O debate em torno das mudanças propostas no projeto de lei complementar (PLP 112/2021), que cria o novo Código Eleitoral, é uma das agendas mais importantes para as mulheres que atuam na política. 

Em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o texto quer alterar a legislação que exige que 30% das candidaturas sejam ocupadas por mulheres. Relatada pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), a proposta defende a reserva de 20% das vagas nos parlamentos federais, estaduais e municipais para as mulheres, e representa grave ameaça à participação das mulheres na política. 

O PLP 112/2021 teve seu texto aprovado na Câmara dos Deputados em 2021, e tramita no Senado Federal desde então. A votação foi adiada mais uma vez ontem (28), após pedido de vista na CCJ do Senado, revela a Agência Brasil

Para a senadora Augusta Brito (PT-CE) a proposta como está representando um retrocesso para as mulheres: “A cota de 30% de candidaturas é um direito do qual não vamos abrir mão e, se necessário, vamos recorrer ao Poder Judiciário para garantir que isso aconteça. A fórmula proposta pelo Senador Marcelo Castro impedir essa ação afirmativa, e debilita a constante e paulatina entrada de mulheres na política brasileira. A reserva de cadeiras é importante, mas isoladamente, sem as cotas de candidatura ela pode o aumento da representação feminina na política Em função disso, apresentoui emendas à proposta para corrigir esse erro mantendo as cotas de candidaturas”, contextualizou.

A senadora Teresa Leitão (PT-PE) alertou que a mudança pode interferir também no ritmo das propagandas na TV e no rádio. “Os 30% já são uma coisa consagrada que, para nós, é um início de conversa. Temos que estimular as mulheres a terem maior participação na política.” Ela ainda reforçou a falácia de que alguns usados ​​têm que as mulheres não gostam e não querem atuar na política. 

“Quero destacar uma indicação que é falsa, mas que vem sendo usada com muita insistência, de que as mulheres não estão na política porque elas não gostam de política. Essa é uma tese que não convence. É difícil a mulher estar na política, porque a estruturação da sociedade deixou esse espaço público muito na mão dos homens. Pode-se observar que, para eles, é natural a disputa. As mulheres precisam cumprir outro ritual, inclusive de vencer a discriminação”, alertou o senador.

Para a secretária nacional de Mulheres do PT, Anne Moura, a medida, se aprovada, será um retrocesso para a política brasileira bem como para a democracia. Ela defende que a pauta deve estar na agenda de todas as companheiras do PT. 

“A gente tem que ficar alerta com essa tramitação que ocorre lá no Senado. Mas as nossas senadoras realizadas têm um trabalho muito importante de defesa de nossa pauta. Essa mudança representa um grande perigo, pois pode dificultar ainda mais o que já é difícil para nós, que é o acesso aos espaços de poder, especialmente para as mulheres negras e indígenas”, alerta Anne. 

Em março, a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, por meio do Observatório Nacional da Mulher na Política (ONMP), realizou o webinário “Cotas de Gênero no Novo Código Eleitoral: Entendendo o modelo proposto no PLP 112/2021”. Na ocasião, a coordenadora do Observatório, Ana Cláudia, afirmou que para haver um aperfeiçoamento do novo código, deveria ser mantida a obrigatoriedade dos 30% das nomeações.

“A retirada desse mínimo percentual faria com que os partidos alocassem cada vez menos mulheres nas candidaturas, que já é um problema que eles têm. E isso, na verdade, agiria de forma a investir nas duas políticas que a gente tem hoje no Brasil, que é tanto a de financiamento, como a obrigatoriedade do assento que está sendo proposto. Então, se você tem cada vez menos mulheres, você reduz cada vez menos a oferta de mulheres candidatas”, explicou.

A mudança pode aprofundar desigualdades raciais e de gênero na política 

Análise da Oxfam Brasil manifesta preocupação com o projeto, pois o novo Código Eleitoral pode aprofundar a política de sub-representação de mulheres negras e comprometer a fiscalização do uso do fundo partidário.” Atualmente, a legislação exige que 30% das candidaturas sejam ocupadas por mulheres, um mecanismo considerado mínimo para garantir a participação feminina na política. 

“Estamos diante de uma proposta que converte um piso de candidaturas, e que representa uma conquista recente, em um teto possível, o que é inaceitável. Ao invés de avançar, estamos regredindo décadas na representação política das mulheres, em especial das mulheres negras que já enfrentam barreiras estruturais para acesso a espaços de poder”, afirma Bárbara Barboza, coordenadora de Justiça Racial e de Gênero da Oxfam Brasil. 

A Oxfam Brasil lembra ainda que as mulheres negras ocupam menos de 3% das cadeiras na Câmara dos Deputados, apesar de representarem 28% da população brasileira. “Estamos falando de uma reforma que cristaliza desigualdades em vez de combatê-las. É inaceitável que, em 2025, ainda precisaremos lutar por espaços mínimos de representação. O ideal é lutarmos por paridade nas cadeiras, é isso que fortalecerá a democracia nesse país”, conclui Barboza. 

O foco deve ser a paridade

A edição 2025  do mapa “Mulheres na política: 2025” mostra que os homens continuam a superar as mulheres em mais de três vezes nas posições executivas e legislativas em todo o mundo. 

O levantamento feito pela ONU Mulheres revela que o Brasil segue a tendência dos últimos anos e continua mal posicionado: o país ocupa a 133ª posição no ranking global de representação parlamentar de mulheres e a 53ª posição no ranking de representação ministerial.

Realizado anualmente, o Mapa Mulheres na Política revela que, apesar de as Américas apresentarem a maior proporção de mulheres parlamentares no mundo (35,4%), o Brasil tem índices muito abaixo da média do continente. 

“Apenas 18,1% da Câmara dos Deputados é composta por mulheres, ou seja, 93 parlamentares. No Senado, elas são 19,8%, somando apenas 16 mulheres. Esses números colocam o país entre os desempenhos globais nesse quesito.”, diz a ONU Mulheres. 

Por isso, a senadora pernambucana defende que o verdadeiro debate sobre cotas deve mirar na paridade, tal como já foi feito no México. Na sua avaliação, somente com esta estratégia é que o Brasil conseguirá superar a triste média da baixíssima representação feminina na política: “A Venezuela, a nossa vizinha, tem 32% de mulheres na política. Portanto, o que está propondo no projeto de 20% é um aumento muito residual. É melhor garantir a presença dos 30%. É melhor a gente trabalhar o horizonte da paridade.”

Da Redação do Elas por Elas, com informações da Agência Brasil e Oxfam Brasil 

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Last Update: 29/05/2025