
No Senado Federal, uma proposta de reforma do Código Civil foi protocolada em janeiro e deve tramitar em comissão especial. A medida, elaborada por uma comissão de juristas, altera significativamente o direito real de laje e pode permitir a aquisição por usucapião de imóveis construídos sobre casas de terceiros.
Hoje, pela legislação vigente, quem ergue uma residência sobre a laje de outra construção tem direito de uso, mas não a propriedade do imóvel. A nova proposta muda isso ao reconhecer a laje como um terreno autônomo, possibilitando a transferência da posse por venda, herança e, principalmente, usucapião.
A usucapião seria válida desde que o imóvel na laje tenha saída independente para via pública e identificação numérica ou alfabética. A ideia é garantir que construções sobrepostas possam ser reconhecidas legalmente como unidades distintas e aptas à regularização, mesmo quando construídas em áreas já ocupadas.
O texto busca adaptar o Código Civil à realidade urbana do país, onde muitas famílias constroem moradias em lajes de imóveis pertencentes a parentes. O advogado Davi Ory, especialista em direito imobiliário pela Universidade de Brasília, afirmou ao portal UOL que, a classe média será a principal beneficiada, pois já possui a documentação do imóvel-base em ordem.

O direito real de laje foi incluído na legislação em 2017, mas ainda gera interpretações divergentes nos tribunais. Algumas decisões reconhecem a possibilidade de usucapião, enquanto outras negam o direito por ausência de previsão legal. Com a proposta, a discussão tende a se pacificar, embora ainda dependa da regularização do imóvel original.
Há casos como o de Bruno, motoboy da zona norte de São Paulo, que ilustra a insegurança atual. Ele construiu sua casa sobre a laje do irmão, em terreno herdado da mãe. Após a separação, sua ex-companheira e filhas permaneceram no local. Bruno teme perder o imóvel, que ainda não possui documentação própria, mas a proposta pode mudar esse cenário.
Apesar de viver atualmente em Osasco, Bruno deseja voltar à antiga residência, onde vive sua família. Ele afirma que cedeu a posse temporariamente por causa das filhas. Com a nova lei, sua ex-companheira poderia reivindicar o imóvel por usucapião, pois já reside no local há mais de cinco anos.
A reforma do Código Civil propõe a alteração de mais da metade de seus artigos. Entre as novidades, está ainda a guarda compartilhada de animais de estimação em casos de separação. O projeto, liderado pelo ministro Luís Felipe Salomão e protocolado por Rodrigo Pacheco, ainda não tem previsão para início da tramitação, mas promete gerar debates relevantes no Congresso.