Elon Musk está desapontado. O homem mais rico do mundo deixou a chefia do Departamento de Eficiência Governamental nos Estados Unidos, o Doge, braço do governo de Donald Trump voltado a aplicar uma radical política de corte de gastos. A saída não é uma surpresa – o prazo à frente do órgão tinha data para acabar –, mas o esgarçamento da relação entre o empresário e a Casa Branca chamou a atenção nos últimos meses.

“Fiquei decepcionado ao ver o enorme projeto de lei de gastos, francamente, que aumenta o déficit orçamentário (…) e prejudica o trabalho que a equipe do Doge está fazendo”, lamentou Musk em uma entrevista nesta semana à rede norte-americana CBS

Ele se refere a uma proposta já aprovada pela Câmara dos EUA que pode elevar gastos com segurança nas fronteiras e destinar créditos fiscais para energia limpa, entre outros pontos. Segundo estimativas do Legislativo, o projeto, que ainda precisa da sanção do Senado, pode aumentar o déficit do país em 3,8 trilhões de dólares até 2034. Trump é entusiasta da ideia.

O lamento de Musk precedeu uma saída discreta e obscura. Não houve qualquer cerimônia formal, de modo que foi o próprio auxiliar quem anunciou a mudança no X, sua rede social. 

Como ele foi designado “funcionário especial do governo”, não poderia trabalhar mais do que 130 dias no ano. O prazo expiraria na próxima sexta-feira 30.

A imprensa norte-americana diz que não houve uma conversa oficial entre Trump e o empresário a respeito da saída.

O saldo da gestão: cortes por todo lado, mas a sensação de que poderia ter feito mais

Musk cumpriu à risca o papel que Trump lhe destinou no Doge. Figura da primeira prateleira da gestão republicana nos primeiros três meses de governo, o empresário ligou a sua ‘motosserra’ – em alusão simbólica ao presidente argentino, Javier Milei, seu admirador –, desmantelando a parte de pessoal do governo.

O rol de demitidos tem funcionários em cargos-chave e trabalhadores de agências. As estimativas mais consolidadas da imprensa norte-americana mostram que pelo menos 260 mil funcionários federais foram dispensados ou estiveram sob risco de demissão nos primeiros cem dias do governo Trump. Outros milhares aceitaram ofertas de rescisão. 

Também coube a Musk cortar subsídios e programas federais, tensionando a já difícil relação da Casa Branca com o Judiciário. O Doge ainda forçou vários funcionários a voltarem aos escritórios, em uma gestão descrita por funcionários como caótica.

O órgão diz ter cortado mais de 175 bilhões de dólares em impostos até o início deste mês, mas o número é contestado por especialistas. Em geral, há poucos detalhes sobre o montante realmente poupado, já que a metodologia de explicação da pasta tem sido vaga.

Ainda assim, esse número representaria um percentual bem abaixo (8,5%) da meta traçada por Trump: a ideia inicial do governo era que o Doge pudesse cortar 2 trilhões de dólares do orçamento federal norte-americano. Diante da impossibilidade de executar tamanho reajuste, a Casa Branca passou a ser mais contida no seu objetivo: apenas 150 bilhões de dólares em cortes já estariam de bom tamanho.

Musk tinha ordem expressa para escarafunchar o Departamento de Educação. Sob a proteção de Trump, pretendia acessar dados de estudantes, inclusive números da Segurança Social e dados relativos a empréstimos. Coube à Justiça, em diversas oportunidades, frear o ímpeto do chefe do Doge. 

Mas nenhuma frustração foi tão grande quanto o desejo não cumprido de acessar dados sensíveis do Fisco norte-americano. A ideia era utilizar um sistema sensível do Internal Revenue Service, um serviço da Receita do governo. A agência está sob a alçada do Departamento do Tesouro, o que gerou um imbróglio interno na administração federal.

Esses reveses minaram o poder político de Musk, que também recebeu críticas por sua tentativa de influenciar eleições em países da Europa, como a Alemanha. Nos EUA, ele fez queixas públicas contra Scott Bessent, secretário do Tesouro, e Peter Navarro, a principal cabeça das super-tarifas aplicadas por Trump a outros países. Pouco a pouco, a postura do empresário fez o núcleo duro do governo republicano deixá-lo de lado.

Musk acredita ter passado “tempo demais” na política, como disse em entrevista nesta semana. Ele já havia reconhecido também que sua dedicação ao governo vinha causando prejuízos às suas atividades empresariais, especialmente na Tesla. Ainda assim, segundo ele, o Doge “só se fortalecerá com o tempo, tornando-se um modo de vida em todo o governo”. 

Sai o nome, fica a ideia

A saída de Musk do Doge passa longe de representar um passo do governo Trump em direção a uma postura comedida nos cortes de gastos.

Na semana que vem, a Casa Branca deve enviar um pacote de corte orçamentário ao Congresso. A informação foi confirmada na última quarta-feira 28 pelo diretor de Orçamento do governo, Russ Vought.

A ideia é que o pacote possa estimular cortes na casa dos 9,4 bilhões de dólares, tendo como alvo agências de ajuda externa, a National Public Radio (NPR) e a Public Broadcasting Service (PBS).

Mike Johnson, presidente da Câmara, já disse que a Casa está “ansiosa e pronta para agir de acordo com as conclusões do Doge”, com fins a “implementar ainda mais cortes no grande governo que o presidente Trump deseja e o povo americano exige”.

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Last Update: 29/05/2025