Série publicada no Jornal da Tarde, em dezembro de 1979

Campanhas a propósito de tudo (ou de nada) com dinheiro oficial

Esta reportagem, a quinta da série, mostra que,  antes mesmo do aparecimento da Secom, o governo já havia sucumbido à tentação de utilizar o poder de suas verbas publicitárias para interferir em matérias redacionais. E dá alguns exemplos da grande temporada de caça publicitária que vem ocorrendo em Brasília.

Quando foi criada a atual estrutura de comunicação social do governo, com coordenadorias em cada ministério, autarquia ou coligada, subdivididas em um setor de assessoria de imprensa e outro de relações públicas, não foram poucos os jornalistas brasilienses que pressentiram os riscos que isso implicava. Como resumiu um veterano jornalista brasiliense: 

-Com uma mão eles vão estender verbas; com a outra, notícias. 

Antes mesmo que a Secom surgisse, implantando o seu próprio estilo, o governo já havia sucumbido à tentação de utilizar o poder de suas verbas publicitárias para interferir em matérias redacionais patrocinando-as, ou pressionando os recalcitrantes. 

Em 1978, por exemplo, às vésperas das eleições majoritárias para a Câmara e o Senado, o coronel Rubem Ludwig, assessor de Imprensa da Presidência da República, convocou para uma reunião os coordenadores de comunicação social dos Ministérios da Fazenda, Interior, Agricultura e Minas e Energia. Motivo: fazer um remanejamento das diversas verbas publicitárias que permitissem financiar uma série de reportagens em um diário carioca que mostrariam as realizações do governo. 

O diário havia estimado a campanha em Cr$ 16 milhões. Os coordenadores acharam caro. Baixou-se para Cr$ 12 milhões. 

O contrato acabou não sendo celebrado porque prevaleceu entre os coordenadores e o coronel aceitou o argumento da convicção de que a campanha acabaria provocando reações negativas de outros jornais; e também porque os leitores daquele diário não estavam tão carentes assim de matérias governistas.

A RELAÇÃO DO SNI 

Por outro lado, há muito tempo o SNI vinha e vem mantendo a sua relação de publicações consideradas contrárias ao regime e proibidas de receber a publicidade oficial. 

O controle é rigoroso, conta um coordenador de comunicação social brasiliense. Às vezes, procurávamos veicular algum anúncio nas publicações do índex, mas só podíamos fazê-lo com a expressa autorização dos homens. Quem desobedece, está na rua. 

Individualmente, também, cada grande empresa estatal ou cada ministério tem sua própria relação de publicações consideradas aliadas ou inimigas. A Petrobrás, por exemplo, durante algum tempo instituiu o seu index, vetando anúncios em publicações contrárias ao monopólio estatal. Na mesma época em que isso ocorria, leitores mais atentos podiam observar uma profusão de anúncios da Previdência Social num jornal carioca hostilizado pela Petrobrás. 

  • É o espírito da patota que nos ajuda a vencer essas barreiras –explica um jornalista brasiliense que costuma circular com bastante desenvoltura por entre as fontes de notícia e de publicidade do governo. 

O que a Secom pretende, no entanto, é unificar a política de comunicação social do governo, valendo-se de seus poderes normativos, concedidos pela lei que a criou. 

Para os homens da Secom, o que se pretende é apenas orientar as diversas coordenadorias. 

O que se busca é colocar parâmetros profissionais de comunicação explica o publicitário Carlos Eduardo Jardim, secretário de Projetos Especiais, órgão da Secom encarregado de fiscalizar a publicidade oficial.

É evidente, porém, que essa unificação da política de comunicação social do governo, se bem sucedida, vai significar, na prática, uma diminuição progressiva dos centros de decisão, que determinam o destino da publicidade oficial. Daí para a utilização política da publicidade é um pulo. 

  • Admito que em mãos erradas esse instrumento poderá ser mal utilizado. Mas, no momento, é difícil que isso ocorra, porque o comando é contrário à interferência, diz Jardim. 

E no entanto, no mesmo momento em que Jardim expressava suas convicções, a Imprensa denunciava a primeira tentativa concreta de unificação das verbas publicitárias, empreendida na era Secom. 

O ministro César Cals, das Minas e Energia, contabilizou as verbas de publicidade de seu Ministério e empresas coligadas. Perfaziam Cr$ 800 milhões por ano. Convocou um consórcio de agências de publicidade, as maiores, mais bem equipadas. Manteve com elas diversas reuniões, de onde brotou uma infinidade de documentos que praticamente impediram de desmentir, posteriormente, as condições impostas ao consórcio: em troca da verba, deveria administrar também a sua imagem. 

A constituição do consórcio foi engendrada por Fernando Pouchain, publicitário que companha Cals desde os seus tempos de governador do Ceará. A idealização da campanha, atribuída a Sílvio Leite, jornalista cearense, coordenador de comunicação social do ministério, posteriormente demitido e integrante de um grupo de jornalistas brasilienses já acusados de se prestar a jogadas promocionais de seus conterrâneos, a chamada “máfia cearense”.

PALESTRAS CARAS 

Quando descoberto, o ministro havia procedido ao primeiro movimento de seu minueto publicitário: o patrocínio do Seminário de Energia, série de palestras promovidas por um jornal carioca em diversas capitais sobre o tema energia, tendo como atores principais ministros e autoridades do setor e que custou aos cofres do ministério a bagatela de Cr$ 36 milhões. 

As denúncias cortaram ao meio o seu festival publicitário, e a imagem de Cals terminou literalmente em frangalhos. 

Mas Cals não é o único ministro a recorrer a tais expedientes. Foi apenas o mais desajeitado. 

De fato, o dia de posse de João Baptista Figueiredo na Presidência da República provavelmente entrará para a história da publicidade brasileira como o da abertura oficial da maior temporada de caça publicitária jamais ocorrida em Brasília. 

O que está acontecendo é que não é apenas o regime ou o presidente que estão se preparando para recorrer ao auxílio dos recursos da mídia. 

Também os demais homens do regime. Justifica-se: até o governo Geisel, quem determinava os parâmetros para as carreiras oficiais era o sistema, com suas regras de conduta bem definidas e de fácil compreensão. Todos evitavam falar o máximo possível, apareciam o estritamente necessário, e aceitavam os cargos como “uma missão que me foi confiada”. 

Com a abertura, as regras são outras. Laudo Natel talvez tenha sido o derradeiro homem público deste país a aceitar a tal “missão” que é como ele qualificou o governo do Estado, poucos dias antes da convenção partidária que o aliviou do pesado fardo. 

CUIDAR DA IMAGEM 

O ministro que quiser sobreviver terá necessariamente que cuidar de sua imagem. Por outro lado, pelo menos entre o primeiro escalão do governo, a primeira plateia – o sistema – continua atenta. Assim, os ministros são obrigados a andar num leito de bitola estreita. Nem tão discretos, que desapareçam ante os eleitores, nem tão ostensivos, que despertem as desconfianças do sistema. 

Por isso, hoje, em Brasília, há quem esteja disposto a entregar abarrotada a arca de suas verbas publicitárias, por um fio de Ariadne, capaz de conduzi-lo com segurança pelos intrincados labirintos da formação de uma imagem pública que contente seus dois públicos. 

Os principais candidatos a maquiladores de imagem pública têm-se apresentado em forma de assessorias de comunicação privadas, uma iniciativa que está em franca proliferação em Brasília. São geralmente empresas de pequena estrutura, que têm sob contrato jornalistas de diversas publicações, e que se oferecem para administrar as verbas publicitárias e os serviços de relações públicas dos órgãos do governo. 

  • Esses grupos estão operando como uma antecipação do sistema de lobby na Imprensa revela aquele mesmo jornalista brasiliense. Eles basicamente utilizam o poder de barganha do governo para tornar o release compulsório. 

Em maio passado, por exemplo, os presidentes do Banco do Brasil, Banco Central e Caixa Econômica Federal receberam um ofício de uma dessas empresas. 

O ofício começava dizendo que “é desnecessário frisar a gravidade de que se reveste o problema do combate à inflação na presente conjuntura”. Prosseguia apontando todos os inconvenientes dos surtos inflacionários, e lembrava que Figueiredo colocou a luta contra a inflação como a prioridade mais importante de seu governo. 

“Para o atingimento dessa meta estratégica de tão vital significado, impõe-se desenvolver um persistente e contínuo esforço voltado para a mobilização do apoio e participação da comunidade nacional, sobretudo de seus segmentos mais dinâmicos”, prosseguia o ofício. 

“Todavia, senhor presidente, sabemos que a conquista da opinião pública para esse esforço constitui um trabalho eminentemente profissional, que demanda rigoroso planejamento, ao lado de uma comprovada capacidade de execução de quem se dedicar a essa tarefa fundamental.” 

E se despedia, “na expectativa de merecermos a confiança desse importante órgão que ora se encontra sob a esclarecida direção de V.Sa”. 

Acompanhava o ofício a minuta de um contrato em que a contratada se oferece para “a prestação de serviços de assessoramento e consultoria de comunicação social, relações públicas e propaganda institucional’. 

Tudo o que a tal empresa tem a oferecer “para o atingimento dessa meta estratégica” é um capital social de Cr$ 120 mil, um contingente de jornalistas econômicos colocados em publicações do Rio e Brasília e a experiência de seus três diretores. 

Na mesma época, um desses diretores circulou em vários locais apresentando-se como “assessor político especial” do ministro da Fazenda, Karlos Rischbieter a quem estão afeitas as três instituições. Recentemente, apareceu entrevistando o próprio Rischbieter para um programa de televisão. 

O Banco Central, na época presidido por Carlos Brandão, adversário declarado de Rischbieter, recusou a oferta. Mas o Banco do Brasil e a Caixa Econômica concordaram em assinar um contrato por um ano, prorrogável de acordo com as conveniências de ambas as partes. As duas instituições estão contribuindo com Cr$ 500 mil mensais cada, para a erradicação da inflação. 

Os caminhos para se obter as verbas oficiais e que se constituem um objetivo perfeitamente lícito das agências de publicidade passam, no entanto, necessariamente, pelo relacionamento pessoal com os detentores das verbas. 

Os affaires Cals e Rischbieter não são episódios isolados na vida oficial brasiliense. Há algum tempo, instituiu-se o hábito de autoridades trazerem para o poder guardacostas de suas imagens públicas. 

Quando se tornou presidente da Eletrobrás, por exemplo, o atual governador baiano, Antônio Carlos Magalhães, dispensou os serviços de uma grande agência de publicidade e contratou os de outra modesta agência baiana. 

Da mesma forma procedeu o exgovernador do Distrito Federal Elmo Serejo. Quando presidente do Centro Industrial de Aratu, sua conta publicitária era atendida por uma agência. 

Nomeado governador do DF, Serejo trouxe o dono dessa agência para ser seu chefe da Casa Civil encarregado de administrar as verbas publicitárias do Governo do Distrito Federal (que eles denominam por lá de GDF). 

O MAPA DAS NOTÍCIAS 

Com seu assessor, o referido publicitário passou a veicular pessoalmente as campanhas do GDF. E mantinha em sua sala um mapa diário com as notícias que saíam sobre Serejo, catalogando-as em favoráveis, desfavoráveis e neutras. Os anúncios eram distribuídos proporcionalmente ao desempenho de cada órgão. 

E nem se pode dizer que alguns desses órgãos tenham se rendido um tanto constrangidos aos poderes persuasórios do assessor do governador. 

Hoje em dia, à corrida em busca das verbas do Planalto comparecem espontaneamente muitas publicações. E aquelas tradicionalmente mais conhecidas por veicularem anúncios disfarçados em matéria redacional têm sofrido, nos últimos tempos, a concorrência de novos órgãos. 

Recentemente, por exemplo, o ministro Delfim Neto, ainda na Agricultura, foi procurado para uma reportagem de capa por um semanário de circulação mais restrita a Brasília. 

Tempos depois, com Delfim já no Planejamento, à coordenadoria de comunicação social da Agricultura exibiu para os repórteres setoristas uma fatura de Cr$ 300 mil, referente à reportagem publicada (que ele não pagou). Uma das últimas reportagens de capa foi com o governador mineiro Francelino Pereira. 

A completa falta de controle sobre as citações da área oficial, além disso, cria um campo propício à corrupção, que costuma ser bem aproveitado por alguns gerentes de publicidade. 

Um gerente de publicidade de muita visão comercial, por exemplo, tem oferecido a diversos coordenadores de comunicação social, campanhas orçadas em alguns milhões de cruzeiros, nas seguintes condições: ele dá a desconto de 50% e fornece recibos pelo valor integral; o desconto é do coordenador que topar. 

Um outro gerente de publicidade costuma oferecer suas manchetes às campanhas dos diversos órgãos, e compromete-se a repassar 10% a 20% da fatura para o coordenador que liberar a verba. 

O dinheiro oficial dá para todos. Pois atualmente, em Brasília, fazem-se campanhas e promoções publicitárias a propósito de tudo, ou de nada, e sem a menor preocupação se definir critérios técnicos corretos: ou seja, colocar a campanha correta no veículo correto. E participam dessa farandula publicitária praticamente todos os órgãos da administração pública.

No início de sua gestão no Ministério da Agricultura, por exemplo, Delfim Neto esteve com Figueiredo em Aparecida do Norte. Voltou entusiasmado com o afluxo de romeiros

– Nós conversamos com um padre da cidade, que confirmou que a maioria era, de fato, gente do campo-explica um integrante da equipe. 

A pesquisa consistiu unicamente nessa conversa com o padre.

AS BOLHAS

De posse desse perfil dos romeiros de Aparecida, a assessoria de relações públicas do Ministério preparou um projeto, organizou a concorrência e montou o que um publicitário que participou dos trabalhos denomina de “uma das coisas mais incríveis que já foi feita neste país em termos de comunicação de massa”. 

O projeto consiste inicialmente em duas bolhas infladas a ar, cada uma com capacidade para 200 a 300 pessoas. Na primeira bolha, passa um filme sobre a vida do papa João Paulo II. Na segunda, filmes sobre as histórias e os milagres de Aparecida. 

Nos intervalos, os romeiros podem contemplar painéis sobre cooperativismo rural, dispostos em volta das bolhas. 

Na sala dos romeiros, uma imensa área reservada para os romeiros fazerem suas refeições e higiene pessoal, foram montados 10 auditórios. Para cada um a empresa que fez o filme preparou 10 programas de TV sobre conservação do solo e diversas culturas. Nessas sessões, não acompanha complemento religioso. 

  • A idéia do Delfim era a seguinte, explica o publicitário, se conseguirmos aumentar a produção brasileira de mandioca, arroz e feijão em 10%, acabará a inflação no Brasil. A exposição tem esse objetivo. 

Após os primeiros dias, no entanto, a única esperança que persistia era a de se atrair as benesses da santa. Porque os romeiros mesmo não pareceram interessados no assunto. 

Foram feitas reuniões entre os homens de comunicação do Ministério da Agricultura e o coordenador de comunicação social da Secretaria do Planejamento (ao passar para o Planejamento, Delfim levou consigo o coordenador de comunicação social da Agricultura e as responsabilidades da continuidade da exposição), para se apurar as causas do fracasso. 

No início, supôs-se que a causa do desinteresse tivesse sido a decoração que havia sido objeto de uma concorrência específica. Mudou-se a decoração, e nada. 

Nas últimas reuniões estão sendo apontadas outras razões. Os participantes parecem ter chegado à conclusão de que, apesar da opinião de seu assessor eclesiástico, o público de Aparecida é predominantemente de subúrbio de grandes cidades ou de pequenos núcleos urbanos. Custo inicial do projeto: Cr$ 25 milhões. 

O único que não admite o fracasso é o publicitário: 

  • No início, o pessoal estava meio temeroso. Hoje, a frequência nas bolhas tem sido excepcionalmente grande. 

E, segundo ele, não apenas para se ver o Papa ou os milagres de Aparecida: 

  • O pessoal do Ministério da Agricultura fez uma pesquisa e achou o grau de retenção das mensagens muito bom. Principalmente de uma cabeça de boi muito bem fotografada, que foi colocada num painel sobre cooperativismo com os seguintes dizeres: “Se você não entrou para uma cooperativa, você é como o boi, que não sabe a força que tem”.

A MECA DA PUBLICIDADE 

Com essa fartura de dinheiro, Brasília tornou-se literalmente a nova meca dourada da publicidade brasileira. Isso porque as agências parecem ter-se dado conta de que as incertezas econômicas diminuem o volume de publicidade privada, aumentam as incertezas políticas que, por sua vez, aumentam as verbas da publicidade oficial. 

Mas os caminhos para se conseguir as contas oficiais são caprichosos. Uma grande detentora de contas oficiais, por exemplo, investe basicamente em pessoas bem colocadas no regime. Recentemente, ela contratou o genro do governador do DF como contato. Para concorrer com essa empresa, uma outra contratou um homem ligado a Cals. Por sua vez, para conseguir entrar no Ministério da Fazenda, no governo passado, uma agência carioca valeu-se da amizade do ex-ministro Mário Henrique Simonsen com um parente de seu proprietário. 

Em Brasília, já se tornou lendária a atuação de um amigo de Golbery, representante de agências de publicidade, cuja atuação foi Adalto Barreiros.

As agências que não possuem o seu lobby no governo, porém, precisam sujeitar-se às normas de concorrências públicas. E aí os critérios são meio nebulosos. 

Às vezes, por exemplo, se esbarra no excesso de burocracia. Meses atrás, o Ministério da Agricultura realizou uma concorrência. Para se habilitar a qualquer concorrência em órgãos públicos, as agências de publicidade, ou qualquer outro fornecedor, precisam se cadastrar junto aos respectivos departamentos de material, anexando no pedido 17 documentos diversos. 

Assim procederam nove agências que trataram de atender às solicitações contidas no edital de concorrência. 

Um dos itens solicitados era a apresentação da prova de custo dos veículos (isto é, das publicações onde as campanhas seriam inseridas). Sete delas levaram as tabelas de preço dos veículos. Foram desclassificadas. Duas delas, além da tabela anexaram uma carta dos veículos, confirmando que o preço era aquele mesmo. Levaram a conta. 

Mas nem sempre é meticuloso assim. Em sua gestão no Ministério da Agricultura, Delfim Neto propôs a realização de uma enorme campanha publicitária, anunciando os novos preços mínimos para a agricultura. 

Normalmente, isto é matéria para a Comissão de Financiamento da Produção (CFP) , entidade vinculada ao Ministério, e encarregada de financiar os preços mínimos e o armazenamento. 

Movimentando uma enorme verba anual, a CFP tem a prerrogativa legal de aplicar parte dela na divulgação das mudanças nos preços mínimos. Normalmente, então, ela recorre ao rádio e a uma série de cadernos de acabamento simples, distribuídos pela rede de extensão rural do Ministério. 

Delfim queria uma campanha mais ampla. Alegava que a situação do País, em termos de estoque, era frágil; e que a demora em se aprovar leis favoráveis à agricultura poderia frustrar as expectativas, numa época em que se começavam a preparar novas áreas para plantio. 

A campanha foi orçada em Cr$ 150 milhões (a maior campanha que o Ministério da Agricultura veiculou no ano anterior havia custado Cr$ 7 milhões). A mídia escolhida foi a televisão considerada pelos homens do Ministério que atuam na área da mídia rural como de pouca eficácia para o campo. 

Para licitações acima de Cr$ 15 milhões, a legislação ordena a abertura de uma concorrência pública. Assim, o órgão é obrigado a publicar os termos do edital em jornais e na Associação Comercial. E aguardar um prazo de 30 dias para a abertura da proposta. 

O edital foi publicado no dia 20 de junho E cancelado no dia seguinte. 

Ocorre que Delfim já havia acertado com Rischbieter e Oswaldo Collin, presidente d Banco do Brasil.

Paulo Vianna, na época presidente da CFP, propôs então que se dividisse a campanha em duas. Uma parte, de preços mínimos, seria submetida aos dispositivos de concorrência pública. A outra, mais genérica, destinada a promover institucionalmente o homem do campo para o telespectador da cidade a campanha se chamava “plante sem medo” iria para o BB. 

A proposta foi recusada. O BB patrocinou toda a campanha e e sua agência de publicidade tornou-se a primeira grande beneficiária do processo de desburocratização da economia, levando, sem concorrência, uma das três maiores campanhas institucionais do ano. 

No panorama publicitário brasiliense coloque-se, portanto, de um lado, os detentores das verbas de publicidade e do outro, os candidatos às campanhas oficiais. Os primeiros definem os critérios e as condições para liberarem o dinheiro. Os segundos se aparelham da melhor forma para conquistar as campanhas. 

Os primeiros tratam com o dinheiro do contribuinte. Os segundos, com o dinheiro do cliente. 

Assim, se para ter-se acesso às verbas publicitárias as agências contratam parentes de autoridades, valem-se de amizades pessoais, ou comprometem-se a trabalhar as imagens dos ministros, estarão recorrendo a expedientes comerciais legítimos. 

Se forem bem-sucedidos, louve-se o seu tino comercial. Mas quando a prática se torna ampla e disseminada é um sinal de que, no mínimo, o desrespeito para com o dinheiro público, por parte de seus gestores, chegou a níveis elevados. 

Isso, numa época em que a Nação inteira foi convocada a compartilhar os sacrifícios da Juta contra a inflação e a crise.

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Last Update: 10/03/2025