Israel Luz e Everton André, de São Paulo

Na próxima sexta-feira, dia 31 de janeiro, será realizada a 6ª audiência do Massacre de Paraisópolis, como ficou conhecido o assassinato de nove jovens pela Polícia Militar de São Paulo em 1º de dezembro de 2019.

Em 2024, o Judiciário iniciou as audiências que podem levar a júri popular 12 dos 31 policiais envolvidos na operação que tirou a vida de Luara Victória de Oliveira, Bruno Gabriel dos Santos, Dennys Guilherme dos Santos Franco, Denys Henrique Quirino da Silva, Gustavo Cruz Xavier, Gabriel Rogério de Moraes, Mateus dos Santos Costa, Eduardo da Silva e Marcos Paulo Oliveira dos Santos.

O mais jovem tinha apenas 14 anos e o mais velho 23 naquele dezembro em que dezenas de policiais, supostamente em perseguição a suspeitos nunca encontrados, atacaram a multidão presente no baile da DZ7 na favela de Paraisópolis, Zona Sul da capital.

O Opinião conversou com Maria Cristina Quirino, mãe de Denys Henrique e uma das lideranças do coletivo Os 9 Que Perdemos, que reúne os familiares das vítimas. Leia e ajude a divulgar o protesto!

OS: Explique para nossos leitores e leitoras em que fase está o processo do Massacre de Paraisópolis.

Maria Cristina Quirino: A gente nem costuma dizer que o processo tá andando, né? Porque cinco anos é muito tempo. Desde julho do ano passado (2024) que começou esse trâmite judicial no Tribunal de Justiça… é tudo muito lento, devagar. Eu configuro como tortura (essa espera longa). A primeira fase foram os nossos depoimentos, das nossas testemunhas de defesa, dos familiares. E agora é a parte que eles vão apresentar a defesa deles, que já teve início com pessoas da hierarquia da polícia dando testemunhos a favor deles.

Na audiência em que vocês foram ouvidas, a defesa dos policiais perguntou repetidamente se vocês sabiam que os filhos de vocês usavam álcool, drogas e frequentavam o baile. Como você vê esse tipo de pergunta?

Eu vejo como uma tremenda covardia, uma tremenda falta de respeito. De todos os momentos que vivi, aquele foi o pior desde que meu filho foi assassinado. Eles tentam arrancar de nós coisas que diminuam, que culpabilizem nossos filhos, pra que eles consigam usar isso. Eles querem criminalizar nossos filhos pra depois justificar o injustificável. É uma artimanha macabra para inocentar os assassinos.

Em todas as audiências vocês organizam um protesto em frente ao Fórum Criminal da Barra Funda. Nesta 6ª não será diferente. Como estão pensando em fazer desta vez?

A partir de agora a gente vai tentar convocar a sociedade pra que se junte a nós. Eu tive meu filho morto e me levantei do luto à vida, pra lutar pela vida do próximo. Eu quero que as pessoas entendam que a nossa luta é pela vida. Os nossos filhos não voltam, o meu filho não vai voltar. Mas eu não quero que nenhuma outra mãe sinta ou viva o que a gente vive… Essa luta não pode ser só dos movimentos sociais… é pra sociedade. A gente vive um caos, um derramamento de sangue. E o Estado e os governantes não estão fazendo nada pra mudar essa realidade! Mais uma vez vamos pedir o fim da polícia, porque a gente vê que polícia não protege ninguém, vamos pedir a desmilitarização, a punição.

O Sistema é imundo, o Estado é conivente com toda essa podridão. Hoje conhecendo a história do nosso país, eu sei que isso já vem de muitos anos: é ditadura militar, é o tempo da escravidão, enfim… (a violência atual) é decorrência dos erros do passado que não são corrigidos. O Lula tem que fazer a vez dele. Ou então ele pra mim vai continuar sendo aquele cara que abriu a boca lá no Rio de Janeiro quando uma criança foi assassinada e falou que o policial tem que saber reconhecer o bandido…

Diferenciar bandido do morador da favela pra atirar…

Sim. O presidente da República falando isso, tá dando o aval pra se fazer isso. Existem formas e formas de fazer segurança e essa não é a correta. Não tem segurança pública: ela é direcionada para quem tem dinheiro. O resto de nós é tratado como lixo.

Com toda a repercussão do filme Ainda Estou Aqui, a imprensa noticiou que no atestado de óbito do Rubens Paiva vai passar a constar que ele teve uma morte violenta causada pelo Estado. Essa é uma reivindicação que os movimentos de mães têm. Hoje em dia o Estado mata e o registro muitas vezes também não aparece. Queria que falasse disso.

Essa reivindicação é minha também. Cinco anos que meu filho foi assassinado e até hoje não tenho o atestado com o porquê meu filho foi morto. Quando eu vi isso no filme me pegou. Tem que constar que meu filho foi morto na Operação Pancadão/Saturação, morto pela polícia em Paraisópolis. Atualmente, as mortes dos 9 não entram na estatística de mortes pela polícia, não entraram como violência policial. Num relatório do CAAF (Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Unifesp), constatamos que não há dados oficiais sobre a violência policial em bailes funk, por exemplo. Dois anos antes de Paraisópolis, uma operação pode estar relacionada com a morte de três pessoas e isso não foi registrado como mortes causada pela polícia. Tem muitos casos subnotificados.

Gostaria de fazer alguma consideração final?

O nosso ato é um chamado pra que sociedade entenda que a gente não pode ficar sozinho nessa luta. É muito doloroso pra nós mães saber que a gente não consegue barrar essa matança… Quando meu filho foi assassinado, a primeira coisa que eu acreditei é que nunca mais fosse acontecer. Mas depois disso a gente já viu muitos outros casos. E dói! É como se matassem meu filho mais uma vez, e mais uma vez, e mais uma vez… A gente precisa muito que a sociedade entenda: a polícia erra e erra muito. Pior ainda é o sistema proteger. As pessoas não podem mais entender que isso é segurança… o que a gente vive cotidianamente é insegurança pública.

Participe

O 6º protesto pelos 9 que perdemos acontecerá nesta sexta, dia 31 de janeiro, a partir das 10h, no Fórum Criminal da Barra Funda. Endereço: Av. Dr. Abraão Ribeiro, 313 – Barra Funda. Participe e divulgue esta luta!
Acesse
https://os9queperdemos.com.br/

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Last Update: 29/01/2025