A atriz, produtora, diretora e ativista Samantha Rodriguez, 49 anos, nasceu no Texas, filha de pais latino-americanos. Ela é mais conhecida por seu papel como Gabrielle Solis na série Donas de Casa Desesperadas, um hit da primeira década dos anos 2000.
Samantha tem uma instituição de caridade chamada Samantha’s Heroes (Os Heróis de Samantha), que apoia jovens adultos com deficiências de desenvolvimento, e uma fundação que pretende reduzir a lacuna educacional e a pobreza dos imigrantes latinos.
Neste momento, ela estrela a série de comédia e suspense Terra de Mulheres, da Apple TV+, vivendo uma socialite de Nova York em fuga para a cidade natal de sua mãe, na zona rural da Espanha.
The Observer: Terra de Mulheres é seu primeiro papel principal na tevê em quase uma década. O que a fez voltar?
Samantha Rodriguez: Eu estava dirigindo e precisava de algo especial para me tirar de trás das câmeras. Muita coisa na tevê é deprimente. É sempre o fim do mundo ou algum futuro distópico onde o governo entrou em colapso – e isso é perto demais da vida normal. Eu queria escapismo e diversão. Terra de Mulheres é uma adaptação do grande romance de uma autora desconhecida sobre três gerações de mulheres numa região vinícola espanhola. A narrativa feminina é muito importante. O fato de haver tantos latinos trabalhando nesse projeto também me deixa orgulhosa.
TO: Como foi mudar-se para a Catalunha?
SR: Filmamos no nordeste da Espanha, perto de Figueres, e foi deslumbrante. Aqueles lindos vinhedos que você vê no filme são reais. Fiquei numa pequena aldeia medieval chamada Peralada. Um galo me acordava todas as manhãs e eu caminhava até o único café da cidade. Passo o resto do meu tempo entre Los Angeles e a Cidade do México. Era uma delícia estar na natureza e em silêncio.
TO: Sua personagem, Gala, é uma especialista em vinhos. E você?
SR: Sempre digo que, se não fosse atriz, seria uma sommelière. Sou obcecada por uvas, regiões, barris e técnicas. Sou especialmente fascinada por vinhos da Europa. Sou muito parecida com Gala, no sentido de que nós duas somos esnobes do vinho.
TO: Sua mãe é interpretada por Carmen Maura, veterana dos filmes de Pedro Almodóvar. Você aprendeu muito com ela?
SR: Eu estava há um tempo entusiasmada e apavorada que Carmen fosse interpretar minha mãe. Ela é uma lenda, e foi muito intimidante fazer comédia com ela, porque não sou uma falante nativa de espanhol. Mas ela me apoiou muito. Toda vez que eu errava uma palavra, ela dizia: “Continue, é muito mais engraçado!”
TO: Sua filha, na série, é interpretada pela atriz trans adolescente Victoria Bazúa. Ela acrescentou uma dimensão própria ao papel?
SR: Ela trouxe uma perspectiva incrível. Encontramos Victoria em um vídeo de audições. Fiquei impressionada com sua alma antiga. Victoria tinha 16 anos durante as filmagens, e era seu primeiro trabalho como atriz, mas você jamais perceberia isso. Foi ótimo ter a opinião dela sobre os roteiros, porque queríamos fazer certo, não apenas para ela, mas para a sua comunidade.
TO: Donas de Casa Desesperadas mudou sua vida?
SR: Completamente. Foi um fenômeno. Quando estreou, o primeiro lugar fora dos Estados Unidos onde estive foi Londres. Cheguei ao hotel e tinha uma multidão na porta. Eu disse: “Quem está hospedado aqui? Será alguem famoso como Bono ou Madonna?” O motorista olhou para mim e disse: “Eles estão aqui por sua causa!” Fui para a China e as pessoas gritavam meu nome. E eu pensava: “Como eles sabem quem sou?” Eu não tinha ideia do alcance global da série. Passadas duas décadas, as pessoas ainda a estão descobrindo. Tematicamente, é atemporal.
“Muitas vezes, há uma percepção de que Hollywood está indo muito bem em relação à diversidade. E eu penso: ‘Hum, na verdade não!’”
TO: A diversidade em Hollywood melhorou ao longo da sua carreira?
SR: Ainda temos um longo caminho a percorrer. Tanto os latinos quanto as mulheres ainda estão severamente sub-representados. Nos Estados Unidos, os latinos são 20% da população, mas 5% na tevê e no cinema. No entanto, somos os maiores compradores de ingressos nos cinemas e uma das maiores audiências da tevê. Temos de trabalhar sobre essa disparidade entre quem consome o conteúdo e quem o cria. Muitas vezes, há uma percepção de que Hollywood é progressista e está indo muito bem em relação à diversidade. E eu penso: “Hum, na verdade não!”
TO: Costuma-se dizer que são raros os bons papéis para mulheres com mais de 40 anos. Você sente isso?
SR: É uma pena, como mulheres, termos uma data de validade, mas, pessoalmente, estou mais ocupada do que nunca. Lembro-me de conversar com Salma Hayek também, e ela disse: “Minha carreira decolou aos 50”. Meryl Streep diz que sua carreira começou aos 40. Acho que há muito mais oportunidades para mulheres de uma certa idade agora. Mulheres que têm mais a dizer e mais experiência vivida têm mais a oferecer.
TO: Você tem vários diplomas. É uma acadêmica frustrada?
SR: Sou. Eu poderia me ver na universidade, porque sou muito curiosa e há muita coisa que quero aprender. Sou uma leitora voraz de não ficção, trabalhos acadêmicos e estudos. Em um universo paralelo, eu não seria uma professora, mas apenas uma eterna estudante.
TO: Qual foi o último grande livro que você leu?
SR: From Generosity to Justice (Da Generosidade à Justiça), de Darren Walker, chefe da Fundação Ford. Minha própria instituição beneficente recebeu uma doação de Jeff Bezos, e o livro é sobre como essas instituições podem criar mudanças sustentáveis. Queremos nos inclinar na direção da justiça, não ficar presos a um ciclo de doações de dinheiro. A filantropia tem como objetivo segurar pessoas que caem pelas brechas. Quero fechar essas fendas e focar na mudança sistêmica. •
Tradução: Luiz Roberto M. Gonçalves.
Publicado na edição n° 1321 de CartaCapital, em 31 de julho de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘O estrelato engajado’