Se você é ou já foi um pós-graduando no Brasil, sabe que falar em reajuste de bolsas de estudo não é discutir um simples benefício — é falar de sobrevivência. Mas talvez quem nunca viveu essa realidade não compreenda o que isso significa na prática. Por isso, quero começar este texto contando um pouco da minha história.

Sou de Recife, Pernambuco, e entrei na ciência muito cedo, graças a uma bolsa de iniciação científica do CNPq. Foi essa oportunidade que abriu uma janela para o mundo, me permitindo sonhar em contribuir para o conhecimento e para o desenvolvimento do país. Ao longo da minha trajetória, fui bolsista quatro vezes: na iniciação científica do CNPq, no programa Ciência sem Fronteiras, no mestrado pela FACEPE e, agora, no doutorado pela CAPES. Para essa última bolsa, precisei deixar Recife e me mudar para o Sudeste, onde curso doutorado em Saúde Pública. Essa mudança apenas reforça o óbvio: sem apoio financeiro, pesquisadores não podem se dedicar integralmente à ciência — muitas vezes, nem continuar seus estudos.

E essa história não é só minha. Ao longo do caminho, vi colegas brilhantes abandonarem a pós-graduação porque simplesmente não conseguiam mais se sustentar. Pense nisso: a bolsa de mestrado ficou 10 anos sem reajuste e, mesmo após a atualização em 2023, segue em 2.100 reais. A de doutorado, 3.100. Pode parecer razoável, mas para recebê-las, precisamos assinar um contrato de exclusividade, o que significa que esse valor precisa cobrir moradia, transporte, alimentação, materiais de estudo e todas as despesas do dia a dia. Você conseguiria viver com esse orçamento?

O reajuste de 40% concedido em 2023 foi um alívio após anos de congelamento, mas já não basta. Segundo a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), desde esse último aumento, a inflação já corroeu 7,23% do valor das bolsas. No longo prazo, a defasagem é ainda mais alarmante: desde o penúltimo reajuste, em 2013, a perda acumulada chega a 93,33%.

Enquanto o salário mínimo é corrigido periodicamente para preservar o poder de compra, os pesquisadores brasileiros seguem sobrevivendo no limite. O impacto disso não se restringe às nossas vidas individuais. Sem pesquisadores, não há inovação, não há desenvolvimento, não há soberania tecnológica. E o alerta é claro: hoje, 90% da ciência brasileira vem da pós-graduação.

Agora, às vésperas da votação do Projeto de Lei Orçamentária de 2025 (PLOA 2025), que tramita no Congresso Nacional e deve ser votado após o Carnaval, é hora de reforçar essa urgência. O orçamento do próximo ano precisa refletir as reais necessidades do país, priorizando ciência, educação e a implementação de direitos sociais. Os cortes sucessivos nesses setores resultaram em um acúmulo histórico de defasagem das bolsas, evasão na pós-graduação e no sucateamento das universidades públicas.

Mesmo com os esforços recentes de recomposição, o orçamento proposto para 2025 ainda é insuficiente para que o Brasil avance em ciência e tecnologia. É fundamental garantir ao menos R$ 1 bilhão a mais para CAPES e CNPq, permitindo não só um novo reajuste das bolsas, mas também a ampliação do número de pesquisadores beneficiados.

Se queremos um Brasil inovador, soberano e capaz de transformar sua realidade, investir em ciência não é uma opção — é uma necessidade. E essa necessidade começa agora, garantindo que nossos pesquisadores não precisem escolher entre fazer ciência ou sobreviver.

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Last Update: 20/02/2025