O Coletivo Filhos e Netos por Memória, Verdade e Justiça apoia a criação da Comissão da Verdade no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, afirmando que “Entre suas paredes, estudantes e servidores foram perseguidos, presos, torturados, mortos e desaparecidos pelo Estado autoritário.”
O grupo de familiares vítimas da Ditadura Militar (1964-1985) declara que não se trata de um gesto simbólico, mas do reconhecimento público das vítimas da ditadura vinculadas à instituição, da reparação integral às famílias dos perseguidos e do compromisso perene com a defesa da democracia, contra quaisquer tentativas de revisionismo histórico ou negacionismo.
Esta Comissão tem como objetivo não só apurar as violações aos direitos humanos dos professores, técnicos administrativos e estudantes ocorridos no Colégio Pedro II durante o regime militar. Visa elucidar o passado para que se lembre e não volte a acontecer. Sua finalidade é o pedido de reparação e justiça ao Estado devido as atrocidades ocorridas naquela instituição de ensino.
O grupo Filhos e Netos é um coletivo independente e supra partidário de Direitos Humanos. Realiza atos públicos, pesquisa e projetos ligados ao tema da violência estatal de ontem e hoje.
*Bruno Falci é Historiador e Jornalista. Correspondente da teleSUR e colunista do Portal O Cafezinho. Militante dos Filhos e Netos por Memoria, Verdade e Justiça.
segue abaixo a nota dos familiares
Moção de Apoio à Proposta de Criação da Comissão da Verdade do Colégio Pedro II
À Comunidade Escolar do Colégio Pedro II, à Sociedade Brasileira e às Instituições Democráticas
Nós, do Coletivo Filhos e Netos por Memória, Verdade e Justiça (FeN-MVJ), erguemos nossas vozes em uníssono para saudar e apoiar a histórica iniciativa de criação da Comissão da Verdade do Colégio Pedro II. Em tempos de resistência, em que o passado clama por reparação e o futuro exige luz sobre as sombras da opressão, esta ação representa um passo fundamental na construção de um Brasil que honre sua memória e garanta direitos às gerações presentes e futuras.
Um legado de saber e luta
Fundado em 1837, em meio à barbárie da escravidão, o Colégio Pedro II surgiu como farol de conhecimento, moldado pelos ideais iluministas dos liceus franceses. Suas salas de aula formaram mentes brilhantes, mas também testemunharam contradições profundas de uma nação marcada pela desigualdade. Hoje, ao revisitar sua trajetória, reafirmamos: não há futuro digno sem o reconhecimento crítico do passado.
Vítimas da ditadura: nomes que a história não apagará
Durante a ditadura civil-militar de 1964, o Colégio Pedro II, espaço de pluralidade, tornou-se alvo da repressão. Entre suas paredes, estudantes e servidores foram perseguidos, presos, torturados, mortos e desaparecidos pelo Estado autoritário. Citamos, com reverência, os seguintes lutadores.
Estudantes ex-alunos do Colégio Pedro II assassinados durante a ditadura civil-militar:
Alex de Paula Xavier Pereira (09/10/1949 – 20 /01/1972);
Fernando Augusto da Fonseca (13/01/1946 – 29/12/1972);
José Roberto Spiegner (30/12/1948 – 02/1972);
Kleber Lemos na Silva (21/05/1942 – desaparecido, 81 anos);
Lincoln Bicalho Roque (25/03/1945 – 13/03/1973);
Lucimar Brandão Guimarães (08/02/1949 – 31 /07/1970);
Luiz Affonso Rodrigues (1951 –25 /01/1970);
Marcos Nonato da Fonseca (01/06/1953 –14 /06/1972).
Servidores do CPII perseguidos durante a ditadura civil-militar:
Alberto Coelho de Souza – Professor de Filosofia;
Bayard Demaria Boiteux – Professor de Matemática;
Cleantho Rodrigues de Siqueira – Professor de Filosofia;
Helio Marques da Silva – Professor de História;
Renato Azevedo – Professor de História;
Roberto Bandeira Accioli – Professor de História;
Robespierre Martins Teixeira – Professor de Matemática;
Vitor Hugo D’Oliveira Cabral – Técnico do Laboratório de Química.
Tais nomes, entre outros, simbolizam a coragem de quem ousou desafiar a tirania. Simultaneamente, é preciso reconhecer: o próprio Colégio abrigou, em cargos administrativos e docentes, colaboradores do aparato repressivo, cujas ações mancharam sua missão educativa. Revelar essas verdades não é dividir, mas cicatrizar.
Vitória histórica: a retirada do nome de Radmaker da Reitoria
Em 2011, após intensa luta conduzida pelo Sindicato dos Servidores do Colégio Pedro II (Sindscope), o nome de Augusto Hamann Rademaker Grünewald, então homenageado no prédio da Reitoria, foi finalmente retirado. Militar de “linha dura” do regime ditatorial, foi ex-aluno do Colégio Pedro II, oficial da Marinha e vice-presidente durante o governo Médici (30 de outubro de 1969 a 15 de março de 1974).
A retirada de seu nome foi resultado de uma batalha árdua e prolongada travada pelas trabalhadoras e trabalhadores do Pedro II, que, por meio de mobilizações, atos públicos, produção de dossiês e pressão institucional, conseguiram reverter uma injusta homenagem a uma figura central da ditadura. Esta conquista representa um marco simbólico e político na reapropriação da memória da instituição por aqueles e aquelas que defendem a educação como instrumento de libertação.
Pela Justiça
Em 2025, diante de um país que ainda convive com a impunidade dos golpistas de ontem e de hoje, a proposta de criação desta Comissão ressoa como ato de coragem cívica. Não se trata apenas de revisitar arquivos, mas de reescrever a história com as lentes da Ética e da Verdade. Exigimos que o Estado brasileiro puna os responsáveis por crimes contra a humanidade, repare as vítimas e suas famílias, e garanta que a violência institucional jamais se repita.
Um chamado à ação coletiva
Apoiamos a proposta de criação da Comissão da Verdade do Colégio Pedro II não como gesto simbólico, mas como compromisso intransigente com a democracia. Que seu trabalho inspire escolas, universidades e instituições a enfrentarem seu próprio passado, desafiando silêncios cúmplices. Honramos a luta de quem dedicou a vida à educação libertadora e à justiça social.
Por tudo isso, declaramos:
- Apoio irrestrito à instalação da Comissão da Verdade do Colégio Pedro II;
- Reconhecimento público das vítimas da ditadura vinculadas à instituição, com a divulgação de seus nomes e histórias;
- Reparação integral às famílias dos perseguidos, incluindo medidas educativas e simbólicas que perpetuem sua memória;
- Compromisso perene com a defesa da democracia, contra quaisquer tentativas de revisionismo histórico ou negacionismo.
Que o Colégio Pedro II, berço de grandes mentes, torne-se também exemplo de como uma instituição pode se reinventar pela verdade. Aos que lutaram e lutam por um mundo sem opressão, nosso eterno respeito.
Memória para não repetir! Verdade para não esquecer! Justiça para reparar!
Coletivo Filhos e Netos por Memória, Verdade e Justiça
Rio de Janeiro, 12 de maio de 2025.