Em mais um ataque retórico que já não surpreende, mas continua preocupando, o presidente argentino Javier Milei intensificou seu confronto com a imprensa por meio de uma série de publicações nas redes sociais, nas quais lançou acusações infundadas e fez ataques pessoais. O chefe de Estado não apenas reafirmou sua tese de que jornalistas “treinam” para provocar entrevistados, como também chegou a sugerir que deveriam ser ainda mais “odiados” pela sociedade.
Durante o Dia do Trabalhador, Milei elevou o tom. Em sua conta oficial na rede X (antigo Twitter), publicou uma enxurrada de perguntas retóricas para justificar a atitude de seu assessor Santiago Caputo, que dias antes havia intimidado um repórter fotográfico antes de um debate eleitoral. O presidente insinuou que jornalistas perseguem, assediam, empurram com microfones e até invadem a privacidade de figuras públicas com drones e luzes potentes, com o objetivo de agredir ou expor.
“É lícito que jornalistas usem drones na casa de uma pessoa? É lícito que mintam, caluniem e difamem sem permitir defesa?”, escreveu. E concluiu: “Por isso odeiam as redes sociais. Hoje não podem extorquir nem chantagear. Suas receitas caem e por isso batem”.
Sem apresentar provas ou dados verificáveis, Milei compartilhou a imagem de uma suposta cartilha de “treinamento” jornalístico, onde se ensinaria a “empurrar, pisar e até cuspir” propositalmente para provocar uma reação do entrevistado. A imagem serviu de gatilho para uma nova rodada de acusações, com a repetição de uma frase que se tornou frequente em seu discurso: “Não odiamos o suficiente os jornalistas”.
A resposta de profissionais da comunicação foi rápida. Fontes de instituições acadêmicas ligadas ao ensino de jornalismo, assim como representantes do setor midiático, desmentiram categoricamente a existência de tais práticas. Explicaram que o chamado media training, ao qual Milei se refere, não é voltado para jornalistas, mas sim para autoridades, dirigentes ou porta-vozes — com o objetivo de prepará-los para entrevistas, e não de estimular hostilidade.
O ataque também tem nomes. Milei passou a apontar diretamente comunicadores como Diego Brancatelli, Nacho Girón e Paulino Rodríguez, numa estratégia de personalização que busca criar inimigos visíveis para sua narrativa. Esses ataques elevaram o alerta em organizações que atuam em defesa da liberdade de imprensa.
Tanto o Foro de Periodismo Argentino (FOPEA) quanto a Associação de Entidades Jornalísticas Argentinas (ADEPA) expressaram preocupação com o progressivo enfraquecimento das garantias institucionais para o exercício livre do jornalismo no país. Em notas públicas, destacaram o efeito intimidador desse tipo de retórica, que atinge não só jornalistas, mas a qualidade democrática como um todo.
Embora Milei se diga vítima de uma suposta conspiração midiática, seu discurso parece mais voltado a enfraquecer os contrapesos críticos do que a resolver problemas concretos. Em um contexto econômico e social frágil — com mais de 200 mil pessoas desempregadas em La Plata e na Grande La Plata, segundo o último levantamento do INDEC —, o confronto permanente com a imprensa se revela mais como uma manobra de distração do que como política de governo.
2 de maio de 2025
Fonte: Infoplatense