A disputa pela alma evangélica e os desafios políticos de 2026. Por Luís Sabanay

Malafaia, com grande liderança entre evangélicos, é um dos principais aliados do bolsonarismo. Foto: reprodução

Por reverendo Luís Sabanay

As eleições de 2022 deixaram marcas profundas na alma do Brasil. O que se viu não foi apenas uma disputa eleitoral, mas uma batalha simbólica no interior das igrejas evangélicas, onde a fé foi instrumentalizada por discursos de medo e intolerância. Três anos depois, ainda vivemos os efeitos desse processo, mas também surgem sinais de reconstrução.

Essa disputa ultrapassa o campo eleitoral e alcança o modo como os evangélicos compreendem sua fé e sua presença no mundo. Parte do segmento foi influenciada por projetos políticos que utilizam símbolos religiosos para justificar exclusões. No entanto, há uma diversidade viva e crescente de evangélicos comprometidos com o Evangelho, a justiça e os direitos humanos.

A pesquisa Datafolha (2024) mostra esse movimento: entre os evangélicos de São Paulo, apenas 28% apoiam o armamento, 19% defendem a educação domiciliar e 53% rejeitam a criminalização das mulheres que abortam. Especialmente entre os jovens, há sinais de abertura a novas formas de testemunho cristão na esfera pública.

Foi nesse espírito que a Fundação Perseu Abramo lançou o curso “Fé e Democracia para Militância Evangélica Brasileira”. A formação tem reunido pessoas de todo o país, com aulas, debates e diálogos que buscam articular espiritualidade, cidadania e compromisso com a justiça social.

Lula recebe oração de evangélicos no Planalto. Foto: reprodução

Apesar disso, o impacto positivo foi imediato. A procura superou as expectativas e a participação de lideranças evangélicas de diferentes regiões reforçou que esse é apenas o início de um caminho mais amplo. Trata-se de um projeto de formação e articulação que visa fortalecer a presença evangélica na luta democrática com liberdade, consciência e fé.

Em vez de focar exclusivamente em demandas institucionais, é importante que as igrejas evangélicas reforcem seu papel histórico na promoção da vida, da dignidade e do bem comum. Projetos sociais, ações de solidariedade, educação popular e apoio às comunidades mais vulneráveis são expressões do Evangelho encarnado como testemunho e contrapartida.

Da mesma forma, é urgente superar o discurso de autoajuda econômica que coloca a culpa do desemprego no indivíduo. A precarização do trabalho, disfarçada de empreendedorismo, fragiliza milhões de brasileiros. É necessário afirmar um modelo que valorize o trabalho digno, os direitos sociais e a distribuição justa dos recursos.

A fé cristã também não pode se calar diante da violência. Em muitas regiões com forte presença evangélica, persistem altos índices de exclusão, agressão e racismo. O Evangelho, no entanto, não justifica condenações — ele anuncia reconciliação, paz e dignidade para todos.

Por isso, é hora de fortalecer a formação bíblica e cidadã das comunidades evangélicas, incentivando novas lideranças e articulando redes que atuem com liberdade religiosa e compromisso público, sem submissão a projetos de poder ou interferência externa.

O desafio de 2026 como marco político da valorização da cultura evangélica brasileira, da identidade de suas igrejas, do compromisso com a democracia e da responsabilidade política comprometida com a fé. O futuro da democracia passa pelo campo evangélico. E a disputa continua — com esperança viva e ativa.

Reverendo Luís Sabanay é teólogo, pastor presbiteriano e coordenador do Núcleo de Estudos sobre Religião da Fundação Perseu Abramo.

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