O Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) anunciou oficialmente, nesta segunda-feira (12), a dissolução de sua estrutura organizacional e o fim da luta armada contra o Estado turco. A medida marca o encerramento de um dos mais longos conflitos internos do mundo, iniciado em 1984, e que resultou na morte de mais de 40 mil pessoas, sobretudo nas regiões curdas do sudeste da Turquia.
A decisão foi tornada pública por meio de um comunicado divulgado pela agência ANF, próxima à organização, que afirma: “o 12º Congresso do PKK decidiu dissolver a estrutura organizacional do partido e encerrar seu método de luta armada”. Na nota, o PKK também declara que “cumpriu sua missão histórica”, afirmando que “a luta rompeu com a política de negação e aniquilação do nosso povo e trouxe a questão curda à possibilidade de ser resolvida por meio da política democrática”.
O congresso que aprovou a dissolução foi realizado nas montanhas de Qandil, no norte do Iraque, tradicional bastião da organização curda. Segundo a ANF, os dirigentes do PKK adotaram “decisões de importância histórica” e declararam cessar-fogo imediato. A medida segue um apelo direto feito em 27 de fevereiro por Abdullah Öcalan, fundador do grupo, atualmente preso na ilha de Imrali, no Mar de Mármara, sob custódia do regime turco desde 1999.
Na ocasião, Öcalan pediu o fim da luta armada e propôs a realização de um congresso para selar o desfecho formal da insurgência curda. Apesar de mantido em regime de isolamento, a imprensa turca e curda relata que o líder histórico pôde enviar a orientação com o aval das autoridades turcas, em meio a negociações envolvendo o governo, a oposição curda legalizada e setores do Estado turco.
O anúncio da dissolução ocorre após meses de tratativas políticas. Em outubro de 2024, o líder do Partido da Ação Nacionalista (MHP), Devlet Bahçeli — aliado do presidente Recep Tayyip Erdogan — propôs publicamente que a libertação de Öcalan poderia ser considerada, caso ele encerrasse a luta armada. A declaração gerou forte repercussão e foi seguida por sinalizações positivas do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), de Erdogan, que passou a apoiar a proposta.
O porta-voz do AKP, Omer Celik, saudou a decisão e declarou que se trata de “um passo importante”. Ele acrescentou que o governo turco “monitorará cuidadosamente” a aplicação da medida e afirmou: “Se for implementada na prática, em todas as suas dimensões, poderá abrir uma nova era.” Celik também destacou que a dissolução do PKK representa um avanço para “uma Turquia livre do terrorismo”.
Por sua vez, o partido curdo legalizado na Turquia, o DEM (anteriormente HDP), teria intermediado conversas com Öcalan e solicitado garantias de segurança para que o dirigente pudesse participar diretamente do congresso. A solicitação não foi atendida, mas a orientação foi seguida por seus militantes.
Além da Turquia, o PKK manteve presença militar significativa em regiões do norte do Iraque, onde era alvo constante de operações militares turcas, incluindo bombardeios e ataques com drones. A organização também atuou na Síria até 1998, ano em que Öcalan foi forçado a fugir sob pressão turca. Após ser capturado no Quênia, foi levado à Turquia, condenado à morte e, posteriormente, teve a pena comutada para prisão perpétua após a abolição da pena capital em 2002.
A captura de Öcalan levou, inicialmente, a uma redução nos combates. Em 2012, foram iniciadas negociações de paz entre o governo de Erdogan e o PKK, mas o processo entrou em colapso em julho de 2015. A partir de então, iniciou-se um dos períodos mais violentos do conflito, com combates urbanos intensos e destruição de bairros inteiros em cidades curdas como Cizre, Sur e Nusaybin.
Apesar da dissolução anunciada, persistem tensões na região. A Turquia continua a atacar as Unidades de Defesa Popular (YPG), milícia curda na Síria considerada por Ancara uma ramificação do PKK. A YPG integra as chamadas Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos Estados Unidos na luta contra o Estado Islâmico. Após a queda do governo de Bashar al-Assad em dezembro, a Turquia intensificou suas ameaças contra a milícia curda e passou a exigir sua completa desmobilização.
Segundo a imprensa internacional, negociações envolvendo representantes da Turquia, dos EUA, da Síria e lideranças curdas estão em andamento para discutir o futuro da estrutura armada curda na Síria.
O anúncio do fim do PKK pode representar uma mudança importante no cenário político regional, embora a situação dos curdos na Turquia, na Síria e no Iraque permaneça indefinida. Até o momento, não há confirmação sobre a entrega de armas por parte dos combatentes do PKK ou sobre sua reintegração à vida civil. Também não foram divulgadas informações sobre o futuro de Abdullah Öcalan, cuja situação jurídica permanece sob controle exclusivo do Estado turco.