“Até aqui eu cheguei”, afirmou o ex-presidente do Uruguai Pepe Mujica, em comovida declaração de despedida nesta semana, ao anunciar que o câncer de esôfago, do qual foi diagnosticado em abril do ano passado, virou metástase, se espalhou pelo seu corpo.
A notícia foi dada por Mujica ao jornal uruguaio Búsqueda. Além do esôfago, o câncer se encontra no fígado e, segundo ele, já não é possível impedir a sua disseminação.
“O câncer no esôfago está se espalhando em meu fígado. Não consigo pará-lo com nada. Por quê? Porque sou idoso e tenho duas doenças crônicas. Não posso passar por nenhum tratamento bioquímico ou cirurgia, porque o meu corpo não aguenta”, relatou.
A doença do ex-presidente foi revelada em abril do ano passado. Em dezembro último, Mujica passou por uma cirurgia, e o líder progressista participou, inclusive, da campanha eleitoral do presidente Yamandú Orsi. Ao longo do último ano, ele passou por 32 sessões de radioterapia para o tumor.
Nas últimas semanas, contudo, o quadro clínico do ex-presidente do Uruguai piorou e, na entrevista concedida ao veículo nesta terça-feira (07) e divulgada nesta quinta (09), Pepe Mujica fez um apelo: “O que peço é que me deixem em paz, que não me peçam mais entrevistas nem nada”.
“Meu ciclo já terminou. Sinceramente, estou morrendo. E o guerreiro tem direito ao seu descanso”, disse. “Estou condenado, irmão. Até aqui eu cheguei.”
Na conversa com o jornalista, Mujica fez a sua despedida oficial. O GGN separou trechos de suas falas, CONFIRA:
O que quero é dizer adeus aos meus compatriotas. É fácil respeitar quem pensa como você, mas é preciso aprender que a base da democracia é o respeito por quem pensa diferente. Portanto, o primeiro grupo são os meus compatriotas e deles me despeço. Dou um abraço em todos vocês.
Em segundo lugar, despeço-me dos meus colegas, os simpatizantes e de todos os outros. Há mais de cinco anos que não pertenço a um órgão de direção. A realidade social e política do Uruguai não passa pela minha fazenda.
Agora… tenho minhas simpatias e quando posso dar uma mão, eu dou. Mas não sou um velho consultor, que eles têm que pedir a permissão. Não, pelo contrário. Os camaradas que dirigem o 609 [Movimiento de Participación Popular] são eles.
No final das contas sou um homem velho! É isso! Tudo que quero agora é dizer adeus.
A minha vida me deu muitas recompensas. Primeiro, é que faltam quatro meses para eu completar 90 anos. Veja a vida que eu tive. É um desastre.
]Me arrependo] de uma infinidade de coisas. Fui presidente e neste país há pessoas que passam fome. Não pode ser!
A vida é uma bela aventura e um milagre. Estamos muito concentrados na riqueza e não na felicidade. Estamos focados apenas em fazer as coisas e, quando você quiser acordar, sua vida já se passou.
Eu vivi a vida muito bem. Minha vida é meio que um romance. A Presidência é simplesmente um disparate, apenas mais um capítulo. Além disso, eu não tinha a intenção de ser presidente. Assim se deu o jogo.
Meus companheiros têm que entender que o tempo é inexorável e que chega um momento em que temos que abrir a porta para outras gerações, e não ficar atrapalhando. A minha única preocupação é que tenham uma atitude de renovação permanente, porque o que está por vir é muito diferente do que houve.
Para que as coisas permaneçam, é preciso mudar permanentemente. O que não alcança a sucessão morre, porque a morte se responde com a vida. O envelhecimento é respondido com a juventude.
Eu vou morrer aqui [nesta casa]. Há uma árvore sequóia grande lá fora. Manuela [a cadelinha do ex-presidente] está enterrada lá. Estou cuidando da papelada para que eles possam me enterrar lá também. E é isso.