Após o anúncio do fechamento do escritório do X (antigo Twitter) no Brasil, uma decisão que pegou muitos de surpresa, uma nova fase de embates entre o bilionário Elon Musk e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), parece estar se desenhando. O que muitos enxergam como uma jogada estratégica, Musk tenta evitar o cumprimento de decisões judiciais brasileiras, ao mesmo tempo em que a plataforma mantém suas operações no país, potencialmente fugindo das responsabilidades legais.
Em declaração ao Portal Vermelho, o sociólogo Sérgio Amadeu, especialista em redes sociais da UFABC, criticou as recentes ações de Musk em relação ao X, acusando-o de usar a rede social como um instrumento político em aliança com a extrema direita brasileira. Segundo Amadeu, as decisões de Musk com o X não são meramente comerciais, mas profundamente políticas, voltadas para o enfraquecimento da democracia no Brasil e para o ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF), em especial ao ministro Alexandre de Moraes.
Desde que foi adquirido por Musk, o X tem perdido muitos usuários. Ele fez uma série de mudanças que dificultaram o acesso às interfaces de programação, criaram áreas pagas que antes não existiam e interferiram nos fluxos de comunicação dentro da própria plataforma, afirma Amadeu, destacando o que considera ser uma má gestão da rede social.
Mais de um ano depois da compra por US$ 44 bi, a empresa só tem perdido valor de mercado. Em janeiro deste ano, o valor da empresa caiu para 1/3 do valor pago durante a aquisição. O ‘Statista’ projetou um recuo sequencial da receita do antigo Twitter com publicidade, pelo menos até 2027, quando o resultado deve somar US$ 2,7 bilhões.
Para Amadeu, essa movimentação mostra que as intenções de Musk vão além de meros interesses comerciais ou de criar um espaço de interação social. Elon Musk tem tentado ocupar um espaço de liderança política da extrema direita, especialmente nos Estados Unidos, onde ele acata as ordens judiciais, como faz em outros países sem vacilar e acusar de censura ou autoritarismo, argumenta.
O professor ressalta que, ao encerrar a representação formal do X no Brasil, Musk busca evitar o cumprimento das determinações do judiciário brasileiro. Ele espera que, sem representação no país, fique livre das decisões da Justiça brasileira, o que é um desrespeito claro à nossa lei e à nossa Constituição, afirma Amadeu. Se a Justiça brasileira não tomar providências contra essa postura arrogante e criminosa, outras empresas poderão seguir o mesmo caminho, minando a autoridade do Judiciário.
Amadeu conclui que o movimento de Musk pode ser um blefe, mas alerta para as possíveis consequências: Se ele retirar o X do Brasil, pode enfrentar ações mais drásticas do Judiciário, que pode acabar bloqueando a plataforma no país caso Musk se recuse a cumprir decisões judiciais.
A postura de Musk, segundo Amadeu, coloca em evidência um perigoso jogo político que vai além dos interesses empresariais, tocando diretamente nas questões de soberania e respeito às instituições brasileiras.
O Brasil, com mais de 22 milhões de usuários na rede social, representa o sexto maior mercado para o X, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, Japão, Índia, Inglaterra e Indonésia. Apesar disso, em um ano a plataforma perdeu 2,4 milhões de usuários no Brasil. A importância do país para a plataforma não se resume apenas ao número de usuários, mas também ao tempo de uso, com brasileiros passando, em média, mais de 9 horas por dia na internet.
Apesar do fechamento do escritório, especialistas apontam que a saída completa da plataforma do Brasil traria significativos prejuízos econômicos, não apenas para Musk, mas também para milhões de usuários que utilizam a rede social como ferramenta de comunicação e negócios. O mercado brasileiro é considerado estratégico para qualquer plataforma de rede social.
Haveria impactos negativos evidentes em termos de receita. O bloqueio faria a rede perder usuários que são muito ativos, que compartilham dados pessoais a todo momento, que compram a partir da plataforma por meio de anúncios.
A decisão de encerrar as operações no Brasil é vista por muitos como uma tentativa de Musk de driblar o cumprimento de ordens judiciais emitidas pelo ministro Alexandre de Moraes, que tem sido uma figura central na luta contra a desinformação e o extremismo nas redes sociais. A recusa do X em responder a pedidos judiciais, como o fornecimento de dados de perfis específicos, culminou em sanções severas, incluindo multas e até a emissão de um mandado de prisão contra a representante legal da rede no país.
Para João Brant, secretário de Políticas Digitais da SECOM/Presidência da República do Brasil, a atitude da plataforma é “patética” e visa forçar uma escalada que poderia resultar no bloqueio do X no Brasil. Segundo ele, a empresa está jogando o ônus político de uma eventual suspensão da plataforma no colo do STF.
Orlando Silva, deputado federal pelo PCdoB-SP, e ex-relator do PL das Fake News, é ainda mais direto em suas críticas, classificando Musk como um “charlatão” e acusando-o de tentar transformar o X em um território livre para a “delinquência da extrema-direita”. A opinião é compartilhada por outros membros do governo, que enxergam na atitude de Musk uma tentativa de manter a plataforma fora do alcance da Justiça brasileira.
A decisão também está vinculada a um momento específico de ataques ao ministro Alexandre de Moraes. A visão é partilhada pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira. No sábado (17), o ministro escreveu na própria rede social: “Bye Bye @elonmusk!”. Ele acrescenta que a decisão também busca aproveitar o momento político atual para aumentar a pressão sobre Alexandre de Moraes.
Em comunicado, a rede social justificou o fim das operações no país alegando ameaças e censura por parte de Moraes, que conduz inquéritos sobre a atuação de Musk em campanhas de desinformação contra as instituições brasileiras. O ministro do STF tem sido questionado em seus procedimentos legais. Reportagem da Folha de S. Paulo transcreve a troca de mensagens entre assessores do STF e sentencia que o ministro atuou fora do rito legal. Todavia, juristas renomados, de diferentes perfis ideológicos, sustentam que o ministro atuou sob a regência das normas legais do país.
A saída do X do Brasil não exime a plataforma de seguir a legislação local, podendo levar a sanções severas, incluindo o bloqueio do serviço. Enquanto o futuro da rede social no Brasil permanece incerto, o jogo de cena de Musk coloca em evidência o complexo equilíbrio entre liberdade de expressão e a responsabilidade de operar dentro das leis de um país. O desfecho dessa situação pode ter repercussões significativas não apenas para os usuários do X, mas também para o próprio bilionário, que enfrenta um crescente escrutínio global sobre a maneira como administra suas plataformas.