Pouco mais de um mês após o Progressistas aprovar a constituição de federação partidária com o União Brasil, foi a vez deste confirmar a junção, criando uma nova formação política. Ou, na realidade, nem tão nova, pois reunifica, 40 anos depois, um mesmo campo político. Vemos – em outro contexto e com novos personagens – o renascimento da Aliança Renovadora Nacional (Arena), agremiação de sustentação da ditadura (1964–1985). Ou seja, um peculiar retorno às origens.
Tanto o PP quanto o União descendem da antiga Arena, fundada em 1966, logo após a ditadura extinguir o sistema multipartidário vigente entre 1946 e 1964. Em 1980, com o fim do bipartidarismo forçado pelos militares e a obrigatoriedade de que as novas agremiações adotassem novas denominações (sempre precedidas do termo “Partido”), a Arena tornou-se Partido Democrático Social (PDS). Era a mesma entidade com nova marca, embora alguns quadros tenham saído para formar o também novo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que, apesar do mesmo nome da organização de Getúlio Vargas e Jango, era uma versão fajuta e direitista do original, roubando a sigla de Leonel Brizola, seu legítimo herdeiro, e obrigando-o a recriar o velho PTB como Partido Democrático Trabalhista (PDT).
Em julho de 1984, o PDS sofreu uma defecção, quando um grupo insatisfeito com a não realização de prévias partidárias para escolher o sucessor de João Batista Figueiredo, e que não queria apoiar a candidatura de Paulo Maluf à Presidência, formou a Frente Liberal. Sua deflagração ocorreu com a renúncia de José Sarney à presidência do PDS, logo após Figueiredo vetar prévias para a escolha do candidato presidencial. Outro momento importante foi a entrada na Frente Liberal dos derrotados na convenção interna do partido que venceu Mario Andreazza e lançou Maluf à sucessão, em agosto de 1984. Esse grupo se aliou ao PMDB para eleger Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, formando a Aliança Democrática. Em seguida, transformou a dissidência no Partido da Frente Liberal (PFL).
O PDS manteve-se na oposição ao governo Sarney, mas dali para a frente, por diversas vezes, PDS e PFL aliaram-se em coligações eleitorais ou em coalizões de governo. O PDS mudou várias vezes de nome, em certos momentos, ao incorporar legendas menores: PPR, PPB, PP. Sempre, contudo, preservou seu número de urna, o 11 (inicialmente era o 1).
O PFL transformou-se em DEM em 2007, numa estratégia de rebranding. Algo notável sobre o PFL/DEM foi sua capacidade de se manter na oposição durante todo o período em que o PT governou o País. Por isso mesmo, não faz sentido classificar o PFL/DEM como uma agremiação do Centrão, ou um partido de adesão, como prefiro denominar esses que aderem a quaisquer governos, desde que bem recompensados.
Em 2022, o DEM fundiu-se ao ex-nanico PSL, legenda que elegeu Bolsonaro, formando o União Brasil. Nesse momento, a agremiação mudou de características, tornando-se um partido de adesão. Ainda assim, num cenário em que os partidos de adesão já não são mais tão aderentes, pois, com o ganho de poder do Congresso em relação ao Executivo, já não emprestam tão facilmente seu apoio aos governos – especialmente quando são ideologicamente menos alinhados com eles, como é com o Lula 3.
Já o PP foi base de Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro, atuando como partido de adesão desde o governo Collor, e assim perdendo a condição de principal agremiação da direita, que teve durante os últimos anos da ditadura e o governo Sarney.
Uma característica dos partidos de adesão é a falta de uma espinha vertebral programática que lhes confira a condição de liderar disputas presidenciais. Desde a redemocratização, excetuadas as conjunturas peculiares que elegeram políticos marginais como Collor e Bolsonaro, foram PT e PSDB – partidos vertebrados – os protagonistas da disputa. Com o desfazimento do tucanato e a constituição da ultradireita bolsonarista como polo da disputa nacional, cabe perguntar se há espaço para outro ator relevante no campo da direita que possa desempenhar tal protagonismo.
A federação PP–União não parece vertebrada o suficiente para se habilitar a esse papel, apesar de contar com um postulante declarado à disputa presidencial, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado. O impacto maior dessa nova entidade tende a dar-se sobre o projeto bolsonarista de eleger uma grande bancada parlamentar, tornando o Congresso – o Senado, em particular – uma trincheira de enfrentamento ao STF, para prejudicá-lo. Afinal, esse tipo de embate não é prioridade dos que formam a federação. A ver. •
Publicado na edição n° 1360 de CartaCapital, em 07 de maio de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A volta da Arena’