O ex-comandante da Aeronáutica Carlos Almeida Baptista Júnior afirmou, em depoimento ao Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira 21, ainda ser alvo de ataques nas redes sociais por não ter endossado uma tentativa de golpe de Estado em 2022.
“Até hoje existem perfis no Twitter que colocam todo dia de manhã ataques a mim e a mais meia dúzia de generais nos chamando de ‘melancia’”, disse o militar. “O meu Twitter eu tive que fechar.”
“Melancia” é um termo pejorativo ao qual bolsonaristas recorrem para provocar determinados militares que seriam “verdes por fora e vermelhos (ou comunistas) por dentro”.
Baptista Júnior depôs na condição de testemunha da acusação, arrolado pela Procuradoria-Geral da República.
Reunião golpista
O ex-chefe da Força Aérea Brasileira declarou também que se cogitou em uma reunião no fim de 2022 a prisão do ministro Alexandre de Moraes. Seria parte da estratégia para manter Jair Bolsonaro (PL) no poder após a vitória eleitoral de Lula (PT).
O procurador-geral Paulo Gonet perguntou à testemunha se houve a discussão sobre prender autoridades, em algum encontro com Bolsonaro e o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.
“Sim, senhor, do ministro Alexandre de Moraes”, respondeu a testemunha. “Isso era no brainstorm das reuniões. Isso aconteceu. Eu lembro que houve essa cogitação de prender o ministro Alexandre de Moraes, que era presidente do TSE. E ‘amanhã o STF vai soltar um habeas corpus para soltar ele e vamos fazer o quê? Vamos prender todo mundo?’ Estava no brainstorm e ficou o desconforto.”
Ameaça de prender Bolsonaro
Na oitiva, Baptista Júnior ainda confirmou que o general Freire Gomes — então chefe do Exército — avisou que teria de prender Bolsonaro caso o então presidente tentasse concretizar um golpe de Estado no fim de 2022.
“Freire Gomes é uma pessoa polida e educada, não falou com agressividade, ele não faria isso. Mas é isso que ele falou. Com muita tranquilidade, calma, mas colocou exatamente isso: ‘se fizer isso, vou ter que te prender’“, declarou o ex-chefe da Aeronáutica ao STF.
Gonet perguntou ao depoente se Bolsonaro tinha conhecimento de que não houve fraude na eleição em que foi derrotado por Lula. “Sim, através do ministro da Defesa. Além de reuniões que eu falei, o ministro da Defesa despachava sobre esse assunto”, respondeu.
O relatório da Polícia Federal sobre a investigação da trama golpista aponta que Bolsonaro redigiu o texto do documento conhecido como “minuta do golpe”, o decreto que buscaria consumar o golpe. Em 7 de dezembro de 2022, o então presidente realizou ajustes no documento e convocou os comandantes das Forças Armadas para uma reunião no Palácio da Alvorada.
Naquele encontro, Bolsonaro teria o objetivo de “apresentar o documento e pressionar as Forças Armadas a
aderirem ao plano de abolição do Estado Democrático de Direito”.
“Os comandantes do Exército e da Aeronáutica se posicionaram contrários a aderirem a qualquer plano que impedisse a posse do governo legitimamente eleito. Já o comandante da Marinha, almirante Garnier, colocou-se à disposição para cumprimento das ordens”, concluiu a polícia.
Dois dias depois, em 9 de dezembro, Bolsonaro rompeu o silêncio pós-derrota para Lula e falou a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada. Na ocasião, incentivou as manifestações golpistas após a eleição e fez menções aos militares.
“Nada está perdido. O final, somente com a morte. Quem decide meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês”, declarou o ex-capitão.
A PF avalia que o discurso “seguiu a narrativa da organização criminosa, no sentido de manter a esperança dos manifestantes de que o então presidente, juntamente com as Forças Armadas iriam tomar uma atitude para reverter o resultado das eleições presidenciais, fato que efetivamente estava em curso naquele momento”.