“Bem-vindo a Wes Anderson” é uma frase-piada que viralizou na internet há alguns anos tanto como deboche quanto como exaltação ao cinema do diretor norte-americano. Anderson, tornado uma grife autoral, estreia nos cinemas na quinta-feira 29 com O Esquema Fenício. Para o mal ou para o bem, o chiste vai continuar.
O filme, primeiro concorrente à Palma de Ouro do 78o Festival de Cannes a chegar ao circuito, é uma depuração aprofundada de seus cacoetes mais conhecidos. Desta vez, ele insere, em suas típicas tramas familiares, comentários sobre a geopolítica contemporânea.
Benicio Del Toro interpreta o milionário Zsa-zsa Korda, vítima de constantes atentados por conta da maneira pouco honesta de acumular dinheiro. Depois de um ataque aéreo que quase o mata pela sexta vez, ele decide reaproximar-se da única filha para lhe transmitir sua herança e legado. Só que Liesl, vivida por Mia Threapleton, está em vias de se ordenar freira e abriu mão de bens materiais e de qualquer ambição de fortuna.
O arco dramático de O Esquema Fenício equilibra-se entre as tentativas de Korda de viabilizar um último golpe e as constantes reaproximações com Liesl, o que mantém o filme entre a crítica econômica mordaz e o melodrama familiar de humor sombrio.
Ao longo da jornada da dupla, aparecem, em participações curtas, às vezes pouco expressivas, nomes grandes do cinema, como Tom Hanks, Bryan Cranston, Bill Murray, Mathieu Amalric, Scarlett Johansson e Benedict Cumberbatch. Ao fim, fica a sensação de serem todos bibelôs de luxo numa estrutura não exatamente necessitada deles.
A ternura de filmes anteriores de Anderson, especialmente os recentes Asteroid City (2023) e A Crônica Francesa (2020), cede espaço, desta vez, para o cinismo e o sarcasmo. O cineasta, também roteirista do longa-metragem, ao lado do parceiro Roman Coppola, é bom nos diálogos e na idealização de cenas de exuberância formal. A extravagância de cenários e cores e a frontalidade dos planos dão o ar de distanciamento teatral propício ao tipo de farsa proposta por ele.
O Esquema Fenício está, porém, impregnado de uma discursividade moral (mas não moralista) que, muitas vezes, mais aborrece do que estimula o espectador – seja a pensar, seja a rir.
Anderson parece esbarrar no risco corrido por qualquer artista que se torna uma marca: ser condescendente demais consigo mesmo. Seu estilo acaba, aqui, por virar uma prisão criativa e fazer de sua assinatura uma armadura estética. •
Publicado na edição n° 1364 de CartaCapital, em 04 de junho de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Quando o estilo se torna armadura’