Capítulo do livro “Walther Moreira Salles, o Banqueiro Embaixador”
Walther vinha com San Tiago Dantas da Zona Sul, num momento muito tenso na cidade do Rio de Janeiro. O rádio do carro estava ligado na Globo. Perto do Flamengo a programação é interrompida para a notícia extraordinária: Vargas havia se suicidado.
Imediatamente San Tiago ordenou ao chofer que rumasse para o Catete. Eram oito e meia da noite quando ambos entraram no Palácio. A essa altura as rádios informavam que os jornais O Globo e a Tribuna da Imprensa estavam cercados por populares enfurecidos.
San Tiago rumou para O Globo, cercado por uma multidão que uivava de dor e ódio. Walther dirigiu-se imediatamente para o último andar do Palácio. Não chegou a entrar no quarto onde Vargas se suicidara. O Palácio era grande e nele contrastavam dois fortes sentimentos: de um lado, uma confusão enorme, de pessoas correndo de um lado para o outro; de outro, uma sensação de vazio, de solidão. Calor mesmo havia apenas do lado de fora, onde uma multidão cercava o Palácio querendo entrar à força, obrigando que se pedisse garantias policiais para evitar a invasão[1].
Mais tarde, começaram a chegar pessoas. Juscelino e Amaral Peixoto foram os únicos governadores a se apresentar. Walther deixou o Palácio por algumas horas, foi à sua casa e retornou logo depois. Cumprimentou Alzira e Amaral (Peixoto), não conseguiu ver dona Darcy e permaneceu no velório até a hora da partida, dividindo um banquinho no primeiro andar em longa conversa com Oswaldo Aranha e em longas reflexões sobre o processo de isolamento de Vargas.
As suspeitas de conspiração internacional vazavam por todos os poros da República e impregnavam as paredes do Palácio. Na época, a Bolsa de Nova York abriu investigações sobre as operações brasileiras no mercado de café, que ajudaram a precipitar a queda das cotações. Aranha acreditava que a queda era mais um capítulo da longa conspiração contra Vargas. A insistência de Aranha nessa tese cansava um pouco Walther.
Conhecedor do mercado, Walther não via fundamento em suas acusações.
Em 1952, Aranha informou aos principais comercializadores de café, os irmãos Jabour, Wallace Simonsen e o respeitado Marcelino Martins, com seu sobrinho Floriano Peçanha[2], que fixaria um preço mínimo para o produto a 87 centavos de dólar. Abaixo disso, ninguém poderia exportar café. Segundo Peçanha, Marcelino Martins alertou que os preços poderiam subir em vendas e que quando o mercado revertesse os comercializadores estariam presos a valores mínimos definidos. Conforme o previsto, o preço chegou a bater em um dólar. Depois voltou para 83 centavos. Naquele ano, o Brasil praticamente não exportou café. Foi um dos mais magros anos de um setor crucial para o equilíbrio do balanço de pagamentos, precipitando a queda de Vargas.
O desastre foi mencionado na carta-testamento como prova da conspiração internacional contra o Brasil. A versão de Peçanha era bem mais objetiva do que as lendas que se formaram em torno da operação.
[1](Salles W. M.)
[2]( (Peçanha)