Com a morte do papa Francisco, uma série de matérias e artigos têm surgido na imprensa de esquerda. Em sua totalidade — quase se pode afirmar —, os textos tentam salvar a pele do papa ou, pelo menos, afirmar que se tratava de uma pessoa progressista, ainda que os fatos não o comprovem. Com esse espírito, a UP publicou em seu jornal A Verdade mais um texto, no dia 24 de abril, desta vez intitulado Papa Francisco defendeu a classe trabalhadora e denunciou genocídio na Palestina.

No olho da matéria, destaca-se que teria surpreendido ao afirmar, em entrevista ao La Repubblica, que “os comunistas pensam como os cristãos. Cristo falou de uma sociedade onde os pobres, os fracos e os excluídos sejam os que decidam”.

Deixando de lado a imprecisão da definição de comunismo, a UP deveria perguntar por que a Igreja – e mesmo o Papa – não defendem abertamente o comunismo. Se os comunistas pensam como os cristãos, também seria verdade que os cristãos pensam, ou deveriam pensar, como os comunistas.

O papa latino

No segundo parágrafo, o texto diz que “Jorge Mario Bergoglio, o primeiro papa latino-americano da história, faleceu deixando uma gestão considerada ‘reformista’ na Igreja Católica. Argentino, filho de trabalhadores, assumiu o papado em 2013 prometendo uma ‘Igreja pobre para os pobres’”. A menção ao fato de ter sido o primeiro papa latino-americano revela certo capachismo da esquerda, que vive sonhando com o “reconhecimento” de um Prêmio Nobel, um Oscar para algum brasileiro, uma mulher negra no STF etc. Há quem sonhe com um papa negro, assim como houve os que aplaudiram a eleição de um presidente negro nos Estados Unidos.

O fato de Bergoglio ter sido filho de trabalhadores também não significa muita coisa. Por exemplo, Barack Obama, o presidente negro ovacionado pela esquerda pequeno-burguesa, recebeu um Nobel da Paz após bombardear o Afeganistão e aumentar o efetivo de soldados naquele país. Além disso, foi seu governo que espionou Dilma Rousseff e tramou o golpe de 2016.

A defesa da Palestina

Lê-se no artigo que a última declaração pública do Papa “foi um apelo pelo cessar-fogo imediato em Gaza, denunciando os crimes cometidos pelo Estado de ‘Israel’ contra o povo palestino. Sua postura clara e firme em defesa da Palestina, ao lado de sua crítica permanente ao sistema econômico mundial, ‘uma economia que mata’”. Trata-se de uma visão fantasiosa.

Como a Igreja é ligada ao imperialismo, as declarações do papa estavam longe de realmente confrontar “Israel”. Tanto é que ele nunca deixou de criticar o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas, na sigla em árabe), o mesmo que criticar a resistência.

Logo após a operação Dilúvio de al-Aqsa, em 7 de outubro de 2023, o papa condenou o Hamas ao afirmar que “o terrorismo e a violência não levam à paz”. Uma declaração de que a violência dos palestinos não é legítima, que o povo palestino não deve reagir a quase um século de roubo de terras e genocídio. Algo que, inclusive, tem amparo nas leis internacionais, que garantem que todo povo ocupado tem o direito de lutar contra as forças de ocupação.

Na celebração da Páscoa, em sua última aparição pública, o papa Francisco disse que o Hamas deveria libertar os reféns israelenses. Deveria ter condenado, desde o início de seu pontificado, os milhares de prisioneiros palestinos que os sionistas mantêm em suas masmorras, onde os palestinos sofrem todo tipo de tortura, inclusive estupros.

O Papa também condenou o “crescente antissemitismo global”, enfatizando que “o terrorismo não se justifica com terrorismo” e que “a violência não pode ser combatida com mais violência”. A única defesa dos palestinos é justamente a violência; se não tivessem reagido desde sempre, já teriam sido expulsos de suas terras.

Política imperialista

Em determinado parágrafo, o texto diz:

“Em suas palavras e gestos, o papa Francisco se aproximou da Teologia da Libertação, da tradição de luta dos padres e freiras que enfrentaram ditaduras, e das comunidades cristãs que vivem a fé no combate à desigualdade social e ao fascismo. Como líder maior da Igreja Católica, denunciava as injustiças sociais, a destruição ambiental, o racismo e as guerras imperialistas.”

A denúncia de “destruição ambiental” nada mais é do que a política do imperialismo, que vem utilizando as tais “mudanças climáticas” para tentar impedir que os países pobres se industrializem ou que explorem seus recursos naturais — como o petróleo —, que precisa ficar no subsolo até que algum país imperialista possa explorá-lo diretamente.

Lutar contra o “racismo” é outra falácia. Além de ser um grande retrocesso que se instaurou na esquerda, no sentido de que esta abandonou suas bandeiras históricas para abraçar causas identitárias, o suposto combate ao racismo significa, na prática, a censura e a prisão de pessoas por crimes de opinião. Um apoio político à tentativa da burguesia de fechar cada vez mais o regime.

Outra falácia é sua suposta luta contra o “negacionismo”. As pessoas devem ter o direito de negar tudo o que bem entenderem. A campanha contra o “negacionismo” ganhou força durante a pandemia de covid-19. Desde então, a burguesia começou a fazer a campanha das chamadas “fake news“, censurando aqueles que questionassem a eficácia das vacinas.

Preocupação com a direitização

Fechando a matéria, a autora demonstra preocupação com o fato de que, com o novo conclave que se inicia, muitos cardeais queiram “retomar essa posição conservadora e reacionária da Igreja”. O texto diz que “mais importante do que esperar que venha um novo papa ‘progressista’ é ganhar trabalhadores e trabalhadoras católicos de todo o mundo para as pautas que Francisco defendia”.

Trata-se de um abandono completo das reivindicações históricas da classe operária. A esquerda precisa conquistar os trabalhadores com um programa revolucionário, comunista, e não com a ideologia oficial do imperialismo, o identitarismo.

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Last Update: 29/04/2025