“A lista de agrogolpistas que consolidamos neste estudo inclui um dos maiores incendiários do Pantanal. Aliados diretos de Jair e Flávio Bolsonaro. E produtores de soja financiados pelo capital internacional. Que história do golpismo contaremos a nossos netos, um golpismo apenas ocasional, urbano e verde-oliva? Sem agronegócio?”, questionou Alceu Luís Castilho, editor do dossiê do De Olho nos Ruralistas, divulgado na última semana, que após uma extensa pesquisa de 4 meses escancarou os nomes do agronegócio que financiaram e sustentaram o intento de golpe de Estado de Jair Bolsonaro.

Mas a relação do “pessoal do agro” com Bolsonaro nos atos criminosos vai além do apoio ideológico e do pagamento dos transportes que levaram bolsonaristas de todo o Brasil à Praça dos Três Poderes, naquele fatídico 8 de janeiro de 2023. Está enraizada no financiamento da campanha do ex-presidente e na ligação direta destes nomes do Agronegócio com o clã Bolsonaro.

O relatório evidencia essa “profunda” e “multifacetada” relação que, como descreve o documento, não foi “periférica” ou pormenor, mas o agronegócio foi eixo central, fundamental para a materialização dos atos criminosos. Uma relação que começou antes do 8 de janeiro.

Para os atos em si, mais da metade dos 142 fazendeiros e empresários do agronegócio identificados (91) forneceu caminhões para os bloqueios rodoviários e para o acampamento no Quartel-General (QG) do Exército em Brasília. Os líderes do financiamento foram as famílias Bedin e Lermen, clãs fundadores de Sorriso (MT), que enviaram juntas 28 caminhões, ou seja, um quarto do total.

O dossiê aponta que os mesmos membros do agronegócio que financiaram os atos, os chamados “Agrogolpistas”, foram “financiadores oficiais” eleitorais de Bolsonaro à reeleição em 2022. Sérgio Bedin doou R$ 100 mil e Luciano Bedin mais R$ 60 mil. Atílio Rovaris, filho de Valdocir Paulo Rovaris, doou R$ 500 mil, e a família Costa Beber doou R$ 103 mil.

“Durante a campanha do pai à reeleição, o senador Flávio Bolsonaro usou aeronave de empresário que enviou caminhões para o QG do Exército em Brasília. O objetivo? Arrecadar doações de fazendeiros em Mato Grosso, eixo central do agrogolpismo”, expôs o documento. “Às vésperas da eleição, Bolsonaro arregimentava apoio em eventos do agronegócio”, relembrou.

Este “agrogolpista” é Lauro Antonio Luza, que concedeu caminhões para levar golpistas e mantimentos ao 8 de janeiro e também emprestou aeronave ao filho do então mandatário para arrecadar doações de fazendeiros do Mato Grosso.

Da mesma forma, outros fazendeiros, como Victor Cezar Priori, enviaram tratores – um dos principais símbolos do agronegócio, a atos anti-democráticos, incluindo desfiles de 7 de setembro na Esplanada dos Ministérios.

Na atuação do próprio ex-presidente para arregimentar apoio golpista do agro, Bolsonaro contou com o Movimento Brasil Verde e Amarelo (MBVA) criado por associações do agronegócio, que mobilizavam as pautas antidemocráticas e disparavam mensagens como “Faça o que for preciso! Eu autorizo, Presidente!” em caminhões, desde 2021.

Um dos líderes do MBVA é Zeca Alípio, então candidato a deputado federal com apoio do ex-ministro de Bolsonaro João Roma. Ele recebeu doações de campanha de fazendeiros envolvidos no financiamento golpista, como Elton Walker e Lauro Antonio Luza, que enviaram caminhões a Brasília.

Além de Bolsonaro e seus filhos, o vice na chapa de reeleição, general Walter Braga Netto e ex-ministros de Bolsonaro fizeram “tours” em feiras e eventos agropecuários para obter apoio na campanha eleitoral. Braga Netto esteve em Sorriso, o principal ninho das lideranças agro que financiaram os atos golpistas, e em Sinop, no Nortão mato-grossense, ao lado de Antônio Galvan.

Conexões com o capital de bancos

Outro braço da investigação exposta no relatório do De Olho nos Ruralistas foi a relação das lideranças do agro com gigantes financeiros, como o BTG Pactual, Syngenta, Santander, Rabobank, John Deere e XP Investimentos, na cadeia de “megafinanciadores” que, segundo o documento, envolveu um “ecossistema de empresários” rurais e de instituições financeiras para as tentativas de abolição do Estado Democrático de Direito.

A Agrosyn, parceira regional da gigante dos agrotóxicos Syngenta, enviou quatro caminhões para o QG golpista e teve suas contas bancárias bloqueadas, mas continuou a ser reconhecida e premiada pela Syngenta.

O BTG Pactual é o principal credor do Grupo Safras e possui contratos de compra de soja com figuras envolvidas na tentativa de golpe, tendo emitido bilhões em Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA) com fazendeiros implicados nas investigações.

Além do ex-ministro da Fazenda, Paulo Guedes, que foi fundador do banco, os ex-ministros de Bolsonaro Fábio Faria (Comunicações) e Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União – AGU), assumiram cargos no BTG Pactual. O banco mantém contratos e concede crédito a fazendeiros e empresas implicadas nas investigações dos atos antidemocráticos, incluindo figuras como Argino Bedin e Lucas Costa Beber.

“A relação dos agrogolpistas com o capital e as megacorporações do agronegócio não pode passar batida. Esses bancos, que defendem uma governança ambiental e social (ESG, na sigla em inglês), acham justo financiar empresas de pessoas investigadas por tentativa de golpe de Estado? Ou esses fatores escapam às suas barreiras de compliance?”, levanta o editor Alceu Luís Castilho.

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Last Update: 30/06/2025