Seda’. In: O GLOBO. Publicado em: 04 jun. 2024. Disponível em: https://oglobo.globo.com/blogs/marcelo-ninio/post/2024/06/em-pequim-alckmin-nega-adesao-do-brasil-a-nova-rota-da-seda.ghtml. Acesso em: 30 jun. 2024.

EXCLUSIVE: Brazil-China cooperation shows high synergy with huge potential for future collaboration: official. In: Global Times. Publicado em: 06 jun. 2024. Disponível em: https://www.globaltimes.cn/page/202406/1313710.shtml. Acesso em: 30 jun. 2024

GAC Motor | Fabricante chinesa promete investir US$ 1 bi no Brasil. In: Correio Braziliense. Publicado em: 28 jun. 2024. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/tecnologia/2024/06/6887603-gac-motor-fabricante-chinesa-promete-investir-uss-1-bi-no-brasil.html. Acesso em: 29 jun. 2024.

Lista de resultados da Missão do Vice-Presidente Geraldo Alckmin à China (4 a 8 de junho de 2024) Assinaturas na Sessão Plenária da Comissão Sino-brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (COSBAN). Nota à imprensa Nº 237. Ministério das Relações Exteriores. Disponível em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/vii-sessao-plenaria-da-comissao-sino-brasileira-de-alto-nivel-de-concertacao-e-cooperacao-cosban/resultados-missao-vpr-a-china2.pdf

Missão oficial à China traz projetos e mais de R$ 24 bi em créditos para o Brasil. In: Agência Gov. Publicado em: 07 jun. 2024. Disponível em: https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202406/alckmin-encontra-xi-jinping-e-conclui-missao-oficial-a-china-que-resultou-em-mais-de-r-24-bilhoes-em-creditos-para-o-brasil. Acesso em 1 jul. 2024.

O papel da defesa comercial na neoindustrialização e as relações Brasil-China. Publicado em: 09 mai. 2024. Disponível em: https://opeb.org/2024/05/09/o-papel-da-defesa-comercial-na-neoindustrializacao-e-as-relacoes-brasil-china/. Acesso em: 30 jun. 2024.

O que é a COSBAN e qual a sua importância para as relações Brasil-China. In: Ibrachina. Publicado em: 4 mar. 2024. Disponível em: https://ibrachina.com.br/o-que-e-a-cosban-e-qual-a-sua-importancia-para-as-relacoes-brasil-china/. Acesso em: 27 jun. 2024.


[1] A COSBAN subdivide-se em doze Subcomissões temáticas: (1) Política; (2) Econômico-Comercial; (3) Econômico-Financeira; (4) de Inspeção e Quarentena; (5) de Agricultura; (6) de Ciência, Tecnologia e Inovação; (7) de Indústria e Tecnologia da Informação; (8) de Cooperação Espacial; (9) de Energia e Mineração; (10) Educacional; (11) Cultural; (12) de Saúde.

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Última Atualização: 17/07/2024