Moradoras da residência estudantil da USP, o Crusp, relatam viver uma rotina de medo devido aos frequentes relatos de ataques, unindo-se em grupos de apoio enquanto a apuração dos casos avança lentamente.
Um exemplo citado é uma denúncia feita à universidade em maio deste ano, noticiada pela Folha de S.Paulo em setembro. Passados mais de seis meses, a vítima ainda convive com o suspeito, mesmo tendo obtido medida protetiva. “Tenho vontade de abandonar os estudos”, desabafa ela.
A USP informou que abriu um processo administrativo sobre o caso em outubro, explicando que a instauração de uma sindicância pode levar tempo devido à necessidade de formar uma comissão processante. Outras mulheres, no entanto, ainda aguardam qualquer avanço, dependendo da análise da assistência social, que é responsável por encaminhar as denúncias à Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (Prip), órgão que gerencia o Crusp.
Yasmin Mendonça, de 20 anos, denunciou ter sido estuprada no Crusp em 11 de setembro deste ano. O acusado foi expulso do local, mas a mesma medida não foi aplicada a outros suspeitos de agressão e importunação sexual. Paula, 19, afirma ter sido estuprada por dez meses pelo homem com quem dividia o apartamento no conjunto residencial.
Segundo ela, a primeira agressão ocorreu em abril do ano passado, quando estava bêbada, o que a levou a culpar a si mesma e a omitir o episódio. Os ataques se tornaram frequentes, mas ela tinha medo de denunciar, pois havia acabado de chegar a São Paulo e estava sozinha na cidade.
Em 2023, ela foi reprovada em todas as matérias e resolveu expor seu caso à USP no início deste ano. O agressor foi transferido de bloco, mas Paula tenta agora uma medida protetiva, a expulsão do suspeito do curso e da moradia.
Outro caso envolve Maria, que afirma ter sido vítima de gravações enquanto tomava banho. As janelas dos banheiros do Crusp dão para os corredores, e em março deste ano, ela percebeu um celular apontado para ela.
“Corri para tentar identificar o autor, mas a pessoa fugiu”, relatou. A guarda universitária foi chamada, mas, segundo a estudante, os agentes disseram que “não havia motivo para alarde”. Após o ocorrido, Maria compartilhou sua história com vizinhas e ouviu relatos semelhantes.
Para lidar com os riscos, grupos de apoio no WhatsApp foram criados para compartilhar histórias e pedir conselhos. Esses grupos se tornaram também um espaço para organizar companhia, já que muitas evitam caminhar sozinhas pelos corredores, principalmente à noite.
As ações das moradoras do Crusp vêm ganhando força em todo o campus, com estudantes de diversos cursos formando coletivos para relatar os ataques sofridos. O objetivo é criar um dossiê com essas histórias, organizado pelo Diretório Central dos Estudantes, e entregá-lo ao reitor Gilberto Carlotti.
Nomes de agressores recorrentes são compartilhados entre as estudantes e grafados nas portas dos banheiros femininos nas faculdades para alertar outras mulheres. Um exemplo é o “Cara do IME”, que aparece mencionado em quase todos os sanitários do campus.