A viagem oficial do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, à Arábia Saudita nesta terça-feira, 12, ocorrerá em meio a tensões diplomáticas ligadas ao conflito na Faixa de Gaza, o que frustrou uma das principais metas de política externa do governo americano: a normalização de relações entre Riad e Israel.

Apesar da expectativa de anúncios econômicos bilionários, a ofensiva israelense em Gaza impôs obstáculos ao avanço das negociações diplomáticas, que têm entre as condições sauditas a implementação de um cessar-fogo imediato.

De acordo com uma autoridade americana e duas fontes ouvidas pela Reuters e que são próximas aos círculos oficiais no Golfo, os Estados Unidos vêm pressionando Israel discretamente a aceitar uma suspensão imediata das hostilidades. Essa é uma das exigências da Arábia Saudita para retomar o diálogo em torno do reconhecimento formal de Israel.

Durante evento recente na embaixada de Israel em Washington, o enviado especial de Trump para o Oriente Médio, Steve Witkoff, afirmou que a administração americana espera progresso em breve na ampliação dos Acordos de Abraão, que no mandato anterior de Trump resultaram em acordos de reconhecimento mútuo entre Israel e Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão e Marrocos.

“Acreditamos que teremos alguns ou muitos anúncios muito, muito em breve, que esperamos que gerem progresso até o próximo ano”, disse Witkoff em vídeo divulgado durante o evento. Ele deve integrar a comitiva presidencial na viagem.

Entretanto, a oposição do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu a um fim definitivo da guerra em Gaza e à criação de um Estado palestino tem travado qualquer avanço substancial nas tratativas com a Arábia Saudita.

O país árabe, que abriga os principais locais sagrados do islamismo, não reconhece formalmente Israel e tem resistido a estabelecer relações diplomáticas com o governo de Tel Aviv.

Fontes consultadas pela agência Reuters indicaram que a normalização com Israel permanece uma questão sensível para a segurança nacional saudita, especialmente diante da possibilidade de reação negativa da população local e da exploração do tema por grupos extremistas como Al-Qaeda, Estado Islâmico e os Houthis.

De acordo com essas fontes, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman considera essencial o fim da guerra e o estabelecimento de um caminho confiável para a criação de um Estado palestino antes de qualquer avanço nas conversas sobre normalização.

Durante o primeiro mandato de Trump, a normalização era tratada de forma vinculada aos interesses econômicos e de segurança entre Washington e Riad.

No momento, essas pautas têm sido tratadas separadamente, conforme seis fontes entrevistadas pela Reuters, entre elas autoridades americanas e sauditas. Todas solicitaram anonimato.

O governo americano priorizou nesta visita a assinatura de acordos econômicos e comerciais. As negociações diplomáticas prévias entre representantes dos dois países têm como foco um pacote de investimentos que pode atingir US$ 1 trilhão em empresas americanas, montante que inclui um compromisso inicial de US$ 600 bilhões anunciado por autoridades sauditas.

A agenda econômica inclui grandes contratos no setor de defesa, projetos de infraestrutura e iniciativas em inteligência artificial.

A estratégia de ambas as partes, segundo interlocutores, é concentrar os esforços em parcerias financeiras, evitando temas diplomáticos mais sensíveis como a questão palestina e os desdobramentos da guerra de Gaza.

Segundo analistas, a expectativa da Casa Branca é que a visita gere visibilidade positiva interna com o anúncio de acordos comerciais.

“O governo Trump quer que esta viagem seja um grande acontecimento. Isso significa muitos anúncios de acordos e colaborações chamativas que podem ser vendidos como algo bom para os Estados Unidos”, afirmou Robert Mogielnicki, pesquisador sênior do Arab Gulf States Institute, em Washington.

Procurado para comentar os entendimentos prévios à visita, o Departamento de Estado dos EUA afirmou apenas que Trump “buscará fortalecer os laços entre os Estados Unidos e nossos parceiros do Golfo Árabe durante as visitas”. O governo saudita não respondeu aos pedidos de posicionamento.

Antes dos ataques do Hamas a Israel em 7 de outubro, que deixaram 1.200 mortos, a Arábia Saudita e os EUA discutiam um pacto de defesa que previa o reconhecimento formal de Israel por parte de Riad.

Com o agravamento da ofensiva israelense em Gaza, que segundo autoridades locais resultou em 52 mil mortos e 1,9 milhão de deslocados, as negociações foram interrompidas. O príncipe herdeiro classificou a atuação de Israel como genocídio.

Fontes do Golfo indicaram que Trump pode apresentar durante a visita uma proposta americana para encerrar o conflito. O plano incluiria a criação de um governo de transição e novos arranjos de segurança para Gaza, podendo criar um ambiente mais propício à retomada da normalização diplomática.

Na última quinta-feira, Trump reuniu-se com o ministro de Assuntos Estratégicos de Israel, Ron Dermer, para tratar da guerra em Gaza e das negociações nucleares com o Irã. O Departamento de Estado não confirmou os temas discutidos.

Trump não deverá visitar Israel nesta viagem. Diplomatas ouvidos pela Reuters destacaram que o presidente americano evitou, recentemente, fazer menção ao plano chamado de “Riviera de Gaza”, que sugeria a transferência da população local e causou forte reação negativa nos países árabes.

Como sinal de alinhamento com Riad, Washington adotou medidas como a suspensão dos ataques aéreos contra os Houthis no Iêmen, em consonância com o cessar-fogo saudita. Também separou as negociações sobre o programa nuclear civil saudita do debate sobre o reconhecimento de Israel.

O pacto de defesa, inicialmente proposto como tratado formal ainda no governo Biden, foi retomado pela atual gestão em formato mais limitado, por meio de garantias de segurança. Três fontes revelaram que as conversas sobre o acordo de segurança e o projeto nuclear continuam, mas com mudanças no ritmo e nos termos.

A viagem de Trump à Arábia Saudita é a primeira de Estado de seu segundo mandato e a segunda internacional desde a reeleição, após sua ida ao Vaticano para o funeral do papa. Ele também visitará o Catar e os Emirados Árabes Unidos.

Segundo diplomatas, a visita também representa um movimento dos Estados Unidos para tentar conter a crescente influência econômica da China no Oriente Médio. Desde a implementação do plano saudita Visão 2030, o governo chinês tem ampliado sua presença em setores estratégicos no país árabe, como energia e infraestrutura.

A expectativa de aliados do Golfo é que Trump aceite flexibilizar normas americanas que dificultam o investimento estrangeiro em áreas classificadas como infraestrutura crítica nos EUA. Cinco fontes relataram que ministros sauditas vêm pressionando por um ambiente regulatório mais favorável ao capital externo.

Na avaliação de interlocutores, embora a contenção da influência chinesa seja uma das prioridades da política externa americana, reverter esse processo na Arábia Saudita será um desafio.

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Last Update: 13/05/2025