Wagner Gomes
O Brasil está preso em uma fantasia mal costurada entre Lewis Carroll e Kafka. No papel de Alice, está o eleitor. Caiu na toca do coelho em busca de mudança, mas encontrou um país onde direita e esquerda se tornaram espelhos tortos um do outro, com a lógica soterrada por narrativas delirantes. Para sobreviver, o eleitor precisa abandonar as regras e o pensamento lógico e deixar de vagar por esse mundo de absurdos. Na cadeira da Rainha de Copas, está o Supremo Tribunal Federal. Exige respeito às regras do jogo, mas, ao agir com mão pesada e discurso inflamado, às vezes parece mais preocupado em cortar cabeças do que em convencer. Como lembra Pablo Ortellado, o STF defende a democracia com vigor, mas ignora o custo político dessa postura. Quando a Justiça vira militante, corre o risco de se tornar também parte da crise que busca conter e tratar a institucionalidade como figurante. Lula, nesse enredo, lembra o Gato de Cheshire: aparece sorrindo nos lugares certos, desaparece nos impasses e deixa no ar a pergunta que mais o favorece — “para onde você quer ir, se nem sabe quem é?” É um mestre da ambiguidade. Fala como provocador dizendo-se conciliador, mas governa para sua corte. Enquanto o Supremo, com sua toga inflamada, age como juiz e parte, o Congresso discute o sexo dos cogumelos e se parece com a Lagarta que fuma narguilé — lenta, indiferente, perguntando “quem é você?” enquanto o país arde. O Chapeleiro Maluco é o próprio bolsonarismo: barulhento, conspiratório, festeiro mesmo em meio à ruína. Seu papel não é governar, mas tumultuar. E o Coelho Branco? É o Brasil: corre apressado atrás do prejuízo, sempre tarde demais, sem saber se está fugindo da crise ou indo de encontro a ela. No meio dessa floresta distorcida, uma liderança de centro – pragmática, liberal na economia e empática no social – ainda parece miragem. O eleitor tem que questionar narrativas e recuperar a coragem de exigir lucidez. No fundo, estamos como Alice: cercados de vozes sem sentido, buscando uma porta para a realidade. Afinal, nem mesmo ela saiu do seu labirinto apenas com coragem: precisou entender que, num mundo virado ao avesso, só a lucidez salva. No meio disso tudo, o Executivo – com seu sindicalismo geriátrico e companheirismo cartorial – finge equilibrar pratos enquanto Trump, com sua dismetropsia, joga ácido na economia com ameaças de tarifaço. Lula testa o seu assistencialismo de almanaque, Bolsonaro testa os limites da democracia e a própria capacidade de produzir estragos, enquanto o Brasil se move sem eixo, ameaçado por todos os lados.
Wagner Gomes – Articulista