Carlos Eduardo Zúñiga preso poucas horas após a tentativa de golpe. Foto: Claudia Morales/Reuters

Por Joallan Rocha, professor de sociologia do Instituto Federal da Bahia (IFBA)

A Bolívia voltou a ocupar as principais páginas da imprensa mundial no dia 26 de junho. Um grupo de militares, sob a condução do comandante do exército, Carlos Eduardo Zúñiga, promoveu uma tentativa de golpe contra o governo de Luís Arce. Zúñiga havia sido destituído do cargo na noite anterior por suas fortes declarações contra o ex-presidente Evo Morales, a quem acusou de mentiroso e provocador. A ingerência política do comandante do exército gerou um profundo mal-estar no governo e a reação de diferentes setores sociais.

O Grupo de Puebla, do qual faz parte o ex-presidente Evo Morales, emitiu um comunicado demonstrando sua preocupação “[…] frente a las declaraciones del Comandante General del Ejército de Bolivia, Gral. Div. Carlos Eduardo Zúñiga, quien públicamente ha puesto de manifiesto su intención de detener e impedir una posible candidatura de Evo Morales en las próximas elecciones presidenciales del 2025 […] resulta inadmisible que quien conduce el ejército boliviano ameace con alzarse en armas para impedir que un ciudadano se postule para presidir el país”. Diante da crise, o governo decidiu afastar o comandante do exército, que, em um claro gesto de insubordinação, ocupou e cercou a Praça Murillo, onde se encontra o Palácio Presidencial. No estilo dos golpes militares que ocorreram na América Latina nos anos 60 e 70, um tanque militar derrubou a porta principal do Palácio, onde se encontrava o presidente e todo o gabinete ministerial.

Ainda não sabemos ao certo as reais motivações e objetivos de Zúñiga e dos militares golpistas. Aparentemente, a ação não contou com o apoio e o respaldo do conjunto da Forças Armadas e do alto mando da polícia militar. O isolamento da aventura golpista ficou evidente quando o presidente nomeou os novos comandantes das Forças Armadas (Exército, Aeronáutica e Armada). O golpe também não contou com o apoio de nenhuma base social e política. As principais lideranças da oposição e da direita boliviana imediatamente repudiaram o golpe, bem como os governadores e prefeitos das principais cidades se colocaram contra o levante militar. A comunidade internacional e a OEA emitiram duros comunicados instando as Forças Armadas a respeitar a democracia.

Militares em frente ao Palácio Queimado, na Bolívia. Foto: Reuters

A deterioração econômica e institucional do país.

Apesar de uma ação isolada e aventureira de um setor da Forças Armadas, o que ocorreu na Bolívia é um sintoma da rápida deterioração institucional do país e da crescente fragilidade do governo. No centro da atual crise política e da tentativa de golpe se encontra as disputas no MAS em torno a duas frações: “Evistas” e “Arcistas”. A divisão no interior do partido tem gerado uma semiparalisia do governo e das instituições.

O governo perdeu a maioria no congresso nacional que atualmente é controlado pelo setor evista em aliança com a direita tradicional. A fração do MAS que se organiza em torno à Evo Morales tornou-se a principal oposição ao governo e tem atuado para desgastar a imagem do presidente Luís Arce e impedir sua candidatura à reeleição em 2025. Tudo isso em um contexto de agravamento da situação econômica ocasionada pela crescente escassez de diesel e dólares no país.

A aventura golpista ocorreu nesse contexto e expressa a busca de um setor das Forças Armadas de apresentar uma saída autoritária para a crescente deterioração econômica e institucional do país. Diante do impasse e da incapacidade de ambas as frações do MAS e da direita tradicional de apresentar uma alternativa, o exército busca posicionar-se como o garante da estabilidade e da ordem, como ocorreu nos golpes militares de 1964, 1971 e 1980 no país.

As declarações de Zúñiga ao ser preso, de que tudo não passou de um “autogolpe” promovido pelo governo para recuperar sua popularidade tem sido utilizada pela direita e a fração Evista para acusar o governo de promover um teatro político com o objetivo de “ocultar a real situação econômica do país”. A prisão dos principais dirigentes do golpe e a imediata reação popular na cidade de La Paz e El Alto permitiu um aparente fortalecimento do governo de Luís Arce.

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Última Atualização: 01/07/2024