A histeria do ‘cancelamento’ é o equivalente ao lichamento

No fim de fevereiro (27), a Folha de S.Paulo publicou uma coluna de opinião do escritor Gustavo Nogy chamada “Os cancelados serão exaltados? ”. Nela, o autor faz uma série de considerações corretas sobre a política do “cancelamento”.

O “cancelamento” é uma das maiores ferramentas do identitarismo para a censura. Antes da idade contemporânea e do desenvolvimento do devido processo legal, era de prática comum o povo se tornar acusador, juiz e carrasco; arrastando suspeitos em praça pública, humilhando-os, torturando-os, matando-os e punindo-os por crimes – os quais muitas vezes não cometeram – para servir de exemplo à sociedade.

Baseando-se na moral daquele grupo ou sociedade, como assinala Nogy, pessoas eram escolhidas como vítimas a serem abatidas, as quais absorveriam a culpa e, ao mesmo tempo, redimiriam os culpados e serviriam de bode expiatório. Na Idade Média, a Igreja Católica era grande praticante destes atos, queimando mulheres na fogueira pela alegação de bruxaria e expurgar o desafeto social perante a incapacidade da instituição de desenvolver a sociedade.

Aos moldes da Inquisição Espanhola, o cancelamento é uma espécie de perseguição e linchamento em praça pública a partir da moral de um seleto grupo. O que no século XV era a Igreja Católica, no século XXI são os identitários, a serviço do imperialismo.

Atribuindo um valor superior à sua moral, os identitários perseguem, julgam e condenam pessoas que destoam da sua moralidade. Os cancelados se tornam páreas da sociedade, excluídos dos círculos sociais virtuais e reais e veem seus posicionamentos desqualificados pelo simples fato de terem sido cancelados. Como coloca Nogy:

O cancelado não tem garantias, não se submete a processos, não pode se valer de uma defesa constituída nem exigir uma acusação formal: quaisquer indícios, especulações, fofocas, anedotas ou memes servem e sobram”.

Pela política do cancelamento, a censura é feita sem necessitar de atores jurídicos (como o STF) ou capitalistas (como a Meta). Ao impor a sua moralidade, o identitarismo utiliza o “cancelamento” como uma forma de manipulação emocional para reprimir seus inimigos políticos e ideológicos. Temendo se tornarem excluídos da sociedade, os inimigos do imperialismo calam-se previamente. Sob a égide do imperialismo, a política identitária impõe a moralidade com o medo.

Nas campanhas do calendário litúrgico das redes sociais, o que está em causa é a garantia de que os carrascos serão vistos como inocentes, porque são eles que apontam os dedos e fazem descer a guilhotina. Na teatralização cotidiana do eu, é mais importante representar o papel do mocinho e decorar as falas do herói que entender o sentido da própria peça”, diz Nogy.

A histeria toma conta da política. Pela política do cancelamento, o indivíduo é censurado antes mesmo falar. O medo se torna uma arma contra o próprio pensamento. Sem expressar suas posições, os contrários os identitarismo se veem isolados e acuados. E, sem mesmo ataca-los, os inimigos ideológicos do imperialismo já são censurados.

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