Durante entrevista coletiva concedida em Pequim no dia 14 de maio de 2025, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou a ofensiva de Israel na Faixa de Gaza como um “genocídio”. A declaração foi feita ao responder uma pergunta do jornalista Leonardo Attuch, do Brasil 247, sobre a geopolítica internacional, a Cúpula da CELAC e a viagem do ex-presidente norte-americano Donald Trump ao Oriente Médio.
Leonardo Attuch (Brasil 247): “A Cúpula da CELAC teve uma declaração final, que foi a Declaração de Pequim. O senhor acredita que essa declaração representa o fim do Consenso de Washington? […] O presidente Donald Trump iniciou uma viagem pelo Oriente Médio, onde vai se discutir um possível acordo em Gaza. […] O senhor acredita numa paz em Gaza também?”
Lula começou sua resposta defendendo a necessidade de um rearranjo da geopolítica mundial e criticando o enfraquecimento da ONU. Segundo ele, a organização, que em 1947 teve força para criar o Estado de Israel, hoje não consegue sequer garantir a criação de um Estado palestino.
“Em 1947, 48, a ONU teve força para criar o Estado de Israel. Hoje a ONU não tem força para criar o Estado Palestino. Alguma coisa mudou. […] O que está acontecendo em Gaza é uma coisa extremamente grave para a humanidade. É muito grave. E a ONU não toma nenhuma decisão.”
Foi nesse contexto que o presidente brasileiro subiu o tom contra Israel. De forma direta, Lula afirmou que o que ocorre em Gaza não é uma guerra, mas sim um massacre deliberado contra civis palestinos.
“Aquilo não é uma guerra. Aquilo é um genocídio. A única coisa que eu quero é o seguinte, é que a ONU possa tomar uma decisão.”
Lula criticou a assimetria do conflito, que coloca um exército altamente sofisticado contra uma população indefesa.
“Não é uma guerra normal, que eu já sou contra, entre dois exércitos. É uma guerra entre um exército altamente sofisticado e mulheres e crianças. É isso que no fundo é o resultado.”
A declaração de Lula marca uma inflexão mais dura na posição brasileira sobre o conflito, reforçando sua insatisfação com a passividade das instituições multilaterais. Para o presidente, a ONU perdeu sua capacidade de mediação e foi esvaziada em sua autoridade global.
“Cadê a ONU? Cadê o papel da ONU? […] Ou nós descobrimos isso e criamos uma instituição com o poder de interferência no comportamento unilateral dos países, ou a gente não tem solução.”
Ao comentar a viagem de Trump ao Oriente Médio, Lula evitou críticas diretas ao ex-presidente norte-americano. Pelo contrário, sugeriu que qualquer iniciativa que contribua para cessar a violência deve ser bem-vinda.
“Eu acho importante que o Trump viaje ao Oriente Médio para ver o que está acontecendo. […] E eu espero que ele possa dar uma contribuição para terminar o genocídio. A palavra, eu vou repetir aqui. Para terminar o genocídio na Faixa de Gaza.”
Em outro momento, Lula também criticou a tentativa de transformar o conflito em uma disputa religiosa ou étnica entre judeus e palestinos. Para ele, trata-se de um embate entre o aparato militar israelense e a população civil palestina.
“Eu não estou falando, como dizem alguns fascistas, de judeus e palestinos. Estou falando do exército de Israel contra o povo palestino. É importante registrar, porque tem muita maledicência em algumas pessoas.”
Com essa fala, Lula se alinha a um discurso crítico adotado por líderes e movimentos progressistas ao redor do mundo, que vêm denunciando a desproporção da resposta militar israelense e os impactos humanitários do cerco à Faixa de Gaza. O uso do termo “genocídio” por um chefe de Estado é uma acusação grave, que pode repercutir fortemente na arena diplomática.
A declaração acontece no momento em que o Brasil assume papel mais ativo na política externa, reforçando seu compromisso com a defesa dos direitos humanos, a paz e a reforma das instituições internacionais. Ao lado da China e de outros países do Sul Global, o governo brasileiro busca reposicionar sua diplomacia como voz crítica à ordem mundial vigente — sobretudo quando esta falha em proteger populações vulneráveis.