Em mais um capítulo da ofensiva judicial contra lideranças populares e de esquerda na América Latina, o procurador-geral interino da Argentina, Eduardo Casal, apresentou na última quinta-feira (15) um parecer à Suprema Corte de Justiça solicitando que a ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner seja condenada a 12 anos de prisão e inabilitada de forma perpétua para exercer cargos públicos. O pedido, que propõe dobrar a pena atualmente imposta a Cristina, é o mesmo que ocorre no Brasil com o uso político do Judiciário – o chamado “lawfare” – para afastar figuras populares, e peronistas na Argentina, do cenário eleitoral.

O parecer de Casal se insere na chamada “Causa Vialidad”, processo que investiga supostos direcionamentos irregulares de 51 contratos de obras públicas na província de Santa Cruz, durante os governos de Néstor e Cristina Kirchner (2003–2015). A acusação central é de que as licitações teriam beneficiado o empresário Lázaro Báez, próximo ao kirchnerismo. Em dezembro de 2022, Cristina foi condenada em primeira instância a seis anos de prisão e inabilitação perpétua por administração fraudulenta, mas absolvida da acusação de associação ilícita – que agora Casal quer ressuscitar para agravar a pena. Vale lembrar que tal condenação é, acima de tudo, inconstitucional, mas quando se está a serviço do imperialismo, a constituição passa a ser apenas uma sugestão.

O procurador sustenta que a ex-presidenta deve ser responsabilizada não apenas por fraude, mas também por chefiar uma suposta organização criminosa, argumento que logicamente já havia sido rejeitado em instâncias anteriores. Tal argumento não difere de boslonaristas que acusam o Partido dos Trabalhadores de ser uma “quadrilha”, por exemplo, faltando provas materiais e faltando senso do rídiculo. No caso argentino, o parecer também pede a ampliação do valor do confisco de bens, ultrapassando cinco bilhões de pesos argentinos.

A movimentação ocorre poucos dias após o Senado argentino barrar o projeto de lei “Ficha Limpa”, que visava impedir candidaturas de pessoas condenadas em segunda instância. Com a via legislativa fechada, a direita argentina aposta todas as fichas na via judicial para tentar impedir Cristina Kirchner de disputar eleições, em especial diante do cenário político turbulento e da possibilidade de sua candidatura pela província de Buenos Aires.

Fontes do Supremo argentino admitem que os prazos para análise desse tipo de recurso são “mais políticos do que jurídicos”, evidenciando o caráter excepcional do tratamento dado ao caso. O histórico recente mostra que processos envolvendo lideranças políticas podem se arrastar por anos ou, em situações de pressão, serem acelerados conforme os interesses do establishment.

A defesa de Cristina Kirchner tem reiterado a verdade: os crimes imputados nunca foram devidamente provados e a acusação é motivada por interesses políticos, estando à serviço da direita e dos interesses do imperialismo. Cristina afirma que as obras citadas foram aprovadas pelo Congresso Nacional, executadas e fiscalizadas pelo governo de Santa Cruz e que suas contas foram aprovadas sem ressalvas pela Auditoria Geral da Nação durante todo o período investigado. Ela denuncia o processo como parte de uma perseguição judicial e midiática, o chamado “lawfare”, que visa eliminar adversários políticos por meio de sentenças judiciais.

Outro ponto levantado pela defesa é a suspeição dos magistrados responsáveis pelo julgamento em primeira instância, que teriam laços pessoais e políticos com o ex-presidente Mauricio Macri, adversário histórico do kirchnerismo e lacaio do regime de Washington. Apesar de óbvio, merece ser destacado que a proximidade entre juízes e figuras do campo conservador compromete a imparcialidade do processo e antecipa o resultado das decisões.

Com o parecer de Casal, a Suprema Corte está habilitada a decidir entre manter a condenação de seis anos, ampliá-la para doze anos com base na acusação de associação ilícita, ou até mesmo acolher os recursos da defesa e absolver Cristina Kirchner. Caso a Corte rejeite todos os recursos, a execução da pena e a inabilitação política seriam imediatas, retirando Cristina do cenário eleitoral. A expectativa é que a decisão seja tomada ainda neste semestre, mas não há prazo legal para que isso aconteça.

O avanço do “lawfare” na Argentina repete um padrão já visto em outros países da região, como Brasil e Equador, onde lideranças progressistas foram alvo de processos judiciais que, posteriormente, se revelaram frágeis ou marcados por irregularidades. Outro exemplo é na Bolívia, onde Evo sofreu um golpe. No caso argentino, a tentativa de dobrar a pena de Cristina Kirchner e de inabilitá-la politicamente é parte de uma estratégia mais ampla do imperialismo, de desestabilização e criminalização de nomes que se opunham minimamente se quer ao seu domínio neoliberal. A decisão da Suprema Corte, portanto, terá impacto não apenas sobre o futuro de Cristina Kirchner, mas sobre a própria qualidade da democracia burguesa argentina.

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Last Update: 18/05/2025