Um relatório publicado nesta segunda-feira (12) pela Integrated Food Security Phase Classification (IPC), iniciativa apoiada pela ONU e diversas organizações não governamentais, revelou que cerca de 500 mil palestinos na Faixa de Gaza estão à beira da morte por fome. O documento classifica a situação do território como de “risco crítico de fome”, indicando que 100% da população — estimada em 2,4 milhões de pessoas — está exposta a níveis graves de insegurança alimentar.
De acordo com a análise, entre 1º de abril e 10 de maio, 244 mil pessoas já se encontravam no nível 5 da escala IPC, o mais alto da classificação e correspondente a “catástrofe/fome”. Outras 925 mil estavam no nível 4, de emergência. O estudo alerta que, caso o bloqueio à entrada de suprimentos permaneça, a tendência é de agravamento até setembro, atingindo todo o território.
O relatório é enfático ao afirmar que “os bens indispensáveis para a sobrevivência das pessoas estão esgotados ou devem acabar nas próximas semanas”. Segundo a organização, 93% dos habitantes de Gaza estão enfrentando escassez severa de alimentos, com o risco de morte aumentando especialmente entre crianças, idosos e doentes.
A crise alimentar é consequência direta do cerco total imposto por “Israel” em 2 de março, que bloqueia a entrada de comida, água, remédios, combustível e qualquer tipo de assistência humanitária. O documento alerta ainda para o risco de deslocamentos massivos dentro do território, à medida que famílias inteiras fogem em busca de abrigo ou comida.
Regiões como o norte da Faixa de Gaza — praticamente destruído — e a cidade de Rafá, onde se concentram mais de um milhão de deslocados, são as mais afetadas. Segundo o relatório, a capacidade de resposta das comunidades está próxima de desaparecer. “A vasta maioria das pessoas na Faixa de Gaza não tem acesso a comida, água, abrigo ou medicamentos”, afirma o texto.
O agravamento da crise também se reflete nos preços dos alimentos. Em Deir al-Balah, no centro, e em Khan Yunis, no sul, o preço da farinha de trigo subiu até 3.000% desde fevereiro. Em diversas regiões, já há relatos de famílias que vivem há semanas apenas com água de fontes contaminadas e vegetais silvestres.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) alertou que a agricultura local está “à beira do colapso total”. Com a proibição da entrada de ração e insumos, a produção de leite, ovos e hortaliças — considerada vital para a sobrevivência da população — está praticamente extinta.
Segundo autoridades locais, ao menos 57 pessoas já morreram de fome. Em nota, a organização internacional Oxfam declarou que a fome em Gaza é uma “política deliberada, inteiramente arquitetada”. O coordenador de segurança alimentar da entidade, Mahmoud Alsaqqa, afirmou que a situação representa “a maior população enfrentando fome no mundo atualmente” e que se trata de uma tragédia “evitável”.
Alsaqqa acrescentou que, em um dos campos de deslocados visitados por suas equipes, apenas cinco das 500 famílias ainda tinham farinha para fazer pão. Ele relatou que crianças estão tão desnutridas que “não conseguem mais chorar”.
Oxfam também criticou duramente os planos do exército israelense de assumir o controle militar da distribuição de ajuda humanitária em Gaza. A medida, segundo a organização, viola o direito internacional e compromete a neutralidade do trabalho humanitário, colocando os trabalhadores e a população civil em risco adicional.
A diretora-executiva do Programa Mundial de Alimentos da ONU, Cindy McCain, declarou que “as famílias em Gaza estão morrendo de fome enquanto a comida que elas precisam está parada na fronteira”. Segundo ela, “esperar pela confirmação oficial de uma fome em larga escala significará chegar tarde demais para milhares de pessoas”.
Desde o início da ofensiva israelense, em 7 de outubro de 2023, o Ministério da Saúde de Gaza já contabiliza 52.862 mortos e 119.648 feridos. A maioria das vítimas é composta por mulheres e crianças. As operações militares mais recentes, concentradas em Rafá, agravam ainda mais a situação.
Na última semana, o gabinete de segurança de “Israel” aprovou a expansão da operação militar em Gaza, incluindo planos de ocupação total do território e novos deslocamentos forçados da população civil.
O relatório do IPC conclui com um apelo urgente à comunidade internacional: cessar-fogo imediato, abertura irrestrita das fronteiras para ajuda humanitária e proteção aos trabalhadores que atuam no local. Segundo a entidade, a permanência do cerco e da ofensiva militar torna “cada vez mais provável” uma fome em larga escala.
O Conselho de Segurança da ONU, no entanto, ainda não aprovou uma resolução que imponha um cessar-fogo permanente, e diversos governos seguem apoiando a política militar de “Israel”, enquanto a ajuda continua bloqueada a poucos metros da fronteira com Gaza.