O Brasil tem uma longa e conturbada trajetória na busca pela autonomia em energia nuclear. Desde os anos 1950, quando o almirante Álvaro Alberto idealizou um projeto nacional robusto, até o acordo com a Alemanha em 1975 e os obstáculos políticos e internacionais que se seguiram, o país oscilou entre ambição tecnológica e dependência estratégica.

Em entrevista ao programa Nova Economia, o professor João Paulo Nicolini, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), analisou a evolução do programa nuclear brasileiro sob a ótica de sua pesquisa premiada pela Capes. Segundo ele, ao contrário da narrativa oficial que atribui o enfraquecimento do programa exclusivamente aos governos liberais pós-ditadura, a raiz do problema é mais profunda.

“Desde o início, o Brasil teve dificuldade em construir uma política de longo prazo para ciência e tecnologia. As elites não viam a área como prioridade e faltou um pacto nacional de interesse pelo desenvolvimento nuclear”, afirmou Nicolini.

O Acordo com a Alemanha: uma promessa não cumprida

Durante o regime militar, o Brasil assinou com a Alemanha Ocidental o chamado “acordo do século”, que previa transferência de tecnologia para domínio do ciclo completo do enriquecimento de urânio. A motivação foi, entre outras, a crise do petróleo nos anos 1970, que incentivou o país a buscar fontes alternativas de energia.

O plano, no entanto, enfrentou resistência internacional. Estados Unidos, preocupados com a proliferação nuclear e com a concorrência tecnológica, pressionaram seus aliados europeus — como Inglaterra e Holanda — a não repassarem tecnologia de ultracentrifugação ao Brasil. Em seu lugar, os alemães ofereceram o sistema jet nozzle, que se mostrou ineficiente e acabou abandonado.

“A tecnologia que nos venderam acabou sendo usada apenas pelo regime do apartheid na África do Sul. Quando os alemães desistiram do projeto, nós fomos obrigados a descontinuar o investimento”, explicou Nicolini.

Desconexão com a academia e militarização do programa

Outro fator central apontado pelo professor foi a exclusão da academia brasileira do processo. À época, cientistas eram perseguidos pelo regime e suas contribuições marginalizadas. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que inicialmente apoiou o desenvolvimento nuclear, tornou-se crítica do acordo por seu caráter fechado e excludente.

“A academia não era vista como parceira. O governo Geisel, por exemplo, dizia que os cientistas ‘viajavam e voltavam de mãos abanando’”, citou Nicolini.

O controle absoluto do projeto por militares e diplomatas impediu a formação de um Sistema Nacional de Inovação voltado ao setor nuclear, diferentemente de áreas como o agronegócio, que contaram com iniciativas como a Embrapa, ou o setor aeronáutico, que teve no ITA e na Embraer um modelo de sucesso.

Caminho curto e visão de status

Para Nicolini, a decisão de buscar soluções rápidas, comprando pacotes tecnológicos prontos, reflete uma característica histórica da industrialização brasileira — um “atalho desenvolvimentista”. Isso foi visto em setores como automobilístico, telecomunicações e até no padrão de TV em cores.

“A escolha pelo nuclear foi motivada também por status. Dominar essa tecnologia conferia prestígio internacional, uma ambição das potências emergentes na Guerra Fria”, analisa.

Um novo ciclo?

Nos últimos anos, há sinais de retomada do interesse pelo setor nuclear. O governo federal tem demonstrado preocupação com a dependência de insumos estrangeiros para tratamentos médicos e busca reativar estruturas como o reator multipropósito em Aramar, em Sorocaba (SP).

Ainda assim, Nicolini destaca que o desafio permanece: sem um pacto nacional que envolva Estado, iniciativa privada e academia, o país continuará refém de decisões improvisadas e programas descontinuados.

Assista ao programa na íntegra em:

Nota da redação: Este texto, especificamente, foi desenvolvido parcialmente com auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial na transcrição e resumo das entrevistas. A equipe de jornalistas do Jornal GGN segue responsável pelas pautas, produção, apuração, entrevistas e revisão de conteúdo publicado, para garantir a curadoria, lisura e veracidade das informações.

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Last Update: 24/05/2025