A agressão de Trump à Venezuela começou há muito tempo, já no seu primeiro mandato. Ele aprofundou as sanções sobre o país de forma desmedida, e o resultado foi que a Venezuela não podia mais exportar seu principal produto: o petróleo.
Depois, não satisfeito, Trump indicou Juan Guaidó, na época presidente da Assembleia Nacional, como presidente interino do país. Durante seu “reinado”, os EUA se apossaram das riquezas venezuelanas, como o ouro que estava depositado no Banco da Inglaterra, as reservas internacionais e a rede de postos de gasolina e refinarias que a Venezuela possuía nos EUA.
Neste segundo mandato, a primeira ação contra a Venezuela foi a deportação de 250 venezuelanos para uma prisão de segurança máxima em El Salvador. O presidente Trump pagou 6 milhões de dólares pelo aluguel de um ano para que os venezuelanos fossem detidos lá.
Em março de 2025, o governo Trump deportou centenas de venezuelanos acusados de ligação com a gangue criminosa Tren de Aragua, considerada uma organização terrorista pelos EUA. Eles foram enviados ao Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT), uma prisão de altíssima segurança construída por Nayib Bukele (presidente de El Salvador) para membros de gangues. A deportação foi feita sem julgamento, com base em uma lei de 1798 sobre inimigos estrangeiros.
O inferno
A prisão foi um verdadeiro inferno para esses venezuelanos. Um exemplo é um jovem chamado Luis Edixon, que trabalhava como entregador nos EUA. No dia em que foi preso, ele estava trabalhando para um aplicativo de entregas. Trafegava com seu caminhão para entregar uma refeição, acompanhado de seu filho, de seis anos, quando um policial o parou. A luz dianteira de seu caminhão estava queimada e os policiais apontaram que ele tinha uma multa que não havia sido paga. Ele foi preso pelos policiais, que o levaram para um centro de detenção, enquanto o filho foi levado pelos próprios policiais. A prisão ocorreu em Milwaukee, a duas horas de Chicago, onde estava sua esposa, mãe de seu filho.
A partir daí começa a saga desse rapaz, que foi transferido para outra prisão, também em Milwaukee, uma cidade dos EUA no estado de Wisconsin. Quando foi detido, o oficial do Departamento de Imigração e Alfândega dos EUA, conhecido por sua sigla em inglês como ICE, que o revistou, acusou-o de ser membro do “Tren de Aragua”, uma gangue criminosa desmantelada na Venezuela. O oficial chegou a essa conclusão por conta de um ferimento que Luis Edixon tem na perna direita e de várias tatuagens.
O pesadelo começou em 11 de abril de 2025, quando oficiais de segurança norte-americanos o tiraram do centro de detenção de imigração em Milwaukee e o levaram para Chicago com migrantes de outras nacionalidades, que também seriam expulsos. Ele foi então colocado em um avião que o levou para Louisiana-Arkansas-Texas.
Depois, foi transferido para outro centro de detenção em Brownsville, Texas, onde foi novamente acusado de ser membro do “Tren de Aragua”, usando as mesmas “razões”. Ele explicou que o ferimento na perna foi resultado de um acidente de carro que causou múltiplas fraturas, exigindo cirurgia. Uma das tatuagens tem um sol e a inicial do nome da esposa. Dias depois, ele conseguiu ver o juiz que começou a tratar do caso, a quem pediu a deportação para a Venezuela. Nessa data, os primeiros 238 venezuelanos já haviam sido transferidos para o CECOT.
O juiz disse que ele teria um processo de deportação para a Venezuela em 15 dias. Quando o período terminou, começou sua jornada para o inferno.
O jovem Luis teve que entrar em um avião que logo decolou. Os passageiros foram ameaçados pelos oficiais do ICE para que não olhassem pelas janelas, mas acabaram vendo uma pista ao lado do mar, como se fosse uma ilha. Eles estavam na base naval de Guantánamo, em Cuba, onde há um centro de detenção. É sabido que neste lugar os norte-americanos cometem todo tipo de tortura e violações dos direitos humanos, uma ação amplamente denunciada por organizações não governamentais (ONGs) e pela qual o país imperialista não recebeu nenhuma punição de nenhuma organização internacional.
Em Guantánamo, os oficiais da Marinha os empurraram e derrubaram; nenhum deles tinha nome, todos tinham seus nomes encobertos. Foram transferidos para um ônibus com sacolas pretas cobrindo todas as janelas, para que nada pudesse ser visto. Eles foram mantidos naquele local por aproximadamente seis horas. No início, disseram que ficariam em Guantánamo por no máximo 180 dias. Depois de algumas horas, foram colocados um por um em cadeiras diferentes e cobertos para que não se vissem. Um oficial do ICE sentou-se e deu-lhes uma notificação onde se dizia que seriam levados para El Salvador.
Viagem em choque
Depois disso, dois oficiais da Marinha chegaram para levar cada prisioneiro do ônibus para o avião militar que os transportaria para o CECOT. Pareceu a Luis Edixon que aqueles soldados estavam apenas de passagem por El Salvador. Na época, os prisioneiros ainda tinham alguns pertences que foram tomados. Luis Edixon não soube a hora em que o avião pousou no aeroporto do pequeno país centro-americano.
Eles primeiro tiraram os salvadorenhos e os colocaram em outro ônibus. “Então eles começaram conosco. Dois oficiais da Marinha nos derrubaram e dois oficiais do CECOT nos receberam (…) Eu estava com a cabeça baixa e eles me agarraram pelos cabelos, levantaram meu rosto e tiraram uma foto minha de frente.” Um enorme destacamento militar os recebeu, com tanques, carros, helicópteros e viaturas.
A descida de Luis do avião militar para o CECOT foi registrada pela imprensa e deu a volta ao mundo. Foi assim que a família do jovem descobriu que ele estava sendo mantido refém naquela prisão. O ônibus deu partida, e eles ainda não conseguiam levantar o rosto. Eles ouviam o barulho das viaturas, os helicópteros que estavam por perto. A viagem durou aproximadamente 20 minutos. Depois disso, foi aí que o filme de terror em si começou.
“Eles nos derrubaram; quando me vi ajoelhado sobre aqueles X’s, porque eram X’s onde eles nos ajoelhavam e nos barbeavam. Enquanto nos barbeavam, eles chutavam nossas pernas. Eu tenho uma perna que foi operada por uma fratura da tíbia e fíbula, e minhas pernas não tiveram descanso adequado, tive muitas complicações com isso, e eles chutaram minhas pernas, nos batiam na cabeça. Depois de nos barbearem, levaram-nos para outra sala e nos fizeram despir em frente a mais de 100 pessoas; eram todos guardas (…). Fiquei de cueca e eles me disseram que não, que eu tinha que tirar tudo.”
Todos estavam algemados, “com uma corrente na barriga em direção às mãos e duas algemas nos pés. Lá eles trocaram: a corrente não ia mais para a barriga (…), mas eles as colocavam atrás de nós e a corrente ia para os pés. Alguns dos presos caíram no chão, e os oficiais salvadorenhos passavam por eles e os arrastavam. Havia um preso que estava gritando por causa da dor na perna. Ele estava com a perna quebrada e não deram atenção a ele.”
Após uma curta viagem, eles chegaram a um local, onde em questão de minutos receberam “cortes de cabelo, raios-X, registro e voltaram novamente para o ônibus para levá-los ao módulo onde estavam os outros venezuelanos sequestrados. Quando eles foram trancados na cela, Luis Edixon diz que levou cerca de uma hora para se levantar. Ele afirma que no caminho para aquele lugar, “não vi um espaço na rota por onde passamos, não sabia de nada, em nenhum momento pudemos levantar a cabeça”.
“Passamos cerca de uma hora ajoelhados na parede dos fundos da cela onde eles nos colocaram. Eles nos colocaram na cela número 12”. Ele acrescenta que os guardas já haviam saído, “e sentimos que eles ainda estavam do lado de fora, porque não podíamos nos virar”. Os venezuelanos que estavam nos outros cubículos disseram-lhes para fazerem isso, para se levantarem. Já era 12 ou 13 de abril quando eles chegaram.
Na prisão havia cerca de 80 leitos por cela, dois tanques e ao lado dos tanques, dois banheiros. Ali estavam os esgotos por onde a água descia, canos de PVC de quatro polegadas, fossas sépticas.
Alimentos não saudáveis
A “alimentação” dos detidos no CECOT é algo que tem sido amplamente destacado nos últimos meses. O café da manhã era servido às 5h da manhã: arroz, feijão e tortilha. No almoço: arroz e massa. Para o jantar: arroz, feijão e tortilhas. Apenas carboidratos.
Um dia, como havia uma visita de alguém importante, eles mudaram o cardápio e deram a eles uma empanada recheada com pizza e batatas fritas, além de meio litro de suco Yukery. A visita poderia muito bem ter sido a feita, em maio, por Matt Gaetz, que foi até 2024 membro da Câmara dos Representantes dos EUA. No dia 12 daquele mês, o americano transmitiu um trecho da visita à mega prisão, em seu programa One America News.
No vídeo, a delegação que acompanha Matt Gaetz pode ser vista caminhando pela megaprisão, enquanto os venezuelanos sequestrados exigem “liberdade, liberdade”. Eles também gritam o nome do país: Venezuela. Eles também repudiaram a presença do ex-congressista que se tornou apresentador de TV a cabo.
A libertação
Em julho de 2025, os venezuelanos foram libertados como parte de uma troca de prisioneiros entre os governos de Trump e Maduro. A Venezuela cedeu 10 cidadãos e residentes americanos, além de 80 presos políticos, em troca dos imigrantes detidos no CECOT. O retorno dos deportados foi celebrado por Nicolás Maduro como uma vitória diplomática, com direito a recepção oficial e transmissão ao vivo na TV estatal. Muitos dos libertados relataram maus-tratos e isolamento extremo durante a detenção em El Salvador. A troca gerou críticas e manifestações, tanto na Venezuela quanto internacionalmente, sobre o uso político da imigração como ofensa aos direitos humanos.
A Ameaça de Invasão
O fato de Maduro ter capitalizado politicamente o retorno dos deportados foi visto por Trump como um desafio aos EUA. A decisão de Donald Trump de enviar uma frota militar para o litoral da Venezuela em agosto de 2025 foi oficialmente apresentada como uma operação contra cartéis de drogas latino-americanos, mas é evidente que a iniciativa tem forte caráter político e estratégico.
O governo Trump teve a coragem de inventar uma completa farsa, alegando que a missão visava combater o narcotráfico, especialmente grupos como o Tren de Aragua e o Cartel de Sinaloa, que foram classificados pelos EUA como organizações terroristas internacionais. Trump não parou por aí: acusou o Presidente eleito Nicolás Maduro de liderar o Cartel de los Soles, supostamente responsável por enviar toneladas de cocaína aos Estados Unidos. Trata-se de uma iniciativa com claros objetivos geopolíticos de derrotar o país que resistiu a centenas de sanções e, mesmo sem poder exportar petróleo, conseguiu manter o regime bolivariano e fazer da Venezuela o país que mais cresce na América do Sul.
A frota militar
Foram enviados três destróieres com mísseis guiados, navios anfíbios, aviões espiões P-8 Poseidon, submarinos e cerca de 4.000 militares, incluindo fuzileiros navais. Os navios estão equipados com o sistema de combate Aegis e mísseis Tomahawk, capazes de realizar ataques de longo alcance.
A missão militar é um recado direto a Maduro, mostrando que os EUA têm capacidade de invadir ou desestabilizar o regime bolivariano, mesmo que não haja intenção imediata de invasão do país. Não há qualquer racionalidade em usar armamento tão pesado para combater cartéis de drogas. O governo Trump parece querer reviver a chamada Doutrina Monroe, que defende que a América Latina é uma extensão do território norte-americano.
A Reação da Venezuela
Em 23 e 24 de agosto, o governo de Nicolas Maduro convocou o processo de alistamento nacional e convocação das forças da Milícia Nacional Bolivariana “a todos aqueles que desejam fazer parte do Grande Plano Nacional de Soberania e Paz, Simón Bolívar, com o objetivo de defender a nação”.
O governo divulgou uma conclamação ao povo da Venezuela para comparecer ao alistamento. Por sua vez, a vice-presidente executiva da República Bolivariana da Venezuela, Delcy Rodríguez, declarou pelo Telegram: “A planta insolente dos Estados Unidos (EUA) ousa ameaçar nossa pátria. Nossa resposta como povo unido será firme, de alta consciência patriótica e orgulhosa de nossa dignidade histórica”.
O Apelo
Em uma reunião de unidade nacional, o Presidente da República Bolivariana da Venezuela, acompanhado por representantes de toda a sociedade venezuelana, reuniu-se “em defesa dos sagrados direitos à autodeterminação, ao pleno exercício da soberania e à paz conquistada”.
Isso foi lembrado pelo chefe de Estado em seu canal Telegram, onde compartilhou fotos do ato solene de “Defesa da Soberania e Paz da Venezuela, América Latina e Caribe, Territórios da Paz”, onde foi prestada homenagem à herança dos libertadores e a riqueza moral, espiritual e ética foi reafirmada.
“Sinto a presença imortal da gloriosa história de nossa pátria, a Venezuela. Que história, que grande riqueza temos! Nossa riqueza é mais do que petróleo, ouro, ferro e gás; é uma riqueza moral, espiritual e ética, herdada de nossos libertadores”, ressaltou.
Ele também enfatizou que “viemos da história da independência. Quando os espanhóis, através de sua luneta, viram Bolívar, defendendo sua pátria, com a bandeira amarela, azul e vermelha, viram o general magro e guerreiro, o Libertador. E aquela cidade estava cheia de paixão. Este não é o momento para diferenças políticas ou cores; uma única bandeira nos abriga. A Venezuela é inexpugnável! Nada nem ninguém tocará nossa pátria!”
Por outro lado, ele pediu a todos os venezuelanos que assinem o “Consenso pela Vida e a Paz”, uma iniciativa que busca proteger a pátria contra qualquer ameaça externa e consolidar o destino soberano da nação.
Por fim, agradeceu a todas as instituições e setores da sociedade venezuelana, bem como aos governos e povos do mundo, pela solidariedade e apoio que deram à Venezuela hoje. “Em qualquer circunstância: nervos de aço, calma, sanidade e máxima unidade nacional. Deus está conosco!”