Em nova investida digital, Trump acusa a China de violar trégua tarifária e reacende clima de confronto entre as duas maiores potências econômicas do planeta


A frágil trégua na guerra comercial entre Estados Unidos e China parece ter chegado a um fim abrupto, pelo menos na avaliação do presidente Donald Trump. Em uma manifestação contundente e característica em sua plataforma Truth Social, Trump lançou uma ofensiva verbal contra Pequim, alegando que a nação asiática teria “totalmente violado” um pacto comercial emergencial selado há meras duas semanas em Genebra. A declaração reacende as chamas de um conflito que tem abalado as duas maiores economias do planeta, após um breve interlúdio de negociações tensas que produziram avanços modestos.

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O mandatário não poupou palavras para expressar sua frustração, pintando um quadro de traição unilateral por parte da China. “Fiz um ACORDO RÁPIDO com a China para salvá-los do que eu pensei que seria uma situação muito ruim, e eu não queria ver isso acontecer”, escreveu Trump na sexta-feira, em um tom que mescla autocomiseração com ameaça velada. “A China, talvez sem surpresa para alguns, TOTALMENTE VIOLÓU SEU ACORDO CONOSCO. Tanto para ser o cara legal!”, concluiu, sinalizando sua disposição para abandonar a diplomacia e retornar a uma postura de confronto direto.

O entendimento em questão, firmado em solo suíço, previa uma desescalada temporária nas tarifas retaliatórias que ambos os países vinham impondo um ao outro, as quais já haviam atingido o patamar alarmante de 145% sobre determinados produtos.

Segundo o Financial Times, pelo acordo, os Estados Unidos se comprometiam a reduzir suas taxas para 30%, enquanto a China aliviaria suas sobretaxas para 10%. Um componente crucial do pacto era o compromisso de Pequim de “suspender ou cancelar” uma série de medidas não tarifárias que vinham afetando empresas americanas, embora os detalhes e o cronograma para tal desmonte nunca tenham sido claramente explicitados pelo governo chinês.

A insatisfação americana não se limita às palavras do presidente. O representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, em declarações posteriores, especificou que a China tem demonstrado uma lentidão preocupante na remoção das barreiras não tarifárias. Entre as medidas mais sensíveis estão a proibição de exportações de ímãs de terras raras – componentes vitais para a indústria de alta tecnologia, incluindo veículos elétricos, turbinas eólicas e eletrônicos avançados – e a manutenção de listas negras que restringem a atuação de companhias norte-americanas no mercado chinês.

“Quando eles concordaram em Genebra em remover suas tarifas e contramedidas, removeram as tarifas assim como fizemos, mas em algumas contramedidas eles estão demorando”, declarou Greer em entrevista à rede de televisão CNBC. O representante comercial foi enfático ao apontar a falta de progresso em áreas críticas: “Não vimos o fluxo de alguns desses minerais críticos como deveria estar acontecendo.”

Enquanto a retórica se acirra, a própria capacidade de Trump de impor tarifas de forma ampla e unilateral enfrenta questionamentos legais em casa. Recentemente, uma corte comercial dos Estados Unidos proferiu uma decisão indicando que o então presidente não possuía autoridade legal para aplicar certos impostos retaliatórios. Contudo, essa determinação foi temporariamente suspensa por uma instância superior, permitindo que o governo recorra, mas adicionando uma camada de incerteza jurídica sobre futuras ações protecionistas.

Em meio ao impasse crescente, o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, reconheceu publicamente que as conversas comerciais com a China estão, no momento, “um pouco paralisadas”. Buscando uma forma de destravar o diálogo, Bessent sugeriu que uma comunicação direta entre Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, poderia ser o catalisador necessário para reativar as negociações.

“Acredito que teremos mais conversas nas próximas semanas e acredito que em algum momento possa haver uma ligação entre o presidente e o presidente Xi”, afirmou Bessent em entrevista à Fox News. Ele ressaltou a importância do envolvimento direto dos líderes máximos: “Dada a magnitude dessas discussões… isso exigirá que ambos os líderes compartilhem suas preferências diretamente.”

Do lado chinês, no entanto, a resposta tem sido de cautela e silêncio calculado. O Ministério das Relações Exteriores da China optou por não comentar diretamente as declarações de Bessent. Anteriormente, após a conclusão do acordo de Genebra, o Ministério do Comércio chinês havia emitido um comunicado mencionando a intenção de estabelecer um “mecanismo de consulta econômica e comercial entre China e EUA”. Este fórum previa reuniões regulares, alternando as sedes entre os dois países ou ocorrendo em localidades neutras, mutuamente acordadas.

Apesar dessa sinalização inicial de um canal de diálogo estruturado, poucas informações concretas sobre o funcionamento ou os progressos desse mecanismo foram divulgadas publicamente por qualquer uma das partes desde então. Paralelamente, a administração Trump continuou a impor novas restrições ao acesso e uso de tecnologia americana por empresas chinesas, mantendo a pressão sobre setores estratégicos da economia chinesa.

Nos veículos de comunicação estatais da China, vozes influentes ligadas ao Partido Comunista têm soado um alerta para a população e para o establishment político sobre a necessidade de resiliência e preparo para um período de atrito contínuo com os Estados Unidos. Huo Jianguo, uma figura respeitada e vice-presidente da Sociedade Chinesa de Estudos da Organização Mundial do Comércio (OMC), publicou um artigo analítico no portal China Economic Net, um veículo afiliado ao partido. Em sua análise, Huo Jianguo delineou a perspectiva chinesa:

“Diante da natureza longa e complexa da luta com os EUA, devemos estar plenamente preparados para negociações, mas também prontos para um confronto prolongado.” Esta declaração reflete uma visão estratégica de que as tensões comerciais são parte de uma rivalidade mais ampla e duradoura, exigindo uma postura que combine disposição para o diálogo com firmeza para resistir a pressões externas.

A recente escalada nas declarações de Donald Trump demonstra inequivocamente que a guerra comercial entre Estados Unidos e China está longe de uma resolução definitiva. Pelo contrário, continua a ser uma carta poderosa no baralho político do ex-presidente republicano, especialmente em um contexto de movimentações eleitorais.

Enquanto Washington profere acusações, por vezes genéricas, e se esforça para manter a pressão sobre Pequim, especialistas em comércio internacional apontam que a ausência de transparência e de um compromisso genuíno com a reciprocidade nos termos dos acordos firmados dificulta a construção de qualquer solução sustentável e duradoura.

Observa-se, em contrapartida, que a China parece adotar uma estratégia mais defensiva e calculista, focada em ganhar tempo para fortalecer sua indústria doméstica, fomentar a inovação tecnológica interna e, crucialmente, reduzir sua dependência de tecnologias e mercados norte-americanos.

Com a figura de Trump novamente emergindo com destaque no cenário eleitoral americano, analistas expressam o temor de que a instabilidade comercial e as tensões geopolíticas continuem a ser utilizadas como moeda de troca em um jogo político cada vez mais globalizado, polarizado e imprevisível, cujas consequências se estendem muito além das fronteiras das duas superpotências.

Com informações de Financial Times*

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Last Update: 01/06/2025