O Brasil, que um dia era considerado um país livre de grandes desastres naturais, agora enfrenta catástrofes climáticas cada vez mais frequentes e intensas. A catástrofe no Rio Grande do Sul, em maio, e a fumaça das queimadas que sufocou parte do país, especialmente São Paulo, mostram que as mudanças climáticas estão aqui para ficar.

É importante frisar que a causa do aquecimento global são as emissões desenfreadas dos Gases de Efeito Estufa (GEE) provocados pela indústria e agricultura capitalista. Portanto, o aquecimento global não tem nada de “natural”. Não é provocado por nenhum ciclo biogeoquímico do Sistema Terra ou por alguma força cósmica. Ele está intimamente vinculado ao surgimento da economia industrial e seu voraz consumo de combustíveis fósseis e comandado pela incessante acumulação capitalista.

O ano de 2023 foi o mais quente já registrado em 125 mil anos. Entre junho do ano passado e junho de 2024, praticamente todos os dias registraram uma temperatura média da superfície da Terra igual ou acima de 1.5ºC. Vale lembrar que esse é o tal do limite estabelecido pelo Acordo de Paris para se manter, digamos, um aquecimento “mais controlável”.

A temperatura dos oceanos também não param de subir. Em 2023 ultrapassaram todos os registros anteriores, e neste ano continuam a subir ainda mais. Os oceanos são os maiores reguladores climáticos da Terra, distribuindo, de um lado para outro do planeta, a energia absorvida pelo Sol. São os oceanos também que deram a última palavra na maioria das extinções em massa conhecidas pelas ciências. E o excesso de calor e de dióxido de carbono (CO2) podem interromper a circulação das correntes e provocar um colapso da vida marítima. Aliás, os níveis de CO2 na atmosfera são os maiores já registrados em 800 mil anos. Na verdade a humanidade, que tem apenas 300 mil anos, nunca viveu num planeta com tamanha concentração de dióxido de carbono como a atual.

O aquecimento e a maior disponibilidade de energia (calor) na Terra intensificam os fenômenos climáticos extremos, tal como o El Niño de 2023-2024, o mais intenso de 1940. Isso disparou uma série de outros fenômenos extremos, como as chuvas torrenciais, calor extremo e secas. A catástrofe do Rio Grande do Sul, em maio, e a seca atual da Amazônia, assim como as ondas de calor e queimadas na maior parte do território brasileiro estão todas conectadas. São mais do que o anúncio de um novo padrão metrológico do país. São um prenúncio do futuro que será marcado por novas catástrofes produzidas por fenômenos extremos cada vez mais intensos, cada vez mais frequentes.

Por que São Paulo queimou?

No dia 18 de agosto, a fumaça das queimadas na Amazônia chegou ao sul do país. Os chamados “rios voadores” se tornaram rios de cinzas da floresta e também das queimadas do Pantanal. Em Porto Alegre (RS), o dia acabou mais cedo por causa da fuligem. Gradativamente ela foi subindo em direção ao Centro-Sul do país, mas quando chegou em São Paulo, no dia 22, a fuligem se conectou à fumaça de poderosos incêndios coordenados no interior de todo o estado. Essa sincronia macabra só foi possível devido à estiagem extrema pelo qual passava a maior parte do território nacional.

Mas não foi apenas isso. As imagens de satélite mostram que o fogo em São Paulo ocorreu, sobretudo, entre os dias 22, 23 e 24, o que indica uma ação coordenada bem ao estilo do dia dia do fogo, quando em 10 e 11 de agosto de 2020 fazendeiros e grileiros tocaram fogo na Amazônia, animados pelos discursos de Bolsonaro. Além disso, as imagens mostram que as queimadas já começaram em grandes proporções territoriais. Tudo sugere que foram iniciadas em vastas áreas rurais, mais ao menos ao mesmo tempo, em grande quantidade e que saíram totalmente do controle ameaçando bairros, condomínios, rodovias, cidades e tudo que estivesse pela frente.

Esse padrão de queimada é muito comum na queima da palha da cana-de-açúcar, uma prática arcaica e parcialmente proibida no estado, mas que é insistentemente usada por usineiros. As imagens de satélite também mostram que os grandes incêndios tiveram como origem em áreas onde a ocupação do solo predomina o monocultivo da cana-de-açúcar, e as chamas podem ter ganhado força também por culturas de eucalipto, outro produto do agro paulista. Qualquer investigação séria e cuidadosa, que correlacione a origem dos focos de incêndios com a ocupação do solo, vai concluir que a culpa pelas queimadas é da agricultura capitalista, o chamado agronegócio.

A legislação de São Paulo sobre a queima da cana é totalmente frouxa. E isso é de propósito. Em 2021, em um negacionismo de dar inveja a qualquer bolsonarista, o estado de São Paulo contestou o fato da queima ser prejudicial à saúde da população. O Ministério Público Federal também descobriu que a fiscalização da queima é uma piada. O Ibama não realiza o licenciamento ambiental nem expede as autorizações para a suposta “queima controlada”, nem a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) exigia ou promovia algum tipo de licenciamento ambiental ou Estudo Prévio de Impacto Ambiental. Neste ano, o Portal da Cetesb apenas mencionou que as queimadas estão proibidas “entre 01 de julho a 30 de novembro”, “no período compreendido entre 06:00 e 20:00 horas, conforme disposto na Resolução SEMIL 55 de 01 de julho de 2024”. Ou seja, tacar fogo durante o dia foi liberado.

Toda essa frouxidão tem um objetivo: permitir que os grandes usineiros continuem a colocar fogo nos canaviais. A queima reduz o custo da produção. É mais lucrativa para os usineiros.

Há várias denúncias sendo investigadas pelo MPF que apontam usineiros como os grandes promotores do fogo, entre eles está a Raízen, ex-Cosan, hoje uma gigante do setor, com 860 mil hectares de área agrícola cultivada no país, R$ 120 bilhões em faturamento e 26 unidades de produção de açúcar, etanol e bioenergia, uma das maiores produtoras e exportadoras do setor no país. Seu dono é o agrobilionário Rubens Ometto, um dos maiores bilionários do país segundo a revista Forbes, e amigo de todos aqueles que estão no poder, de Bolsonaro, passando por Tarcísio de Freitas a Lula.

Ao lado desses governos, o bilionário e seus amigos usineiros promovem a ideia de que a bioenergia é uma das soluções para a “transição energética”. Algo que é compartilhado por muitos picareta e é até apoiado por documentos oficiais dos governos.

 

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Última Atualização: 27/08/2024