Uma política para quadros relaciona-se à missão do Partido Comunista – missão essa que lhe confere identidade; identidade essa que pauta seus procedimentos políticos e organizativos e da qual emanam sua política geral e suas políticas específicas.

A missão do Partido Comunista é conduzir a classe operária, os trabalhadores e o povo na luta pelo socialismo – e socialismo tem duplo caráter: é, a um tempo, poder político e construção econômica e social.

Uma política de quadros comunistas deve tratar, portanto, de forjar quadros para essa missão. A forja é o Partido operando no curso real, concreto, da luta de classes presente, que demanda: desenvolvimento da teoria marxista-leninista, por meio do método-concepção materialista dialético; ação política que congregue nitidez revolucionária de classe e flexibilidade tática; quadros disciplinados que conduzam um Partido aberto a diversas lideranças e influente junto às amplas massas.

Um camarada não é quadro somente por ocupar um posto – no movimento social, no parlamento, em governo e na direção partidária. Quadro tem a ver com domínio da teoria marxista-leninista e alta capacidade política fundada no raciocínio dialético-materialista leninista. Esses dois atributos conferem ao quadro os requisitos para formular e agitar as massas em torno de palavras de ordem adequadas, bem como, no curso dessa agitação, propagandear nossas concepções e o socialismo; organizar o povo, forças aliadas e o Partido em torno da política revolucionária e ampla, elaborada e formulada pelo coletivo comunista; formar a militância do Partido, bem como os ativistas não comunistas do movimento social; estruturar material e financeiramente o Partido no curso da ação política.

Um quadro capaz disso tudo seria um quadro completo. E quadros completos não dão em pencas, infelizmente. Custa muito identificar e formar um. Um quadro assim é, em geral, capaz de colaborar com o desenvolvimento da teoria, de falar às amplas massas, de governar, de parlamentar nas casas legislativas, de conduzir movimentos e entidades, etc, etc.

Há quadros que não são assim plenos, mas chegam perto. Falta-lhes um ou outro dos quesitos aqui elencados. Comumente, dominam o essencial das concepções do Partido e são bons formuladores e operadores da política, e colaboram com algum outro aspecto da vida partidária. Formam a massa de quadros e são as colunas que sustém o Partido.

Há, por outro lado, os quadros especialistas: quadro de massa, quadro organizador, quadro agitador e propagandista, quadro formador, quadro das finanças, quadro teórico, quadro da cultura, da educação ou da ciência e tecnologia. Há, inclusive, os quadros de base, especialistas na ação política cotidiana e organização popular e partidária locais.

Identificar o quadro, seus principais talentos, interesses e vocação é a primeira linha de ação de uma direção comunista. Uma vez identificado o quadro, trata-se de acompanhá-lo, orientá-lo, cuidar de sua formação e das condições de sua militância; alocá-lo e promovê-lo corretamente.

São procedimentos que não há como ser estandardizados, no entanto. Uma política de quadros deve considerar o que há de irredutível num quadro; há que personalizar acompanhamento, orientação, formação.

Por certo que as necessidades do Partido vêm em primeiro lugar. A arte está em aproximar e, se possível, emaranhar a essas necessidades o caráter e as características do quadro; identificar onde há conexão entre o projeto partidário e as aspirações do quadro.

Questão de grande relevância é a das condições materiais de militância – especialmente quando se trata de quadro feminino. Elas ligam-se à política de estruturação material e financeira do Partido, que envolve, não somente melhoria desta estruturação, mas de priorização dos recursos para promoção e manutenção do quadro – de sua existência e de sua ação.

Sabemos que no caso das mulheres, as condições de militância são sempre mais desfavoráveis. Se ela é uma trabalhadora – condição da maioria das militantes –, ou seja, precisa cumprir jornada, acrescem-se, aos obstáculos comuns a um trabalhador, a dupla ou tripla jornada, a submissão ao marido, o papel social de responsável pelos cuidados com a prole e com o próprio parceiro.

Foco prioritário de uma política de quadros é o comunista trabalhador, especialmente o pertencente à classe operária. Não são propícias a um comunista as condições de militância numa fábrica, e mesmo em locais de trabalho não-fabril. E o que dizer das relações de trabalho uberizadas, pejotizadas, e do teletrabalho? E se o camarada é sindicalista, redobra-se a atenção na proporção das dificuldades duplicadas.

Sabemos o quanto as máquinas e a ação sindicais consomem o militante e forçam-no ao desvio de seus deveres comunistas; o quanto lhe tomam tempo ao devido estudo individual e à presença nos fóruns partidários.

Algo similar ocorre com parlamentares e gestores de executivos. Assim como nos sindicatos, há ainda a pressão ideológica, exercida pela melhoria das condições materiais, algumas facilidades, as dificuldades da luta e o convívio com outras forças políticas e suas ideias desviantes.

Pressão ideológica sofre também a juventude, celeiro de quadros de qualquer partido comunista. No ambiente universitário, ela orça em várias toneladas por centímetro quadrado. No movimento juvenil – mormente o secundarista, o universitário e o cultural – a pressão vem embalada em ideias edulcoradas, redentoras, identitaristas, esquerdistas, diletantes, por vezes delirantes e inconsequentes.

No movimento secundarista, há ainda as dificuldades materiais de militância, os apelos das viagens psicotrópicas, as instabilidades emocionais e hormonais, bases das incertezas próprias da fase de transição entre a imaturidade de uma infância que já não há e o mundo adulto.

Para dar conta de uma lista quase infindável de questões relativas aos quadros, é que o PCdoB instituiu o Departamento de Quadros, estrutura vinculada à Secretaria de Organização, e que é polo formulador de uma política de quadros para todo o Partido.

No caso do CC, o Departamento, ao lado de identificar, orientar, alocar, promover quadros nacionais, tem a tarefa de estruturar departamentos de quadros locais que, juntos e articulados em torno de uma política e um plano de ação, conformem um sistema nacional – que identifique e dê curso às carreiras dos quadros que surgem, e que também oriente o deslocamento de quadros para o atendimento de demandas políticas e organizativas de estados e grandes municípios.

É nos estaduais e municipais que ganha maior concretude a tarefa de identificar os quadros, saber de sua formação, de sua experiência, de seus atributos, das condições de sua militância e de suas perspectivas, e, mais que cadastros, constituir verdadeiros prontuários.

Tarefa pertinente no nível de um municipal é a identificação de proto quadros, ou quadros em potencial, ou militantes na iminência de se tornarem quadros, e cuidar deles desde esta etapa de sua militância.

Passo importante é cuidar da formação individual dos quadros e destes proto quadros. Cursos da Escola Nacional e seminários da FMG são sempre bons instrumentos e momentos formativos em qualquer etapa da educação do militante, mas, para um quadro, é insuficiente, por não dar conta da necessidade específica de sua formação. Uma vez que o camarada ingressa na categoria quadro, ou dela se avizinha, o estudo individual, devidamente orientado e monitorado, ganha peso maior.

Evidente que não são tarefas de uma pessoa só. Pertencem todas à Direção. E é por ela que uma política de quadros adequada começa: seja porque nela pressupõe-se concentrarem-se quadros, seja porque dela emana a política e o projeto que dão base à ação do Departamento de Quadros.

Elder Vieira é escritor e servidor público, professor da Escola Nacional João Amazonas, e membro do Comitê Municipal e do Comitê Estadual de São Paulo.

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Last Update: 28/07/2025