No artigo O mundo mudou. E nós?, publicado no portal de esquerda Brasil 247, o sociólogo petista Emir Sader questiona o motivo do governo estar sendo derrotado na “disputa da opinião pública”. “Por que estamos perdendo a disputa da opinião pública? Por que as pessoas não traduzem a melhoria das suas condições de vida em apoio ao governo, responsável por essa melhoria”, questiona Sader, como que atribuindo a impopularidade do governo Lula a fenômenos metafísicos. O acadêmico não se propõe a investigar a questão, mas só há duas hipóteses possíveis: ou o povo brasileiro é louco e vê na melhoria de suas condições de vida algo negativo, ou não há melhoria dos padrões de vida real, hipótese que, nem é preciso dizer, é muito mais lógica.
Entre a direita, é comum o uso da mentira escancarada para mitigar a crise produzida pela política voltada aos interesses da burguesia. Trata-se, finalmente, de uma classe social detentora dos monopólios de comunicação e da superestrutura em geral, o que permite a essa classe social colocar jornalistas, professores universitários e toda sorte de propagandistas capazes de influenciar a opinião pública a, se não adotar uma determinada posição, pelo menos se confundir o bastante para não organizar uma revolta. O que os sábios do PT como Sader e a esquerda pequeno-burguesa em geral estão descobrindo é que a direita pode, mas a esquerda não.
Falar que “as pessoas compram mais coisas, que as lojas estão cheias de gente comprando”, quando os salários estão submetidos a um arrocho (agora, por lei inclusive) e a carestia dispara não vai funcionar para um governo de esquerda, que tem no apoio popular sua fonte de sustentação. Toda a ala direita do PT pode falar loucuras do gênero à vontade; se o trabalhador encontra dificuldades crescentes para pagar sua cesta básica e o aluguel, não importam o que estatísticas manipuladas digam. A realidade irá se impor e aqueles que insistirem em dizer que as condições de vida do povo melhoraram só irão se desmoralizar.
Da mesma forma, caiu no folclore a afirmação de que “há quase pleno emprego no Brasil”, essa, uma mentira mais fácil de desmascarar quando se constata que apenas um terço da força de trabalho brasileira efetivamente tem um emprego com carteira assinada, enquanto todo o resto sobrevive de bicos. Se a intenção de Sader é colocar os trabalhadores contra o governo, é preciso reconhecer o bom trabalho que ele e a esquerda pequeno-burguesa vem fazendo para isso. Assim como quando escreve absurdos como o parágrafo abaixo:
“O PT arca com a ofensiva contra a política e o governo, mesmo colocando em prática uma política distinta no seu conteúdo. Não promove o neoliberalismo. Ao contrário, o combate frontalmente. Enfrenta a mercantilização das relações sociais, inclusive do Estado e da política. Resta ainda quebrar a coluna vertebral do neoliberalismo – a hegemonia do capital financeiro especulativo na economia.”
Se, nas colocações anteriores, Sader atua para indispor os trabalhadores contra o governo que diz defender, aqui, o acadêmico mira no setor mais avançado da pequena burguesia, informado o bastante para reconhecer a completa loucura de se afirmar que o governo “combate frontalmente o neoliberalismo” poucos meses após o anúncio do Pacote Haddad, com duros cortes nas despesas sociais, teto para reajuste do salário mínimo e em paralelo ao aumento expressivo dos juros que arrocham ainda mais a debilitada economia brasileira. Para o refestelo dos banqueiros.
Ora, nada mais efetivo para desmoralizar o governo do que dar repetidas demonstrações de que se está tentando enganá-lo. Nesse caso, sem dispor do apoio dos monopólios de imprensa que falam a toda hora para um público que se conta na casa das muitas dezenas de milhões, sem o menor controle da estrutura estatal que permitirá desmentir os propagandistas, é até risível a tentativa da direita petista de enganar as pessoas e jogar para o éter a responsabilidade por uma crise que é da política defendida por esses setores, fundamentalmente, da frente ampla. Mas Sader continua:
“Essas questões requerem a formação de um grupo de análise que produza enfoques mensais sobre o Brasil e sobre o mundo, para abastecer a militância e todo o campo democrático e popular.”
Não precisa nada disso. Basta, em primeiro lugar, reconhecer que o dito “campo democrático”, isto é, a frente ampla, é exatamente a razão primeira da crise, responsável pelo impasse de um governo cada dia mais parecido com o fracassado Alberto Fernández, ex-presidente da Argentina, que, sem conseguir ir muito para a direita pela presença da ala esquerda do peronismo, nem ir muito à esquerda devido à força da direita no seu governo, terminou sem conseguir ir a canto algum, o que preparou o caminho para uma derrota histórica do kirchnerismo e a ascensão de Javier Milei. O mesmo fenômeno está acontecendo no Brasil hoje.
O que Sader e a direita petista chamam de “campo democrático” impede o governo de adotar uma política econômica voltada aos interesses dos trabalhadores, que traga empregos e salários de verdade, e não as manipulações estatísticas francamente toscas para enganar tolos. “Campo democrático” é o senhor Fernando Haddad que, sem nenhum pudor, disse não precisar ser convencido da necessidade de uma política neoliberal radical. São os cúmplices de Haddad, Gabriel Galípolo (Banco Central), Simone Tebet (Planejamento) e Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), que compõem a criminosa equipe econômica, dedicada a emperrar o programa nacionalista de Lula.
É também Marina Silva, notória inimiga do País e serviçal das ONGs, dedicada a bloquear as tentativas do presidente Lula de explorar o petróleo na Margem Equatorial e impulsionar o desenvolvimento brasileiro. E, ao defender toda essa corja, também o próprio Sader, que, pelo posicionamento explicitado, deixa claro que não está, de fato, interessado em superar a crise de popularidade do governo Lula, muito pelo contrário. Ao defender a intromissão golpista da direita no interior da esquerda sob o véu do “campo democrático”, o acadêmico praticamente declara seu apoio à sabotagem contra o governo Lula e contra o País.