Não há surpresa nenhuma nas participações e nas falas de Bolsonaro, de Augusto Heleno e de Alexandre Ramagem na reunião em que eles articulam a sabotagem das investigações contra Eduardo Bolsonaro, em agosto de 2020.
Há outros fatos graves envolvendo os três. E Heleno e Bolsonaro já foram ‘grampeados’ em outras ocasiões, com intervenções golpistas, como na reunião filmada de 5 de julho de 2022.
O que choca agora é ver a naturalidade com que duas advogadas participam da reunião de salvação de Eduardo Bolsonaro.
É chocante perceber que Juliana Bierrenbach e Luciana Pires se sentiam à vontade planejando com os três a defesa do senador, a partir da ideia de que poderiam dispor das estruturas de Estado, cujo chefe era Bolsonaro.
Duas advogadas entram no Palácio do Planalto, com acesso registrado oficialmente, para participar de um plano que salvaria Eduardo das investigações e sabotaria os trabalhos de auditores da Receita e de integrantes do Ministério Público.
E agora se sabe também que, no dia seguinte à reunião com os três, as duas advogadas se reuniram com o então secretário da Receita Federal, José Tostes, citado no encontro com as defensoras pelo próprio Bolsonaro.
O que prova que a recomendação, dada pelo então presidente da República, de que a saída era procurar o chefe da Receita, abriu a porteira para que as advogadas fossem em frente.
“É o caso conversar com o chefe da Receita, o Tostes”, disse o pai. O chefe da Receita cuidaria das providências para anular as sindicâncias dos auditores.
As duas agiram com naturalidade porque sabiam com quem estavam lidando. Duas advogadas vão ao núcleo do poder, participam de reunião com o presidente e dois altos assessores da área de segurança e inteligência, como se estivessem num chá da tarde da OAB.
E a ordem dos Advogados do Brasil irá se manifestar, ou a entidade não interfere em casos como esse? Não há, na participação das advogadas, nada que atinja os códigos de condutada da ordem? Nada mais abala a OAB?
Nem o fato de que, em vídeo que gravou na segunda-feira, Ramagem insinua que alguém foi à reunião para tentar subornar alguém? Ele se refere às duas ou a uma delas?
Ramagem deve saber. E a OAB deve se interessar pela explicação desse trecho da fala do delegado-deputado:
“A gravação da reunião de agosto de 2020 não foi clandestina; houve o aval e o conhecimento do presidente para que ela ocorresse. A gravação foi realizada devido a uma informação recebida sobre uma pessoa que participaria da reunião e que teria contato com o governador do Rio de Janeiro na época. Havia a preocupação de que essa pessoa pudesse apresentar uma proposta nada republicana”.
Há a desculpa, para livrar a cara das advogadas, de que o tal emissário não teria aparecido na reunião. Mas se não apareceu, por que mesmo assim as conversas foram gravadas? Além de falarem por Eduardo, as defensoras falavam por mais alguém? As duas ou só uma delas?