A esquerda pequeno burguesa pressionada pelo imperialismo adere a política do golpe de Estado na Venezuela. Mas há um setor que sempre aderiu a essa política golpista de esquerda, ao estilo do PSTU contra Dilma em 2016. É o caso da LIT-QI. Em seu portal publicaram o texto “Os debates sobre a Venezuela” de Alejandro Iturbe. Nele o autor tenta explicar por que nunca se pode defender o governo de Maduro, mesmo quando o governo norte-americano está tentando derrubá-lo.
O texto começa: “desde o início do regime chavista, a LIT-QI sustentou que o processo liderado por Hugo Chávez não tinha nada de socialista nem qualquer intenção de avançar nessa direção. Fizemo-lo mesmo no período de maior prestígio do chavismo e quando grande parte da esquerda mundial aderia à sua proposta do Socialismo do Século XXI. Pelo contrário, sustentamos que se tratava do acesso ao poder de um setor da direção das Forças Armadas burguesas que aspirava reter no país uma maior parcela das receitas do petróleo (principal fonte de recursos) mas sem mudar nada sobre a estrutura do país como capitalista dependente do imperialismo ianque”.
Dado que a palavra socialista tem muitos significados é possível afirmar que não era um socialismo como Marx e Engels definiram o que seria a ditadura do proletariado. Mas afirmar que o governo era controlado pelas forças armadas já é uma tese absurda. Obviamente as forças armadas têm uma participação importante, o próprio Chavez era um capitão. Mas a Venezuela tem uma participação popular gigantesca, o PSUV de Maduro é um partido enorme que se baseia nos trabalhadores e não nas forças armadas. O governo chavista é um governo nacionalista e assim se apoia em vários setores.
O texto segue com alegações típicas da direita, de que há corrupção no governo: “durante vários anos, bilhões de dólares entraram na Venezuela provenientes das exportações de petróleo. Graças a esse dinheiro, os quadros chavistas (especialmente os altos comandantes militares) acumularam grandes fortunas e transformaram-se na chamada ‘boliburguesia’”. É difícil acreditar nessa acusação visto que mesmo durante a campanha de golpe a imprensa não consegue mostrar onde está esses “oligarcas venezuelanos”. Mas a campanha em si não faz sentido, acusações de corrupção são a tática da direita, é preciso avaliar o conteúdo político do governo.
No quesito político o autor faz uma análise incorreta: “o seu proclamado anti-imperialismo foi mais em palavras do que em atos. Pagou meticulosamente a dívida externa do país (por vezes antecipadamente) e entregou grandes áreas de exploração petrolífera a multinacionais, como a estadunidense Exxon. Finalmente, em 2016, com Maduro, o governo anunciou o plano Arco Mineiro do Orinoco, que entregou às multinacionais 12% do território do país, rico em ouro, diamantes, ferro e outros minerais, além de petróleo (neste caso, além de Empresas ianques e canadenses, empresas chinesas também entraram no negócio).
O governo Maduro não é uma ditadura do proletariado, é um governo de um país capitalista. Sendo assim atuam empreendimentos capitalistas, inclusive imperialistas no país. Mas é ridículo afirmar que não há choque com o imperialismo. O governo dos EUA tenta derrubar o chavismo desde 2002 para tomar todo o petróleo da Venezuela. Só porque a Venezuela não é a URSS de Lênin não quer dizer que não há uma luta contra o imperialismo. Só o fato da maior parte do petróleo se manter estatal é uma gigantesca afronta.
O golpismo contra Nicolás Maduro
Depois de criticar as bases do chavismo o texto começa a criticar o governo Maduro. “Em 2013, quando Nicolás Maduro sucedeu a Hugo Chávez, a “bonança do petróleo” tinha terminado e a entrada de dólares no país diminuía cada vez mais. Neste contexto, o chavismo agiu como todos os regimes burgueses: com ataques cada vez mais duros aos padrões de vida das massas. As Missões foram enfraquecidas ao extremo ou desapareceram, os salários dos trabalhadores venezuelanos tornaram-se os mais baixos do mundo e a pobreza, a miséria e a fome cresceram permanentemente.
Aqui o texto fica totalmente absurdo. Ele ignora que a “bonança do petróleo” acabou porque há sanções econômicas gigantesca dos EUA. Que há uma guerra econômica contra a Venezuela e mesmo assim Maduro consegue manter os programas sociais. Maduro não “agiu como todo os regimes burgueses”, ele agiu como um regime nacionalista com dificuldades. Outro regime burguês, de Michel Temer, cortou todos os benefícios criados pelo PT, a diferença é gigantesca. Mas não citar as sanções dos EUA mostra como a LIT-QI é pró-imperialista. Ela faz frente com os norte-americanos que colocam a culpa de todos os problemas em Maduro.
Logo depois caem na campanha da burguesia: “a expressão mais aguda desta terrível situação das massas foi que mais de 7.000.000 de venezuelanos tiveram que emigrar (especialmente para trabalhar em outros países latino-americanos)”. Esse número, repetido em todos os jornais imperialistas, é uma farsa. Primeiro porque boa parte dos imigrantes não eram venezuelanos, eram colombianos, ou de outros países da região. Eram pessoas que foram para a Venezuela porque a situação era melhor e quando piorou deixaram o país.
Segundo porque muitos voltaram à Venezuela, o governo inclusive garantiu o seu retorno com programas sociais. O autor tem a opção de escutar o que dizem os próprios venezuelanos ou acreditar na propaganda imperialista, ele escolhe acreditar totalmente na propaganda. E no fim, mesmo que isso fosse verdade, a culpa seria das sanções. Ou o governo Assad da Síria é culpado pela migração? Afinal ele que fez os norte americanos jogarem bombas no país. Essa é a lógica da LIT-QI.
As mentiras continuam: “o chavismo tinha perdido qualquer traço progressista que pudesse ter tido no seu apogeu, os trabalhadores e as massas romperam com ele em massa, começaram a odiá-lo e a lutar contra Maduro, com toda a justiça. A sua base de apoio popular foi reduzida ao extremo”.
A sua conclusão mostra como sua política é imperialista: “esta dura realidade é o que explica porque a velha burguesia venezuelana e as suas expressões políticas, que em 2002-2003 estavam totalmente derrotadas e odiadas pelas massas, conseguiram recuperar a sua influência popular e, infelizmente, hoje aparecem como a única alternativa possível para derrotar o regime chavista. É o próprio chavismo o principal responsável por isso”.
Ou seja, o motivo que a oposição ganhou força não é que ela é apoiada pelo maior poder político do planeta, o imperialismo. Não é que há financiamento, que os norte americanos inclusive montaram um governo farsa da oposição com recursos roubados na Venezuela. Isso é totalmente ignorado. E ainda pior, o autor deixa escapar que essa é a “única alternativa possível”. Mas a frente o texto não fala em apoiar a oposição mas sim em “construir uma alternativa”. Isso, no entanto, é irrelevante. Diante da análise exposta a oposição e o chavismo são iguais e portanto não é tão ruim que o imperialismo assuma. Em outras palavras, LIT-QI segue a tese de que a extrema direita e a esquerda são exatamente a mesma coisa. Essa é uma política de apoio ao golpe de Estado. Quando os fascistas levantam a cabeça e você se junta a eles contra a esquerda não há outra forma de descrever senão como apoio ao golpe.